2010/09/24

A Crise

Agora que Cavaco Silva se preparava para anunciar a sua (re)candidatura a Belém e o que menos desejaria era falar, eis que a realidade se impôe à estratégia presidencial e o obriga a tomar posição sobre a actual crise. Falhadas que foram as conversações entre os dois maiores partidos sobre o OE, mais não resta a Cavaco do que tentar o impossível que é, neste momento, evitar a entrada do FMI em Portugal.
Com uma economia a crescer abaixo de 1%, uma dívida externa correspondente a 80% do PIB e a pagar uma taxa de juro de 6,2% (a maior, na Europa, depois da Irlanda) tudo aponta para que, dentro em breve, Portugal ultrapasse os 6,4% da Grécia, o "momento" em que o FMI "entrou" naquele país. Os resultados estão à vista e não consta que os gregos tivessem ficado melhores com a terapia de choque que lhes foi aplicada. Para já, e no que diz respeito a Portugal, com ou sem Orçamento, as previsões económicas para o próximo ano são ainda piores do que as actuais: congelamento de salários, aumento de impostos, aumento de desemprego, desempregados de longa duração sem meios de subsistência, redução de prestações sociais, redução de comparticipações em medicamentos. Estas são algumas das medidas que têm em vista reduzir o "déficit" que ultrapassa actualmente os 9%. Mas, estas medidas não vão chegar. E porquê? Porque a despesa do estado continua a crescer e, como não há dinheiro para pagá-la, teremos de pedir mais dinheiro emprestado, o que fará aumentar a dívida e os respectivos juros...
Como explicam os analistas económicos todos os dias na televisão, sem aumento da produtividade não há aumento de riqueza e, sem esta, não haverá maneira de distribuir melhor e pagar a dívida que tornar-se-á, a prazo, insustentável. Perante esta verdadeira quadratura do círculo, gostaríamos de saber o que diz o economista Cavaco, pois o Cavaco presidente já sabemos o que pensa.

2010/09/22

De Queiroz ao FMI, passando por Mourinho

O folhetim do seleccionador nacional entrou numa nova temporada. Vale a pena pensar no que foi a temporada anterior.
Creio que foi o major Valentim Loureiro que disse uma vez que o futebol não é mais que um reflexo do país. Se não foi ele foi alguém do género. Temos de admitir que o personagem tinha nisto alguma razão. Não se podem atribuir ao futebol nem todos os malefícios das suas derrotas, nem todas as virtudes dos seus sucessos. Mas, o futebol espelha de facto o País e este episódio Queiroz é disso exemplo.
Em todo este processo se vê a mesquinhez, a invejinha, o resíduo inquisitorial do poder, a leviandade com que os portugueses nele investidos tratam os seus concidadãos, o que é a justiça e o respeito pela lei das instituições que têm de velar por tudo isto. O que é e para que serve o Estado Português, em suma.
Em todo este processo se vê também a insolência do poder e como este (este ou qualquer outro poder, seja político ou institucional, como foi e é o caso da Secretaria de Estado da Juventude e Desportos ou da Federação Portuguesa de Futebol) trucida, com total leviandade, as pessoas no seu continuado e nunca verdadeiramente questionado livre arbítrio. Uma vez conquistado o "poderzinho", vale tudo. No "enterro" de Queiroz, mas também no "convite" a Mourinho se vê como não passamos todos de peões perante os poderes conjunturais que tudo e todos tentam manipular, seja qual for o nosso estatuto, seja qual for o nosso ramo de actividade.
O Estado em Portugal continua, séculos depois da revolução cidadã, a ser eu. Ou, numa versão mais colorida e, sem dúvida, mais fiel, "eu é que sou o presidente da junta!"
Em todo este processo se percebe também que perante as necessidades mais sérias deste país a resposta continua a ser D. Sebastião, chame-se Mourinho ou FMI. Em qualquer caso, no futebol como na economia, a qualificação de Portugal está em risco.
Queiroz foi engolido. Mourinho foi ingénuo e esteve quase a entrar na escala de serviço para o ser. Apenas me consola a ideia de que o FMI, se cá viesse, iria certamente sair de mãos na cabeça jurando nunca mais cá voltar. Nem de férias!

2010/09/21

Um embaixador incómodo

"Portugal manteve a sua posição relativa no mundo, e nomeadamente na Europa: continuamos no pelotão dos mais atrasados, dos mais periféricos, dos mais aflitos. Não progredimos suficientemente mais do que os outros, como precisávamos de fazer para alterar a nossa posição no conjunto dos países. E, na última década, foi mesmo o contrário que aconteceu".

Manuel Maria Carrilho em "E agora? - Por uma nova República".

Adenda: Carrilho, até ontem embaixador português na UNESCO, foi substituido no cargo após a publicação da obra citada e da última entrevista que deu ao "Expresso". Nada que nos surpreenda, num partido que sempre privilegiou a fidelidade canina em detrimento do pensamento autónomo dos seus membros. A verdade sempre incomodou os mediocres.