2007/05/16

Lusofonias

Uma das palavras mais fascinantes do vocabulário recente do país é a palavra "lusofonia". Por dá cá aquela palha lá vem ela. Ele é o Encontro das universidades lusófonas que vai ser promovido em Cabo Verde, ele é a Cena Lusófona que aparenta estar a perder as pilhas, ele foi uma recente Primeira Bienal da Lusofonia organizada pela Malaposta. Enfim, a "lusofonia" é palavra que se ouve e é conceito, aparentemente, celebrado todos os dias, de uma forma ou de outra.
Digo aparentemente porque, vistas todas estas iniciativas, ficamos com a sensação que "lusofonia" não passa de um chavão, sem outro objectivo que não seja o de promover umas reuniõezecas inócuas. Ficamos muitas vezes persuadidos que ninguém quer, de facto, fazer nada para tornar a Lusofonia uma realidade, e que, pelo contrário, se procura projectar esta imagem de criança hiperactiva para que as coisas fiquem sempre, assim, num limbo calmo, caloroso e conveniente. (O "limbo" foi oficialmente extinto, eu sei... Mas, como diria um grande pensador do futebol português, "vocês sabem do que estou a falar...").
Lusofonia arrisca-se a ser um daqueles conceitos relativamente ao qual se pode aplicar aquele célebre comentário de Gandhi a propósito da civilização ocidental: "era uma boa ideia!"
Banalizado, esvaziado de conteúdo e, sobretudo, destituído de um suporte sério, político e financeiro, a Lusofonia parece, por vezes, mais um pretexto para uns quantos amigalhaços irem comendo umas "cachupas" ou umas "moambas" juntos do que um conceito mobilizador e útil para todos os povos que integram este espaço.
A menos que... Bom, a menos que um desses novos países de expressão oficial portuguesa tome a iniciativa e lance verdadeiramente mãos à obra! Ou que esses novos países decidam definitivamente habitar uma outra língua e nos deixem a falar sózinhos...

2007/05/13

Rigor e vulnerabilidade

A utilização dos computadores veio revolucionar o nosso quotidiano, mas, ao mesmo tempo, veio trazer também muitos motivos de ansiedade. Eu, pelo menos, fico exasperado com o "modo de pensar" dos computadores e com algumas exigências dos seus procedimentos e detecto isso nalguns utilizadores que observo.
Há duas causas para esta reacção.
Por um lado, os computadores e respectivos softwares revelam uma total intolerância em relação aos erros e às imprecisões. Escrever "faceocultadaterra.blogspot.com" para aceder a este blogue não é, nem de perto nem de longe, o mesmo que escrever "faceoclutadaterra.blogspot.com". O erro, que para nós seria facilmente ultrapassável, constitui para um computador e para os softwares que o governam uma barreira intransponível. "Blog does not exist!" declara peremptório! Pior ainda: imaginamos que o computador e os seus softwares "aprendem" o nome mil vezes escrito e que basta escrever "face" para ele automaticamente aceder ao endereço correcto. É verdade. Mas, o endereço incorrecto também ficou guardado na "memória" da criatura e lá voltamos nós, sem apelo, ao erro, à crescente frustração e à ansiedade.
Por outro lado, este universo das redes de computadores é o das identidades secretas, dos "usernames", das "passwords", dos "perfis", das privacidades e dos códigos secretos! Sem estabelecermos um perfil, sem criarmos um username e uma password adequada, este universo está-nos completamente vedado. A imprecisão na inserção dos "usernames" e das "passwords", então essa é fatal: Access denied! Operation timed out! Connection cancelled! Contact the webmaster! Process terminated!, sentencia sem piedade...
Se pensarmos nisto como uma forma de preservar a nossa identidade neste frágil universo digital e de estarmos defendidos, a ideia parece reconfortante. Porém, todos os indícios parecem mostrar que nunca estivemos tão expostos e que nunca fomos tão vulneráveis. Todo o código é decifrável, não há passwords invioláveis e não estamos digitalmente seguros em lado nenhum. Aqui andamos todos nus. A nossa persona electrónica, o nosso íntimo digital, todos os nossos dados circulam por aí, neste grande caldeirão que é a internet, ao alcance de todos.
Não se trata de dar voz a nenhum alarmismo, daqueles que os jornais gostam muito de escarrapachar nas primeiras páginas. Nada disso! Até porque nós temos sempre, de facto, a possibilidade de criar uma identidade digital com um raio de acção curto... O que quero dizer é que existem inúmeros alçapões e corredores secretos e que, em consequência, o assédio nunca foi tão fácil (pensem, por exemplo, nas toneladas de junk mail que todos os dias recebemos, até aqui no endereço do Face...). Este assédio só é possível porque invadir os terrenos da nossa privacidade digital é, efectivamente, canja.
Por um lado, portanto, estamos presos nesta teia digital e nela temos de adoptar um comportamento rigoroso senão não somos ninguém. Por outro lado, todo o fruto deste nosso rigor anda por aí, à solta, e é de quem o apanhar...