2010/12/23

Assimetrias

No mesmo dia em que o governo, magnânimo, anuncia um "aumento" de 10 euros (!?) no ordenado mínimo nacional, que passará a 485 euros em Janeiro, ficámos a saber que os gestores portugueses ganham, em média, 14 vezes mais. Ou seja, 6.800 euros.
Nada que não se saiba, mas é sempre "reconfortante" ouvir os discursos dos responsáveis da nação quando pedem sacrifícios e, ao mesmo tempo, se preparam para meter mais 500 milhões de euros no "buraco" do BPN.
Ora, como sabemos, o dinheiro não "estica". Para dar para uns, não pode dar para todos, não é verdade?
É Natal, nada parece mal...

2010/12/22

O homem sem qualidades

Se dúvidas houvesse, a prestação de Cavaco Silva no debate televisivo de ontem, frente a um candidato do PCP sem qualquer "histórico" nestas andanças, mostrou a verdadeira estrutura do actual presidente. Um homem sem discurso, atabalhoado e frágil, nitidamente incomodado com as acusações relativas à fraude do BPN ou a submissão portuguesa face aos ataques dos "mercados" internacionais. Não fora a pronta e cirúrgica intervenção da moderadora a "salvá-lo" das questões mais incómodas e Cavaco teria passado por um debacle televisivo, naquela que foi atá agora a sua pior prestação nos debates em curso. Nada que nos espante, num personagem sem verbo e sem Mundo, que se refugia num discurso economês supostamente superior, mas incapaz de prever a crise com a qual nos debatemos há, pelo menos, cinco anos (tantos quantos leva de magistratura). Uma desgraça, este presidente-candidato, no qual não imagino alguém poder querer votar. O pior é que as alternativas são más de mais para acreditar nelas e, perante tal panorama, não são de esperar resultados muito diferentes das últimas eleições presidenciais. Uma escolha impossível.

Já nem vale a pena manter as aparências

As expressões "mercados" ou "agências de rating" não passavam até há pouco tempo de conceitos distantes e abstractos para a maior parte dos leigos. Seriam referidas como se terá pronunciado, imagino eu, a palavra Papa durante séculos. O Papa, lá de longe, decretava, excomungava, decidia sobre a veracidade da mentira e a aldrabice da verdade e a malta, respeitosamente, flectia o joelho e acatava, com temor reverencial, os seus ditames.
Infelizmente para o novo papado, a informação não circula com a lentidão de outrora e os símbolos deste novo poder estão muito mais sujeitos ao escrutínio imediato dos povos. Hoje só quem insiste em viver nas estrelas ignorará a verdadeira natureza deste novo pontificado.
O filme "Inside Job", referido pelo Rui Mota aqui, traça um retrato implacável dos "mercados". As agências de "rating" não passam, quanto a mim, de novos piratas. Os pontífices desta nova religião, diz quem sabe, deixariam os dissolutos Bórgias e Medicis corados de vergonha... ou roídos de inveja. Os processos, a crueldade e a discricionariedade destes novos pontífices fariam empalidecer Gregório IX.
E, contudo, as nações dobram-se hoje perante os papas desta nova religião e inquietam-se perante a possibilidade de serem excomungados por desrespeito a S. Mercado e S. Rating, os jovens santos, recentemente canonizados, mentores desta nova igreja. Teme-se a bula, tenta-se comprar as indulgências a juro favorável.
A submissão a este novo papado ilegítimo e imoral surpreende. Surpreende, por exemplo, a forma desavergonhada como um representante do Ministério das Finanças de Portugal, representante de um governo legitimado pelo veredicto do povo, declara, de forma submissa e reactiva, respondendo directamente a uma ameaça de um agente privado de um poder ilegítimo: "Reitera-se que tudo se fará no sentido de contrariar os riscos que estão na base do anúncio da análise por parte da agência Moody’s e isso reflectir-se-á, confiamos, na decisão resultante dessa análise durante o primeiro trimestre de 2011."
"Tudo se fará"... Prostrados "confiamos..." É, portanto, uma questão de fé. Pornocracia II.

2010/12/19

Os pobres que se cuidem...

Agora que os debates televisivos vão adiantados, começa a ser claro qual o alvo principal dos candidatos nestes tempos de penúria. Na época do ano onde, por tradição, a caridadezinha volta sempre com amor, os políticos presidenciáveis já encontraram o votante potencial perfeito: aqueles que - por desespero - mais crêem no Messias. Os pobres que se cuidem, pois a caça ao voto não olhará a meios...