2012/07/06

Quem verifica a constitucionalidade do TC?

Há cerca de 3 anos, Manuela Ferreira Leite sugeriu a suspensão da democracia. Por seis meses, dizia ela. Depois recomeçava-se tudo de fresco. O Tribunal Constitucional acaba de colocar exactamente em prática a sugestão da veneranda criatura.
Desafio os editores daquela série de livros para tótós a lançarem um sobre direito constitucional. Qualquer coisa que nos ajude a perceber como funciona afinal a Constituição! Eu confesso, face ao que se está a passar, a minha perplexidade e ignorância quanto a esta matéria.
Na altura em que M. Ferreira Leite nos brindou com a sua sugestão, ela suscitou comentários inflamados de repúdio por parte de uma série de almas piedosas que por aí andam. Gostaria de os ouvir agora! Gostaria que falassem alto, se possível, para todos os ouvirmos, e que levassem o seu clamor até às últimas consequências.
A propósito de clamor, já agora, aproveito para deixar uma pergunta final: tendo em conta o estado de relaxo a que tudo isto chegou, não estará na altura de pensar em criar mecanismos para verificar a constitucionalidade das decisões do Tribunal Constitucional? Seria útil e inovador...

2012/07/05

O sonho é possível



Do que falamos quando falamos do tal bosão de Higgs? Falamos de uma partícula subatómica, qualquer coisa de uma magnitude e de uma forma que a maior parte de nós ainda não consegue sequer imaginar. Falamos de uma investigação que dura há pelo menos 50 anos (se não incluirmos em tudo isto o trabalho anterior, de séculos, que conduziu a essa investigação). Falamos da construção do LHC, —o Grande Colisionador de Hadrões—, o maior acelerador de partículas do mundo. Um monstro de 27 km de comprimento, situado a cerca de 180 m de profundidade, entre a França e a Suiça. Concebido para acelerar partículas subatómicas que geram uma energia de 7x2 TeV. Ou seja, —tente imaginar…,— 7x2 Tera electrão-Volt (1 eV=1 602 177 33 (49) x 10-19 joule;  1 joule, por sua vez, é o trabalho necessário para levantar uma massa de 98 g a uma altura de 1 m, sob o efeito da gravidade terrestre.) Falamos da maior máquina do mundo, que demorou 16 anos a construir e custou 10 mil milhões de dólares. Falamos das cerca de 10 000 pessoas que trabalham no projecto, entre os que estão envolvidos directamente na operação do LHC e os físicos que trabalham nas experiências em curso. Falamos de números grandes, grandes! Os feixes de protões lançados no túnel de colisão percorrem os seus cerca de 27 km do túnel a 11 245 km por segundo, a velocidades próximas das da luz. A temperatura de colisão é de cerca de 1016 graus centígrados, um milhão de vezes a temperatura do centro do Sol. Os 1232 electromagnetos necessários para conduzir os feixes de protões geram campos magnéticos da ordem dos 8,36 Tesla, 100 000 vezes mais que o campo magnético da Terra. Para tornar tudo isto possível, 128 toneladas de hélio asseguram o arrefecimento de todo o complexo contido no anel de cerca de 8 km de diâmetro, a temperaturas de cerca de -271ºC, próximas do zero absoluto. Cada experiência levada a cabo no LHC gera volumes de dados capazes de preencher 100 000 DVD de 8,6 GB por ano. São alguns dos números, sem dúvida, impressionantes, mesmo para um leigo na matéria, como eu. É, pois, de tudo isto e de muito mais que falamos quando falamos do bosão de Higgs.

Para que serve toda esta parafernália? Para testar a existência de uma partícula subatómica. Para dar uma ideia do tamanho de um átomo, o raio atómico do hélio (o átomo de menor dimensão) é 32 pm. O bosão de Higgs será parte de um "caldo" de partículas que interferem com os átomos e lhes dão massa, lhes conferem resistência ao seu livre movimento, subdividindo-se depois. Foram precisos 10 000 físicos, foi preciso gerar energia da ordem de 14 TeV, foram precisos 10 mil milhões de dólares e tudo o mais que sabemos, para confirmar a existência de uma partícula que mede portanto menos de 1/1 000 000 000 000 de metro.

No mundo atómico a importância das partículas não se mede aos palmos e a verdadeira capacidade de sonhar não se detém nos obstáculos por mais pequenos que sejam...

Não vou ser ingénuo: haverá também certamente interesses pouco desinteressados no meio de tudo isto, mas o facto é que todos estes recursos brutais, estas forças que se conseguem gerar, estes 10 000 físicos, estes 85 países envolvidos, este necessariamente complexo sistema de gestão e coordenação, tudo isto resulta, antes de mais nada, de um imenso acto de fé colectivo, com o epicentro sobretudo na Europa. Nada conseguiu deter a Europa nesta urgência de observar simples partículas, cuja magnitude a imaginação mais fértil mal consegue ainda conceber, e que ninguém tinha conseguido provar experimentalmente que existiriam sequer.
Aos autos de fé de antigamente, que alguns teimam em querer recuperar, contrapõem-se estes actos de fé colectiva, que contradizem os inexplicáveis e entorpecentes mercados, as crises, as revisões macroeconómicas em baixa, as agências de rating, os banqueiros e os financeiros. Aqui não foram regateados meios. A provar que afinal o progresso é a meta da civilização, é a meta da Europa, embora a ignorância, a crueldade, a irresponsabilidade e a selvajaria de alguns possam por vezes sugerir o contrário. Afinal, são os sonhadores que estão, como sempre estiveram, certos. Sem sonho e sem capacidade para o compreender, a vida não é certa.
Como entender de outra forma a investigação que levou a tudo isto, à construção e à gestão de todo este complexo sistema, à disponibilização de todos estes recursos, ao equilíbrio de todas estas sensibilidades para provar a existência de uma pequena, pequena partícula subatómica? Em torno de que outro motivo se reúne tudo isto, que não seja um sonho de civilização que a todos nos une? Que outro objectivo poderia motivar a investigação sobre o bosão de Higgs? Que outra mola que não seja a fé, nos leva a admitir que, agora que sabemos que o bosão de Higgs existe, podemos vir a perceber ainda melhor o que Leucipo e Demócrito, cerca de 500 anos a.C., começaram por intuir, sem a ajuda de qualquer tecnologia?
Como compreender, finalmente, que a Europa, esta Europa tão badalhoca, deprimida, descrente de si, e tão cruel no seu comportamento comunitário, tão atreita ao encómio a dignitários de barro, esta Europa tão fértil em cimeiras e em tratados da plástico, não se tenha engalanado toda hoje, para celebrar um projecto desta natureza, construído maioritariamente com vontades e dinheiros Europeus, assente na fortíssima tradição de um saber Europeu, ironicamente originário da sua região actualmente mais problemática, que uns tantos achariam bem ver fora da Comunidade?

É possível, pois, um futuro mais brilhante. É possível um futuro em que os problemas que nos afligem possam ser corrigidos. Basta sonhá-lo.
O exemplo do LHC, do CERN e de outras instituições científicas similares diz-nos que o sonho é possível, que o progresso e a civilização são conceitos a preservar e a alargar e que, em vez de se deixar tentar por resvalar para a barbárie, a Europa deveria querer continuar a desempenhar em tudo isso o papel fulcral que sempre desempenhou.

2012/07/04

À atenção dos enfermeiros

Deixem de ser burros! Façam uma licenciatura de um ano e filiem-se na Maçonaria. Com um pouco de sorte, ainda chegam a ministro...