2009/12/04

Fuso Luso 4

Aqui em Concord, Massachussets, neste local agora verdejante e idílico (clique na foto para ver quão verdejante e plácido o local é...), foi disparado o tal "tiro ouvido em todo o mundo," como escreveu Ralph Waldo Emerson.
Parece que tudo não passou de um acidente, mas o que é facto é que os Minutemen conseguiram derrotar os Red Coats. E o "acidente" acabou por ter enormes e profundas repercussões.
Os americanos pagavam impostos e, nesse sentido, achavam-se no direito de se verem representados nas instâncias políticas da metrópole. Os ingleses discordavam, os americanos revoltaram-se e os ingleses trataram de reprimir a revolta. Foram derrotados. O que se seguiu justifica bem a frase de Emerson.
O pior é que depois disto o rol de ataques ao direito à revolta em que os americanos participaram por todo o mundo não tem fim. E, ignomínia das ignomínias, os Minute Men de agora até acabaram por se juntar aos Red Coats de antanho para meter o nariz onde não eram chamados, deixando de intervir onde, se calhar, era preciso.
Há uma América para consumo interno e externo (no sentido literal e metafórico do termo...) e nesta América de hoje os sinais que se vêem indicam que a lição de Thoreau foi, de facto, esquecida.
E, contudo, ela está ali à vista de todos os que visitam Concord. Num placard colocado por cima do local do tal primeiro tiro pode ler-se:
"Continuamos a chamar a isto a terra da liberdade? Que liberdade há em nos livrarmos do Rei Jorge, se continuamos a ser escravos do Rei Preconceito? Qual a vantagem de nascer livre e não viver livre? Para que outra coisa serve a liberdade política senão para aceder à liberdade moral?"
Não sei se os americanos já perceberam isto depois de todos estes anos...

2009/12/02

Fuso Luso 3

Na América do Norte é costume vermos um sinal de sentido proibido no início de uma rua ou estrada e, mais à frente, um sinal que diz "wrong way". Como quem diz "prevaricaste, mas tens aqui a tua chance de te corrigir."
Parece haver uma linguagem oculta nos sinais de trânsito, à semelhança daquela que Edward T. Hall descobriu nos comportamentos e posturas das pessoas. Esta combinação do "do-not-enter/wrong-way" diz-nos qualquer coisa sobre o direito ao erro, à tolerância e à capacidade de proporcionar novas oportunidades que reina nas sociedades norte-americanas.
Se existe a mesma tolerância para com os membros exógenos a estas sociedades, ou se ela conta nas relações destes países com o exterior, aí já tenho sérias dúvidas.
De qualquer forma, o contraste com o que se passa em Portugal é notório. Desrespeitar um sinal de sentido proibido é um desporto radical, e mesmo que o sinal seja passado por engano, não há um aviso, mais adiante, que nos diga de forma serena que nos enganámos, mas que temos a possibilidade de corrigir esse engano.
Eu vejo uma metáfora nisto...

2009/12/01

A Hora do Lobo

Menos de uma semana depois da lei do código contributivo ter sido chumbada pela oposição na Assembleia da República, o governo já contra-atacou. A acreditar na manchete de um matutino de hoje, o fisco enviou um SMS a 100.000 contribuintes a lembrar o pagamento. Nada a opôr, não fosse a hora escolhida para tal "operação": 4 horas da madrugada!
Compreende-se o zelo em recuperar receitas para o depauperado cofre da nação. Já custa mais a entender o "timing" da coisa: "a hora do lobo", como lhe chamaria Bergman. Nos tempos da outra senhora, os PIDES também costumavam aparecer de madrugada para levar os cidadãos incomódos para o regime. Há hábitos que nunca se perdem...