2008/01/25

A figura do professor

Um estudo efectuado pela Gallup para o Fórum Económico Mundial revela que "os professores são os profissionais em quem os portugueses mais confiam e também aqueles a quem confiariam mais poder no país," informa o Público on-line. Os professores merecem a confiança de 42% dos portugueses.
Ora aqui está uma conclusão digna de ser analisada.
Sabemos de há longa data que os portugueses confiam nos professores e lhes confiam o poder. Salazar era professor e o poder foi-lhe confiado (literalmente!) durante largos anos. A confiança dos portugueses era tanta, aliás, que confiaram no seu julgamento para decidir que professores poderiam dar aulas e que outros deveriam ser impedidos do o fazer.
A Salazar seguiu-se Caetano (outro professor!) em quem os portugueses confiaram e a quem confiaram o poder. Desconfiados, alguns portugueses decidiram retirar-lhe a confiança.
Mas, será que os professores são mesmo confiáveis? Se olharmos para os indicadores, se avaliarmos o estado do ensino em Portugal ("ensino" do qual fazem parte os professores, ou será que não pertencem a esta área?), se olharmos para a qualidade dos portugueses que passaram pelas mãos destes professores, o panorama não parece assim tão risonho. Basta reparar nos indicadores relativos à matemática, à cultura científica, basta lembrarmo-nos das taxas de iliteracia ou do modo como hoje se trucida sem piedade a Língua Portuguesa nos jornais, nos livros (!), nos textos legais, na televisão e nos discursos do poder para perder a confiança nas conclusões deste inquérito. Os portugueses confiam nos professores, mas é difícil confiar em quem lhes dá este voto de confiança...
Não serão estes portugueses os mesmos que, naquele programa da D. Maria Elisa distinguiram a figura do professor de Santa Comba como a do português mais ilustre?
Estou só a perguntar... Mas, isto sou eu que sou desconfiado...

"País Xanax"

Provavelmente não serei o único, mas eu ando sempre a tentar encontrar a razão principal para o atraso português e para os problemas com os quais o país cronicamente se debate. Uma espécie de "teoria de tudo" como aquela que os físicos tentaram encontrar para a sua área para explicar os diferentes fenómenos físicos de uma forma unificada.
Tal como o que sucedeu na física, a theory of everything para explicar o Portugal de hoje é certamente também uma impossibilidade. Mas, a tentação de encontrar uma única causa para a nossa triste sina é grande.
Hoje ficámos a saber que a falta de sono é um dos factores que afecta mais seriamente a saúde dos portugueses. E esta falta de sono tem consequências várias e graves, provocando problemas que vão do foro cardiovascular até à perturbação da capacidade de concentração, que pode, por exemplo, aumentar o risco de ocorrência de acidentes de viação.
O país dorme mal, recorre aos soporíferos para compensar, anda doente por isso e corre riscos.
Quem diria...! Quando nos parecia que o país andava a dormir, chegamos afinal à conclusão que o nosso mal é mesmo sono. Ou a falta dele. Quando pensávamos que a aparente apatia dos portugueses perante o destino cruel, a que parecem não querer ou não conseguir fugir desde há séculos, quando pensávamos que a tristeza e o pessimismo faziam parte da sua assinatura genética e eram a condição da e para a portugalidade, afinal o problema poderá ser outro: não andamos a dormir bem e a culpa pode bem ser do Xanax. Pelo menos é o que dizem os especialistas reunidos numa conferência sobre a matéria que decorre no Porto com o título "Sono: uma nova fronteira cardiovascular" (que raio de título...!)
O governo faria, pois, bem (e o ministério da saúde, em particular, sairia provavelmente daí com uma imagem bem mais positiva do que aquela que o Rui traçou no seu post "Tratar da saúde"...) em promover um choque soporífero, para ver se a malta passava a dormir melhor, tinha menos AVC, entupindo assim menos os hospitais, e se estampava menos nas estradas, poupando desta forma os serviços de urgência e os paramédicos.
Mas, atenção: não se trata de nos adormecer! O que proponho é mesmo uma campanha destinada a combater um problema de saúde pública...

2008/01/24

Tratar da Saúde

Correia de Campos anda nervoso. Não é caso para menos. Depois de uma primeira passagem pelo governo de Guterres, voltou, agora com Sócrates, ainda mais aguerrido e defensor de "boa" saúde. Aquela que se paga. Nos tempos do primeiro engenheiro, a matéria ainda era um misto de "piedosas intenções católicas" e incipiente "gestão" do sistema, pelo que o nosso "expert" não teve tempo de testar o seu modelo. Agora, com quatro anos de maioria absoluta e os interesses do Mello e do Espírito Santo à espera, há que avançar a todo o vapor. Apoiado na sanha de um primeiro-ministro asséptico, que deseja fazer de cada português um corredor de meio-fundo, Campos não esteve com meias-medidas: vá de reorganizar a "malha" (adoro este termo) hospitalar e fechar tudo o que não é rentável, com a promessa de que tudo vai melhorar...
Obrigados, pela força das circunstâncias, a deslocarem-se aos serviços disponíveis da sua área - e não tendo muitas vezes como - os habitantes pobres do Portugal profundo só têm duas soluções: chamar a ambulância e esperar que sejam curados a caminho das urgências mais próximas ou, caso estas (as ambulâncias) falhem, morrer à porta de urgências fechadas. Só quem nunca viveu no Barroso, em Trás-os-Montes, no Alentejo, ou na Serra Algarvia, pode pensar que as ambulâncias percorrem as sinuosas estradas a 100 à hora e chegam às urgências dos hospitais equipados, em menos de 20 minutos. Uma demagogia sem limites. Mesmo que a "malha" venha a ser operacional no futuro, começar a fechar as urgências sem que exista uma alternativa credível, é uma medida de mau gestor.
Porque os acidentes não tardaram e a revolta das populações também não, o ministro tem-se desdobrado em entrevistas e declarações televisivas a tentar justificar o injustificável: entre as suas intenções e a realidade do país, vai um passo de gigante. Um típico burocrata, enfeudado em números e modelos que não são compatíveis com o interior que temos.
Enredado nas "malhas" que ele próprio teceu, passou ao ataque. Já tinhamos dado por isso num recente programa "Prós & Contras" onde, de forma autoritária, ameaçou em público o representante da Ordem dos Médicos. Agora, foi um bocadinho mais longe: telefonou duas vezes para casa do presidente da Câmara de Anadia, a responsabilizá-lo por qualquer acidente que pudesse acontecer com as ambulâncias do INEM.
Correia de Campos parece querer, de facto, tratar-nos da saúde. Literalmente.