2016/11/29

Taxi Driver (11)


- Boa noite.
Boa noite, para onde?
- Para a Buraca, se faz favor...
Se eu quisesse, não podia levar aí esse saco...
- Como assim?
Os táxis são para transportar passageiros.
- Claro. E bagagens. Além disso, nem se trata de uma bagagem. É um saco de compras.
Seja um saco de compras ou não, se eu quisesse não levava esse saco aí. O senhor entrou e pôs o saco cá dentro para não ter de pagar bagagem...
- Faço este trajecto dezenas de vezes ao ano e os seus colegas nunca puseram objecção. Além disso, é um trajecto curto e não vale a pena pôr o saco de compras lá atrás. 
Isso é porque os meus colegas são gajos porreiros. A gente "fecha os olhos", mas as bagagens são para ir na mala do carro.
- Depende. A lei (está afixada na janela traseira do táxi) é bem explícita: só volumes acima de uma determinada medida devem ir para a mala. Ora, este saco tem menos do que os 50cm proibidos por lei...
Já lhe disse, se eu quisesse, não podia levar esse saco aí...
- Bem, mas afinal, posso ou não levar aqui o saco de compras? Se não posso, porque é que não me impede de transportá-lo? Eu sou cumpridor da lei e, se a lei o obrigar, não tenho qualquer problema.
Eu não posso impedi-lo de levar aí o saco...
- Não estou a perceber: não posso levar o saco aqui e o senhor não pode impedir-me de levá-lo?
Não posso impedi-lo, mas todas as bagagens devem ir na mala. A parte interior é só para passageiros.
- Se é assim, porque não arranjam uma lei explícita e utilizam um só critério: tudo o que for bagagem (independentemente do tamanho) tem de ir no porta-bagagem do carro.
Não sou eu que faço a lei, mas a lei diz que o interior do carro é apenas para passageiros, só que a gente "fecha os olhos"...
- Desculpe lá, mas esta conversa não faz sentido nenhum: se não posso levar aqui este saco, posso pô-lo na mala do carro. Se posso levá-lo aqui, não vejo qual é o problema!
O problema é que cada condutor tem os seus critérios, mas a lei é explícita: só podem ir passageiros no táxi. As bagagens vão na mala.
- Se vocês não têm um critério uniforme, como é que os passageiro hão-de saber?
Está escrito na porta. Mas, eu não vou impedi-lo de levar aí o saco...se quiser pode fazer queixa de mim, mas esta é a lei.
- Eu não quero fazer queixa de ninguém, não estou é a perceber porque é que não posso levar aqui este saco (quando sempre o fiz) e se lhe digo para pôr o saco lá atrás, diz-me que não pode impedir-me de levar aqui o saco...isto parece uma conversa de doidos.
A bagagem é para ir atrás. Esta é a norma, mas eu não quero falar mais disto.
- Desculpe lá, mas quem começou a conversa foi o senhor. Se quer pôr o saco lá atrás, não tenho problema nenhum com isso, apesar de nunca me terem obrigado a tal. Se não quer lá pôr o saco, não vejo razão para levantar esta questão.
Já lhe disse: a gente "fecha os olhos", porque alguns colegas querem ser uns gajos porreiros e não se importam, para não incomodar o cliente. Mas, o que a lei diz é que o interior do carro é para passageiros apenas. Como vivemos num país onde ninguém respeita a lei, não vale a pena eu obrigá-lo a pôr o saco lá atrás.
- Óptimo, já percebi o seu ponto: há uma lei, mas como ninguém a respeita, o senhor também não a cumpre. Mas, se quisesse, podia impedir-me de levar aqui o saco, certo?
Certo. Mas eu não vou impedir nada. O senhor leva aí o saco, mas não devia. Os sacos e toda a bagagem devem ir na mala.
- Muito bem. Nesse caso, sugiro que na próxima assembleia de taxistas, discutam este assunto entre vocês e proponham ao governo uma lei explícita que diga o que pode e não pode ir dentro do táxi.
A lei que existe é a que está afixada na porta. Só que ninguém lê o que lá está...
- Bem, já vi que não nos entendemos. Também não faz mal, já chegámos.
Boa noite.
- Boa noite...

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