2015/10/23

O DOC's está de volta!



Teve ontem início e durará até ao próximo dia 1 de Novembro, a 13ª edição do "DOC's", a maior e mais importante Mostra de Cinema Documental em Portugal.
Da sessão de abertura, para além dos agradecimentos habituais e das palavras (auto) elogiosas dos organizadores, registamos a exibição do excelente filme "Bella e perduta", do jovem realizador Pietro Marcello, uma bela alegoria à Itália actual, onde os factos reais se confundem com personagens e imagens oníricas, que não desdenhariam uma fábula de La Fontaine.
Grande abertura, presenciada por uma assistência maioritariamente jovem (o futuro está aí), que não poupou aplausos durante e após a sessão.
O festival está de volta, com exibições em simultâneo nas salas da Culturgest, Cinema City (Campo Pequeno), S. Jorge, Cinemateca e Cinema Ideal, com exposições e projecções multimédia no Museu de Electricidade em Belém.
Na impossibilidade de citar o programa em detalhe, destacamos os filmes da Competição Internacional e da Competição Portuguesa (a concurso) e os habituais ciclos temáticos, este ano com os nomes sugestivos de "Riscos" (da responsabilidade de Manuel Augusto Seabra); a retrospectiva dedicada ao realizador Zelimir Zilnik (presente no festival com uma "master class"); a retrospectiva "I don't throw bombs, I make films - Terrorismo, Representação"; foco "Grécia"; "Heart Beat"; "Cinema de Urgência"; "Verdes Anos" e "Doc Alliance". São dezenas de grandes e pequenos filmes, documentários e docu-dramas, onde a realidade se confunde com a ficção, a maior parte em estreia absoluta no nosso país, que reflectem e enquadram os grandes temas da actualidade.
Porque as sessões são inúmeras e o tempo é escasso, só resta adquirir o livro-programa e comprar os bilhetes para as sessões respectivas, antes que esgotem. Estão avisados. O "DOC's" está de volta e o programa deste ano é um "must". Ver aqui.       

Qual a surpresa?

Cavaco Silva fez exactamente o que se esperava, mas excedeu-se nas suas considerações. 
Fez exactamente o que se esperava, ao indigitar Passos Coelho, líder do partido ganhador das ultimas eleições para formar governo. Pode discutir-se esta opção, mas não viola o espírito da Constituição e aceita-se do ponto de vista formal (o presidente convoca, normalmente, o líder do partido mais votado, tendo em conta a leitura que faz dos resultados eleitorais).
Excedeu-se nas suas considerações, ao criticar os partidos de esquerda (com maioria parlamentar) e sugerir que não viabilizaria um governo composto por forças políticas críticas da austeridade imposta por Bruxelas.
Com estas considerações, o presidente não só deixou de ser independente em relação às forças e aos projectos políticos em discussão - favorecendo descaradamente a força partidária (PSD) a que pertence - como criou uma crise institucional desnecessária, sabendo que um governo minoritário de direita tem os dias contados e cairá à primeira moção de confiança no Parlamento.
Perante esta situação de facto, restam apenas dois cenários possíveis:
Ou o presidente convida António Costa (líder do 2º partido mais votado) para formar governo; ou mantém um governo minoritário, em gestão corrente, sem qualquer hipótese de tomar decisões e aprovar oçamentos, provocando eleições antecipadas, que nunca poderão ter lugar antes de Junho de 2016. Ou seja, o país "pára" durante 8 meses!
Um imbróglio de todo o tamanho, provocado por um presidente teimoso, ideologicamente retrógado e destituído de qualquer autoridade moral para continuar em funções. Um personagem autoritário e salazarento, que recusa em aceitar os princípios básicos de uma democracia adulta.
Qual a surpresa? 

 

Lições

Aparentemente as instituições democráticas estão a funcionar. O Povo Português pronunciou-se nas eleições, os partidos negoceiam alternativas no quadro dos resultados eleitorais, o PR atribui, em cumprimento do seu papel constitucional, a incumbência de formar governo a quem, no seu entender, melhor poderá cumprir essa função. Se o entendimento das suas funções poderia ser outro, se o comportamento do PR se afigura mais ou menos distante do que imaginamos ser um comportamento digno e correcto, se a sua decisão poderia recair noutra figura, são questões cuja discussão deve ser feita, mas que não têm qualquer relevância para o funcionamento das instituições democráticas. Estas instituições têm rostos e foram sufragadas por sucessivas eleições. 
Cabe agora à AR pronunciar-se sobre a decisão presidencial, dando continuidade aos mecanismos democráticos consagrados na Constituição. É ela a bitola. 
E assim se completa o ciclo.
As lições que interessa verdadeiramente reter no rescaldo de todo este processo são, sobretudo, duas.
Em primeiro lugar, o que esperar para a Democracia portuguesa quando observamos o comportamento inqualificável dos sectores políticos, a quem foi justamente atribuída a missão de formar governo? Ouvindo-os, somos subitamente levados numa viagem ao passado, em que os donos do poder de então não se coibiam de amesquinhar, caluniar, denegrir, violentar e até matar quem a eles se opusesse. Só falta largar os cães e os canhões de água ou reconverter as salas da Rua António Maria Cardoso ou da Rua do Heroismo novamente em locais de tortura e morte. Deveria envergonhar qualquer democrata, de esquerda ou de direita, o tipo de argumentos que foi utilizado nestes últimos dias contra uma solução de esquerda para o Parlamento. Enquanto se comemorava alegremente a data simbólica do filme Back to the Future, em Portugal foi tempo de Back to the Past. 
A Democracia anda distraída. As velhas forças obscuras estão, imagine-se, bem vivas e prontas a atacar a qualquer momento. Parecem aguardar um pretexto apenas. O que o comportamento da direita nestes últimos dias nos vem provar é que, para ela, a Democracia não é um valor. Daí a soltar os jagunços vai um passo.
Em segundo lugar, pela mesma ordem de razões, nenhum verdadeiro democrata se poderá sentir isento de culpas por termos chegado a este ponto, após mais de 40 anos de regime democrático. Há diálogos que estão a falhar ou nem sequer foram encetados, mitos que estão por desmascarar, forças poderosas que estão por aniqulilar, a esquerda esqueceu as gerações que nasceram após o 25 de abril. 
A esquerda tem uma notória incapacidade de diálogo, colabora activamente na perpetuação de mitos inventados e perpetuados pela direita, esqueceu-se tragicamente de denunciar, sem medos nem ambiguidades, os crimes do fascismo aos mais novos, de lhes ensinar o que é a Democracia, e serve-se das mesmas forças que a manipulam e condicionam, seguindo porventura a velha ideia do "se não podes vencê-los". Um caso particularmente grave, que merece destaque, é o da imprensa. 
Não há uma imprensa de esquerda em Portugal. A esquerda, agentes políticos activos e sectores de da população que a dizem seguir, estão totalmente comprometidos com uma imprensa de que são vítimas. Fazem-na e consomem-na sem pudor. Portugal é hoje uma gigantesca realidade virtual, construída com a acção diligente de uns, que a fazem, e a complacência estúpida e criminosa de outros, que a consomem.
As "máscaras caíram", como li por aí. A isso deve seguir-se uma implacável limpeza de balneário. Há gente absolutamente indigna alapada na esquerda que, é o momento, tem que ser desmascarada sem piedade. Mas, mais importante, a alternativa de esquerda tem de ser vivida sem ambiguidades e sem alienação de responsabilidades. 
É um futuro diferente aquele pelo qual devemos lutar, não um passado maquilhado.