Os tiros no pé que o PR tem vindo a dar ultimamente, a sua manifesta falta de jeito para o exercício do cargo que ocupa e a possibilidade real de ser o primeiro presidente da república pós-Abril a não ser reeleito para um segundo mandato, abrem caminho à possibilidade de uma candidatura conjunta de esquerda que poderia, segundo alguns, conduzir a um perigoso frentismo. Essa possibilidade deixa a direita em pânico.
O pânico resulta de duas coisas. Por um lado, da sua real falta da influência política e da insuficiência do seu discurso político. O povo é de esquerda, as teses que colhem são de esquerda. Por outro lado, pelo receio de que se torne claro, de uma vez por todas, que os portugueses entendam, sem margem para dúvidas, que as soluções estão de facto à esquerda e que este eleitorado volúvel, que hesita e se abstém crescentemente, possa vir a perceber onde jaz a chave para alterar o triste curso da nossa vida colectiva actual.
Onde está então o problema de escolher uma solução de esquerda para o país? O problema começa por estar, justamente, no facto da direita ter margem de manobra para continuar a agitar o papão da esquerda. O problema está também no facto de a esquerda, em muitos aspectos, não se distinguir da direita e não se saber constituir uma alternativa real. O problema está no facto de a esquerda ter tanto medo de ser esquerda como a direita tem medo que a esquerda o seja. O problema está no facto de ser mais difícil criar alternativas à bandalheira do que ir gerindo a bandalheira.
Nas sucessivas campanhas eleitorais em que temos estado envolvidos ultimamente, o que distingue a esquerda da direita? Nada. Os mesmos cartazes, as mesmas "arruadas", as mesmas caravanas insuportavelmente ruidosas, as mesmas bandeirinhas ridículas, o mesmo espetáculo mediático, a mesma retórica, o mesmo previsível futuro institucional, contentinho, venerador e obrigado, os mesmos dirigentes, com os mesmos tiques, indistinguíveis no seu pensamento poluído e nos seus desígnios espertalhaços.
Só a esquerda poderá criar a alternativa necessária, a alternativa do combate à bandalheira que foi criada pela direita.
Quando se despir de preconceitos e assumir inteligentemente o seu desígnio, a esquerda será a alternativa. Até lá, hoje na Presidência, no governo, na AR, e amanhã nas autarquias teremos mais do mesmo: nada.