2014/10/14

A vaga de fundo do edil Costa

Imagem Diário Digital
Há coisas que nunca mudam na sociedade portuguesa. Há quem lhe chame tradição e há quem lhe chame laxismo. Também há quem lhe chame incompetência.
Depois da "época dos fogos", que se inicia normalmente em Junho e dura até Setembro, entrámos na "época das cheias", que se inicia em Outubro e dura até ao fim do Inverno.
Nada que não saibamos, acostumados como estamos a estas constantes da vida. Sempre foi assim, desde que temos memória, portanto deve ser inevitável. Há que sofrer e esperar que a "maré vaze"...
Vem este arrazoado todo a propósito das últimas inundações em Lisboa que, mais uma vez, atingiram parte significativa da capital, como de resto já tinha acontecido há três semanas atrás. Relembramos: entre as 15h30 e as 16h (meia hora!) de ontem foram registadas inundações em Benfica, São Domingos de Benfica, Olivais, Misericórdia, Parque das Nações, Estrela, Alvalade, Santa Clara, Campolide, Ajuda, Sto. António, Xabregas, Aeroporto, Calçada de Carriche, Túneis da Avenida João XXI e do Campo Grande, Rua das Pretas, Rua da Prata, Praça do Comércio, Rua Dr. Augusto Castro, Estações do Metro do Rossio, de Sete-Rios e de Chelas. Esqueci-me de alguma coisa? Será isto normal?
Como também é da tradição, logo surgiram as inevitáveis justificações: a maré cheia do Tejo que impede a água das chuvas de correr para o rio e provoca inundações na "baixa", a falta de avisos da meteorologia e as inevitáveis sarjetas, "mães" de todos os males desta cidade ribeirinha.
Acontece que, desta vez, a maré do Tejo estava baixa e a meteorologia tinha avisado (alerta laranja).
Então o que falhou? De acordo com diversos vereadores da Câmara Municipal, o que se mantém são as "inundações, problemas de obstrução das sarjetas, sumidouros e colectores; falta de investimento na rede de esgotos; plano de drenagem pronto desde 2007 por implementar; impermeabilização excessiva dos solos; incorrecto planeamento urbano, etc...". Todo um programa, portanto. 
Já nem sequer vou invocar os sábios avisos do arquitecto Ribeiro Teles que, de há décadas a esta parte, vem alertando para o perigo de construção em leito de cheias, do alastramento do betão por toda a cidade ou da falta de árvores e jardins que permitam uma melhor drenagem das terras.      
Também não quero culpar António Costa, que chegou há sete anos à Câmara, quando este fenómeno das inundações fazia, há muito, parte da paisagem. Mas, alguma coisa deve estar mal e alguma coisa deve ser possível fazer. Desde logo, prevenção, que é a melhor forma de evitar o desastre anunciado. Vivi 30 anos em Amsterdão, uma cidade de canais, 3 metros abaixo do nível do mar do Norte e nunca lá vivi nenhuma cheia. Portanto, é possível. Como foi possível solucionar os problemas da estação de metro do Terreiro de Paço que, devido às infiltrações de águas do Tejo, esteve fechada dez anos. Finalmente, chamaram engenheiros hidráulicos holandeses e eles resolveram o problema.
Custa dinheiro? Pois custa, mas custa muito mais pagar aos sucessivos empreiteiros portugueses que arrecadam milhões de lucros, em "derrapagens orçamentais" destas obras públicas que todos temos de pagar.
Não sei se o actual presidente da Câmara de Lisboa chegará alguma vez a primeiro-ministro, mas, a avaliar pelas inundações que, continuamente, atingem Lisboa, é cada vez mais provável que seja ele o primeiro a ser atingido pela vaga de fundo que estava a criar...