2017/01/31

Uma semana de Benelux (2)


A distância entre Amsterdão e a capital do Luxemburgo é de cerca de 500km em linha recta.
Pode ser feita de vários modos, mas escolhemos a mais demorada por razões sentimentais. Durante quase uma década, foram inúmeras as vezes que a percorremos em ambos os sentidos, quase sempre de carro ou de comboio. O comboio, tem a vantagem de podermos desfrutar da paisagem das Ardenas, espectacular em qualquer época do ano. Desta vez, os campos estavam cobertos de neve e, à distância, podiam ser observados bandos de corvos e até raposas e doninhas que, afanosamente, procuravam alimento nas terras brancas das colinas à beira da linha férrea. Um deslumbramento.
A parte negativa, foram as mudanças durante o trajecto: à ida, em Maastricht e Liége e, à volta, em Bruxelas-Norte e Roterdão. No total, paragens incluídas, 6 horas de viagem...
Tempo para uma rápida refeição nas gares de transbordo, pejadas de emigrantes de diversas nacionalidades. Em todas elas, um discreto patrulhamento policial, ainda que na Bélgica, por razões conhecidas, a presença dos para-militares fosse uma constante. Dentro do combóio, eram visíveis as patrulhas aos pares, com os policiais a controlar as carruagens, toiletes incluídas. A psicose do terrorismo não desapareceu. Se Amsterdão estava frio, o Luxemburgo estava gelado: menos 10º durante o dia.
Lá fomos apresentar mais uma vez o livro "Exílios", desta vez num centro de documentação dedicado às migrações, situado em Dudelange, na zona sul do país, perto da fronteira francesa. Uma sessão organizada com o patrocínio do Ministério da Cultura e da cidade de Dudelange.
O "Centre de Documentation sur les Migrations Humaines" (CDMH) foi fundado em 1993 e está situado na antiga gare "Dudelange-Usines", que serviu esta região mineira e de siderurgias, encerradas em finais dos anos oitenta. Em redor da antiga gare (agora reconvertida num moderno centro cultural) podem ser observadas as ruínas das antigas instalações industriais, num cenário algo apocalíptico, a lembrar os tempos da industrialização do início do século passado. Foi a esta região que chegaram os primeiros emigrantes, ainda antes da 2ª guerra, maioritariamente italianos, que continuam a constituir a maior comunidade na região. O CDMH está distribuido por dois andares, com um espaço para exposições e uma pequena recepção no rés-do-chão e um centro de documentação e uma biblioteca/auditório, situados no primeiro andar. Foi neste espaço, que três dos colaboradores do livro, falaram sobre a sua experiência de exilados em França, na Holanda e no Luxemburgo, durante os anos setenta. A obra foi apresentada por Thierry Hinger, professor na Universidade do Luxemburgo, especialista em migrações, cuja tese de doutoramento versa a migração portuguesa no Luxemburgo. Excelente sessão, presenciada por uma assistência atenta de portugueses e luxemburgueses, que na sua maioria desconheciam a história de uma geração que recusou a guerra colonial portuguesa em África, já que, à época, o Luxemburgo não aceitava exilados políticos oriundos do nosso país.
De volta a Amsterdão, tempo para visitar o Stadsarchief Amsterdam (Arquivo Municipal), certamente um dos edifícios públicos mais espectaculares da cidade onde, até ao dia 5 de Fevereiro, pode ser admirada a exposição "Amsterdam 1900", com fotografias e filmes dos mais famosos fotógrafos amadores da época. Grandes fotos, na sua maioria a preto e branco, onde a patine do tempo realça a beleza das imagens. Trabalhos de Olie, Breitner, Eilers e contemporâneos, em fotos e filmes, que passam ao longo do dia na sala da cave. A visitar, também pelo edifício, uma das obras de arquitectura mais icónicas de Amsterdão. Se andam por perto, ou contam passar pela cidade esta semana, recomendamos vivamente. 
           

2017/01/30

Uma semana de Benelux (1)



Em viagem para o Luxemburgo, no âmbito da apresentação de um livro de memórias, aproveitámos para dar mais um "salto" a Amsterdão, a "dois passos" de distância...
Como era de esperar, o frio, nesta altura do ano, estava de cortar à faca. Valem-nos as aquecidas casas e espaços públicos, sempre em renovação constante de colecções para visitar e revisitar, ou não fosse a capital holandesa uma cidade-museu por excelência.
Lá fomos, no primeiro dia da nossa passagem por esta cidade dos canais, aqui e ali já meio gelados, a prenunciar um Inverno bastante frio, ainda que longe das temperaturas históricas que permitiam ligar, não há muitos anos, 11 cidades do Norte da Holanda através de diversos canais gelados.
O museu escolhido para iniciar o nosso périplo, foi o "Persmuseum" (Museu da Imprensa),  situado na Zeeburgerkade, um largo canal na zona Leste da cidade, perto do Instituto de História Social, um centro de documentação famoso pelo seu acervo, onde, e. o. documentos, podemos encontrar a acta da I Internacional assinada por Karl Marx, a maior colecção de publicações do movimento anarquista espanhol (ali guardado durante a guerra civil naquele país) e uma das colecções mais representativas de cartazes e publicações do PREC português, adquiridos pelo Instituto na década de setenta.
O Museu da Imprensa, está alojado no rés-do-chão de um bloco de apartamentos, virado para o Zeeburgerkade e é composto de três pequenas salas, divididas tematicamente por épocas e factos jornalísticos relevantes dos últimos 50 anos. A exposição temporária é dedicada ao cartoonista Peter van Straaten (1935-2016) recentemente falecido, a quem o Museu dedicou uma sala com uma selecção dos seus melhores "prints", publicados em alguns dos jornais de referência holandeses ao longo de quase meio século. Uma colecção única, representativa do "ar do tempo" em que a Holanda desafiava a moral vigente, sublinhada pelo humor que Van Straaten sempre emprestava aos seus desenhos. As restantes salas, incluem grandes painéis, com fotografias e textos de imprensa, alusivos a momentos singulares da política e vida social holandesa. Fotos históricas de políticos famosos que marcaram a vida do país nas últimas décadas: Den Uyl, Van Mierlo, Wiegel, van Agt, Lubbers, Brinkman, Wim Kok e Pim Fortuijn. Para além da galeria dos políticos, uma das salas inclui dez factos, escolhidos por outros tantos jornalistas, que marcaram as últimas décadas na Holanda: o movimento anarquista "Provo" (65), a revolução sexual (66), o casamento da rainha Beatriz (66), a 1ª crise do petróleo (73), a captura de um combóio por migrantes Molukkers (anos '70), as manifestações contra o nuclear (anos '80), a construção do metro (anos'90), a morte de Pim Fortuijn (2002) e Theo van Gogh (2004). 
Noutra sala, dez factos internacionais formam uma série escolhida por outros tantos jornalistas: a chegada à Lua ('69), a guerra do Vietnam ('72), a queda do muro de Berlim ('89), o ataque às torres gémeas de New York (2001), a guerra do Iraque (2003) e a captura de Bin Laden (2011) permanecem como as mais icónicas. Curiosos são os textos que acompanham as fotos, todos eles desmentindo as versões apresentadas pela imprensa da época.
A visita a este pequeno, mas simpático museu, passaria por um pequeno hall, onde está exposta uma colecção de desenhos e pinturas alusivas à personagem de "Zwart Piet", pagem de St. Claus (o Pai Natal) contestado pelo politicamente correcto actual.
O dia não terminaria sem um passeio de barco através dos principais canais da cidade, para admirar o Amsterdam Light Festival, a decorrer durante os meses de Inverno, onde são expostas diversas instalações multimédia, cujas cores se alteram ao longo do percurso. Excelente iniciativa, muito concorrida por turistas, apesar da hora tardia a que se efectua. O bom ambiente a bordo e o chocolate quente oferecido pela organização (uma fábrica de cerveja artesanal) contribuiriam para a boa disposição. A repetir.