2016/03/11

Taxi Driver (6)

Boa noite. Então, para onde vamos?
- Buraca, se faz favor.
Importa-se que eu fume?
- Eu não, esteja à vontade...
Isto é um vício, sabe?...
- Deve ser. Não fumo, não posso avaliar. O meu médico diz que fumar, ou não fumar, é uma questão de inteligência.
Não me diga nada...
- Os vícios, são sempre difíceis de combater.
Mas, eu combato. Quando acabar esta corridinha, vou logo para o ginásio, fazer uns "push-ups".
- Faz bem, sempre elimina algumas toxinas.
Pois é. Sou doido por desporto. Todas as semanas, estou lá caído. E ainda faço "futsal", numa equipa das Olaias.
- Pelo menos não engorda. Agora só falta deixar o tabaco...
Não engordo, mas tenho de controlar-me. Cheguei a beber meio-litro por refeição, mais três ou quatro cervejas por dia, faça as contas...2 litros por dia, vezes 30 dias, são 60 litros por mês, vezes 12 meses, são mais de 700 litros por ano. Fora, as festas, as bebedeiras e os "cheirinhos"...nunca menos de 1000 litros por ano! Mil litros, é muito litro...
- Isso é capaz de ser muito, de facto. Tem de ter cuidado...
Eu sei, mas nesta profissão, já sabe como é...um "gajo" anda aqui sempre em "stress" e se, não compensa com outra coisa, não aguenta...
- Tem de beber menos e comer mais, se calhar...
Comer, não como muito, mas os doces...agora descobri umas sobremesas lá na "tasca" onde passo todos os dias e não resisto. Tem as melhores "mousses" de Lisboa. Com pedaços de chocolate puro e tudo! Dia que não coma duas "mousses", à sobremesa, não é dia...
- Cuidado com os diabetes...
Pois é, ando sempre a medir o colesterol por causa disso e estou sempre no ginásio. Um momento (toca o telefone). Está? És tu, pá? Agora não posso atender que vou levar um cliente e volto já para Lisboa. Depois, passo aí...eh pá, leva os "beefs" a uma cervejaria para eles beberem um copo e fazerem tempo. Daqui a meia-hora, vou ter contigo e levo-os ao clube...
- Não falta trabalho...
Pois não, o pior é que estava a pensar ir jogar "futsal" e já não vai dar tempo...tenho um grupo de "beefs" à espera, que querem ir a um clube de "strip", e nós temos percentagem pelos clientes que lá levamos. Não se pode perder...
- Claro, trabalho é trabalho...
Vamos ver se ainda consigo dar umas corridas, antes de levar os estrangeiros, porque depois faz-se muito tarde e nunca sabemos como acaba a noite.
- Estou a ver...isso é que é actividade!
Sou um doido por desporto. Até em casa, pratico. Tenho uma sala grande, onde instalei uma mesa de "pool". Convido os meus amigos e passamos lá fins-de-semana, inteiros, a jogar. Sou o melhor, pois pratico muito, mas às vezes tenho de os deixar ganhar, senão, nunca mais lá vão...agora descobri um professor estrangeiro, com uma academia em Portugal, que me tem dado umas lições. Tem manuais, com trabalhos de casa e tudo. Custa-me umas "massas", mas aprende-se muito.
- O "pool" é mais para descontrair, imagino...
Sim, sim, muito bom mesmo...no fundo, é a velha questão da "bola branca". Acertamos e pronto, a partir dali engatamos e mais ninguém joga...
- Estou a ver. Pelo menos, não se aborrece.
Eu? Nunca. No fundo, eu não sou taxista. Tenho é de ganhar algum. O meu projecto é tornar-me um bom jogador de "pool", montar uma academia e ensinar os outros. Passar os meus conhecimentos e, com isso, ganhar umas "massas", claro.
- Acho que faz muito bem. Chegámos.
São 7 euros e meio, certinhos. Boa-noite e obrigado pela companhia.

2016/03/10

Tempos de Circo...

Portugal tem um novo Presidente da República.
Aparentemente, começou um "novo ciclo", a expressão mais usada nas últimas vinte e quatro horas.
Uma coisa, parece certa: terminou o triste ciclo, inaugurado por Cavaco Silva, o pior presidente da democracia recente. Algo é algo.
Resta-nos aguardar pelo ciclo Marcelo que terá, à partida, cinco anos pela frente.
Sobre o novo presidente, já muito foi dito, antes e depois da sua nomeação. Sabemos que é um comunicador nato (quarenta anos semanais na imprensa escrita e televisiva, não passam despercebidos) e sabemos que, ideologicamente, é de direita e filiado no PSD, partido do qual foi secretário geral, na década de noventa. Da mesma forma, sabemos que é professor e constitucionalista de mérito, assim como sabemos ser um católico praticante, como ontem ficou, mais uma vez, demonstrado.
Se dúvidas houvesse sobre a sua personalidade e comportamento, os sinais dados neste primeiro dia, são inequívocos: o país assiste, entre surpreso e divertido, ao frenesim do novo presidente nestas horas em que ainda está em "estado de graça".
Relembramos: deslocação (a pé) para o Parlamento onde jurou a constituição e fez um discurso, suficientemente abrangente para agradar a gregos e troianos, após o que recebeu os cumprimentos habituais. Seguiu depois para os Jerónimos, onde depôs as flores da praxe nos túmulos de Camões e Gama. Almoço e visita "ecuménica" à mesquita de Lisboa, onde recebeu os cumprimentos dos representantes das confissões religiosas existentes em Portugal. À noite, mais cumprimentos no palácio da Ajuda e, finalmente, um concerto ao ar livre, oferecido aos lisboetas na companhia de dezenas de crianças convidadas para o efeito. Mariza cantou o hino e os restantes artistas fizeram a festa.
Hoje, a televisão ofereceu-nos um directo de Belém, que permitiu ver a sua apresentação formal aos funcionários do palácio (Obama fez escola) e, esta tarde, recebeu os representantes do corpo diplomático no palácio de Ajuda, em directo para a televisão, com a presença de alguns atletas e da inevitável...Mariza. É obra!
Está dado o mote: Marcelo, o "comunicador" nato, sabe lidar com os média e o frenesim não vai parar. Para a semana, estão anunciadas as duas primeiras visitas estatais, ao Vaticano (!?) e a Espanha (noblesse oblige).
Quem esperava um presidente mais sisudo e formalista, enganou-se. Quem esperava um presidente interventivo, vai ter de esperar mais tempo. Para já, o circo não tem faltado. Falta, ainda, o pão.
Uma coisa é certa: a partir de agora, nada será como dantes.