2008/07/29

Um diácono dos mares

Enquanto os portugueses se debatem com os problemas que todos conhecemos, ficámos a saber que o Comando Marítimo do Sul decidiu acabar com as massagens nas praias algarvias. É de facto um assunto sensível, em relação ao qual não é de todo aceitável dar sinais de tibieza...
No melhor estilo do Diácono Remédios (embora me pareça que nem o Diácono tenha conseguido ir tão longe!), o Comandante Marítimo do Sul declara, solene, para justificar a interdição, que "toda a gente sabe como é que começa uma massagem, mas ninguém sabe como é que ela acaba."
Eu que hesitava se devia ou não ir passar uns dias ao Algarve, já decidi: não vou! É que me estava a fazer a umas massagenzinhas para cuidar destes pobres ossos e músculos tão maltratados ao longo deste ano duro que passou, assim à beira mar, e, claro, desta forma já não me safo. Eu gosto de saber como acaba uma massagem, e um alerta destes, emitido com esta veemência, ainda por cima por uma autoridade que até é marítima, não pode deixar de ser tido em conta. Não vou, pronto!
Ao Comandante Marítimo do Sul os meus agradecimentos pelo verdadeiro serviço público que nos presta e um desejo: meta-se pelos mares a dentro, em força, contra os marroquinos e à reconquista de África! Para a frente, sem temores! Não nos deixemos ficar pelos preliminares...

Uma no Cravinho, outra na Ferradura

No mesmo dia em que João Cravinho dava uma entrevista onde denunciava o aumento de corrupção, o actual presidente das Estradas de Portugal mandava reabrir o processo da construção da Ponte Europa, em Coimbra, onde se verificou uma derrapagem de custos calculada em 288%.
Lembremos que, Cravinho, ministro de Obras Públicas do primeiro governo Guterres, tinha abandonado o cargo depois de denunciar a promiscuidade existente no sector da construção civil em Portugal. Posteriormente, viria a ser o autor de um projecto-lei de combate à corrupção que acabaria chumbado pelo seu próprio partido, o PS de Sócrates. No seguimento desta decisão, "et pour cause", o ex-ministro e deputado seria enviado para um "exílio dourado" em Londres, onde é actualmente funcionário no Banco de Investimento Europeu. Espera-se, destes altos representantes da nação, um silêncio à altura da função.
Acontece que Cravinho, certamente por deformação profissional, não se tem calado. Um dos seus temas favoritos é mesmo a corrupção. Ora isto é muito grave, como veio lembrar o inefável Alberto Martins de Coimbra, pois a "ética é republicana" e o João - para mais vivendo em Inglaterra - não tem moral para dar lições ao PS...Como nos veio lembrar o patulante Martins, para averiguar das pretensas ilegalidades, já existe um orgão - o Conselho de Prevenção da Corrupção - que (apesar de constituido maioritariamente por elementos dependentes da tutela) não hesitará em "prevenir" quando isso fôr preciso.... Como se nós fossemos burros. Isso não se faz, oh Cravinho!...

2008/07/28

Feios, porcos e maus

Desde que, na passada semana, o país inteiro pôde presenciar - ao vivo e em directo - um tiroteio sem precedentes entre habitantes de um bairro da periferia de Lisboa, que Portugal não fala noutra coisa.
As opiniões podem, globalmente, ser divididas em dois grandes grupos: aqueles que, como o SOS Racismo e o Bloco de Esquerda, fazem das "minorias étnicas" as suas bandeiras de estimação e procuram justificar todos os desmandos com os argumentos do racismo e da discriminação existentes; e aqueles que, como Fernando Madrinha e Mário Crespo (de quem corre um artigo na NET) parecem mais preocupados com os beneficiários do "rendimento mínimo" que - pasme-se! - até possuem plasmas e leitores de DVD em casa (!?).
Há algo de sórdido e mesquinho nesta história de criminalidade urbana que, não por acaso, teve lugar num bairro de realojamento onde, não por acaso, viviam antigos moradores do Parque Expo que, não por acaso, eram na sua maioria desempregados de origem negra e cigana. Não por acaso.
E é aqui que a "porca torce o rabo". Com raras excepções (Vasco Pulido Valente) ninguém pareceu preocupado com a política social de alojamento e o modelo urbanístico que lhe está subjacente. Desde há muito que na Europa civilizada (onde existem políticas de imigração) foram abandonados os bairros sociais para pobres, por razões que a Sociologia explica. O modelo seguido em cidades cosmopolitas como Paris, Londres, Amsterdão ou Berlim é, de há décadas a esta parte, o da integração progressiva dos estrangeiros em bairros populares onde convivem com políticos nacionais, médicos, professores universitários, estudantes, operários fabris, desempregados e prostitutas legais. E o sistema funciona.
Também na mesma Europa, já foi tentado o modelo periférico de exclusão social. Os guetos aí formados, levaram à implosão da maioria destes bairros sociais na década de oitenta. Vinte anos depois, Portugal parece não ter apreendido nada com a experiência alheia. Continuamos a deixar crescer os bairros ilegais nas periferias das cidades e, quando é necessário realojar os seus habitantes, despejamo-los em "torres" a que chamamos bairros, sem jardins, centros de dia, escolas, supermercados ou esquadras e polícia de proximidade. A polícia, de resto, tem medo de lá entrar.
O que se passou na Quinta da Fonte é, de há muito, conhecido dos responsáveis por este monstro urbanístico. Só que, deste vez, foi filmado e pudemos ver em directo o que lá se passa.
A menos de um kilómetro da minha casa, existe um dos bairros mais problemáticos da grande Lisboa, a Cova da Moura. Um aglomerado de construções clandestinas erguidas nas décadas de setenta e oitenta onde, calcula-se, vivem mais de 5000 pessoas. Quem as deixou construir estas habitações (que já foram barracas e hoje são casas de alvenaria e tijolo)? Certamente, a autarquia da Amadora, onde existem dezenas de bairros clandestinos cujos moradores são, na sua maioria, negros, ciganos e desempregados. Alguém imagina um emigrante português a construir uma casa clandestina em Berlim ou em Amsterdão? Obviamente que não. Como pode um governo exigir respeito se não cria regras de convivência socialmente aceitáveis?