2016/10/20

Outono em Amsterdão (2)



Nem só pelos canais é conhecida a cidade de Amsterdão. Uma das áreas onde mais se investiu, nos últimos anos, foram as zonas verdes (parques e bosques) que ocupam grande parte do tecido urbano. Um dos parques mais agradáveis da cidade é, actualmente, o Westerpark, situado num antigo bairro operário com o mesmo nome. O parque, criado no século XIX, serve os habitantes do bairro e alberga a antiga fábrica de gás da cidade (construida em 1888), um complexo de edifícios em tijoleira vermelha, a lembrar o estilo britânico da era da industrialização. Está situado ao longo da Haarlemmerweg, uma via rápida que liga Amsterdão à cidade de Haarlem.
Nos anos sessenta, com a descoberta de gás no mar do Norte, a fábrica tornou-se absoleta e foi encerrada. Os seus edifícios seriam mais tarde ocupados por "krakers" (movimento de ocupação de casas) que transformaram o espaço em "ateliers" e serviços comunitários diversos. A fábrica foi preservada pelo município e classificada como "arqueologia industrial". Depois de alguns anos encerrado, o Westpark reabriu ao público em 2003, agora dividido em duas zonas distintas, Norte e Sul, separadas pelo antigo complexo industrial, totalmente recuperado e onde funcionam "ateliers", "galerias de arte, "start-ups", dois restaurantes, o café "loja do pão" (que fabrica e vende diariamente pão fresco), para além de um auditório ao ar livre, o "North Sea Jazz Club" e um cinema de arte "Het Ketelhuis", que exibe filmes clássicos. Devido à temperatura convidativa, o parque estava cheio de famílias e turistas que enchiam os multiplos recantos desta Amsterdão ainda relativamente desconhecida.
Outro "must" a visitar, é o edifício "Eye", que alberga a cinemateca de Amsterdão. Inaugurada em 2012, esta construção modernista, a lembrar um avião supersónico, está situada na margem norte do Ij (o canal que divide o Norte do centro da cidade). No "Eye" podem ser vistos filmes clássicos e em estreia (8 salas de projecção), para além de exposições temporárias, sempre surpreendentes. Depois das grandes exposições dedicadas a Kubrick, Fellini, Kronenberg e Antonioni, que tinhamos admirado em anos anteriores, foi a vez de apreciar "Celluloid", uma instalação colectiva de artistas fascinados pelo material filmico e por máquinas de projecção de 16mm e 35mm. Uma agradável surpresa onde, entre nomes mais consagrados, como Rosa Barba, Tacine Dine, Sandra Gibson e Luis Recoder, podem ser vistos trabalhos dos portugueses João Maria Gusmão e Pedro Paiva, no caso as curtas "Onça Geométrica" (2013) e "Glossolalia" (2014). A visita, à loja da cinemateca, é imperdível, assim como a vista panorâmica do "skyline" da cidade,  a partir da esplanada do "Eye".
Dali, seguiriamos para a FOAM, uma galeria especializada em fotografia, que neste momento alberga quatro exposições, todas elas interessantes: "Dinastia Marubi" (diversos "portraits"de uma colecção de 150.000 negativos, feitas num dos primeiros estúdios albaneses); "Made in China", de Olya Oleine, uma pequena e representativa exposição a preto e branco, sobre a China actual; "Night Soil" de Melanie Bonajo, composta de pequenas curtas metragens sobre movimentos feministas norte-americanos e "Safe Passage", com trabalhos do conhecido dissidente chinês Ai Weiwei, sobre os refugiados da guerra que dão à costa grega. Weiwei, actualmente a viver em Berlim (após a sua libertação em 2015), fotografou e filmou dezenas de famílias de refugiados nos campos de acolhimento montados na ilha de Lesbos. Centenas de polaróides, que cobrem literalmente as paredes de um dos andares do edifício, numa avalanche de informação que nos interroga sobre o drama existencial de milhares de vítimas da guerra. Numa sala separada, fotos tiradas pelo artista em cativeiro, algumas verdadeiramente hilariantes, onde podem ser vistos diversos agentes chineses à paisana, que Weiwei (impedido de sair de casa) ia fotografando da sua janela. As fotos tiradas, com pequenos intervalos de tempo, são acompanhadas de legendas irónicas sobre o trabalho de observação e controlo levados a cabo pela polícia chinesa. Uma dor de cabeça para as autoridades, o activista Ai Weiwei, certamente um dos artistas mais criativos da actualidade. A não perder, para quem se desloque à cidade antes de Janeiro. 

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