2010/11/27

Inside Job


Encontra-se em exibição, nas salas de Lisboa, um dos mais extraordinários documentários desta década. Na senda dos filmes-denúncia popularizados por Michael Moore, cujo "Capitalism, a love story" era já um prenúncio do que aí vinha, "Inside Job" (A Verdadeira Crise) de Charles Ferguson, arrisca a tornar-se o verdadeiro "clássico" da crise financeira actual.
Ao longo de hora e meia, Ferguson (académico de Berkeley, Harvard, MIT e conselheiro da Casa Branca) escalpeliza as causas e consequências desta crise, passando em revista os momentos mais importantes, sem deixar de interrogar os principais actores e confrontando-os com as suas práticas fraudulentas. Tudo ilustrado com exemplos e graficos claros, ainda que aqui e ali com algum excesso de informação nem sempre fácil de acompanhar. Uma verdadeira lição em "economia fraudulenta", que deixou milhões de pessoas na falência, levou países à bancarrota (a Islândia é o exemplo maior) e provocou um "crash" em Wall Street, como não se assistia desde a grande depressão de 1929.
Se a surpresa é grande, quando confrontados com os dados inequívocos apresentados por Ferguson, mais surpreendidos ficamos ao verificar que a maior parte daqueles que estiveram na origem desta crise, sairam com elevadas indemnizações e, alguns deles, foram inclusive reconduzidos em cargos políticos de responsabilidade financeira.
Se alguma dúvida existisse em relação à promiscuidade existente entre a alta finança e a política, este filme desvanece-a definitivamente. Isso em si é uma boa notícia. A má notícia é que os actuais dirigentes - Obama incluido - não parecem querer ou ter força para contrariar esta tendência. E isto só nos pode preocupar.
A ver, absolutamente.

2010/11/25

O pendor para a direita

O dr. Ferraz da Costa veio tentar apequenar os resultados da Greve Geral, e mais-não-sei-quê de alterar a lei da greve, acrescentando que os sindicatos não sabem a verdadeira situação em que o país se encontra. Uma metralhadora a atirar em todas as direcções. (Ouça tudo aqui.)
Ó dr. Ferraz da Costa, se calhar não é sua intenção, mas esta conversa é um triste insulto à inteligência dos seus ouvintes, que são muitos, fervorosos e devotados, creia...
Então os sindicatos não sabem o estado em que o país se encontra?! Permita-me discordar. Sabem e sabem melhor do que ninguém, antes de mais nada porque os sindicatos são de trabalhadores e os trabalhadores sentem na pele —e são os primeiros a sentir— o "estado em que o país se encontra". Ao contrário de outros sectores da sociedade portuguesa a quem não falta calor para aquecer neste inverno, roupinha pinoca e comidinha no prato para manter a barriguinha aconchegada.
Por outro lado, diga-me lá: os sindicatos não sabem como o país está, mas depreende-se então das suas palavras que o senhor sabe. Se sabe, porque não o revela? E se não o revela porque razão o não faz? Será uma razão política? E se o senhor tem direito a não o fazer, por uma razão política, os sindicatos não terão o mesmo direito, ou pretende para si regime de excepção...?

2010/11/24

Generalidades

O Secretário de Estado da Administração Pública, Gonçalo Castilho dos Santos, diz que esta greve não é geral. Não se preocupe, senhor Secretário de Estado. Depende do conceito que o senhor tenha da palavra "geral". O governo também devia, em geral, governar e não governa. 
A perspectiva depende sempre do ponto de fuga...

2010/11/23

Mobilizar

GREVE GERAL!
24 de Novembro, 2010

A lição da Irlanda

Agora que a Irlanda, pressionada pela Alemanha e pelo BCE, acabou por pedir a intervenção do FMI (100 mil milhões de euros para acudir ao sistema bancário irlandês) caiu mais um mito do modelo económico neo-liberal, tão elogiado pelos governantes portugueses que viam no "tigre celta" a referência europeia para a nossa economia. Pelos vistos, não chegaram as medidas draconianas impostas ao povo irlandês, a quem foram pedidos os maiores sacrifícios há menos de um ano com a promessa que, daqui a uns tempos, a situação iria melhorar. Da mesma forma que os sacrifícios pedidos ao povo grego não saciaram os interesses dos especuladores e banqueiros internacionais (eufemisticamente designados por "mercados") e que conduziu à mesma receita aplicada na Irlanda, ou seja, a entrada do FMI na Grécia.
Mal era conhecida a decisão irlandesa, já as "nervosas" bolsas notavam em baixa os índices bolsistas espanhóis, sinal que alguns analistas interpretaram como um possível ataque a Espanha por parte dos especuladores.
Resta Portugal, o quarto "PIG", que há muito faz parte do elo fraco do sistema Euro e que, por essa razão, é manchete diária nos principais orgãos de referência económica internacional, como o "Financial Times", o "The Economist" ou o holandês "De Volkskrant". Bem podem os governantes portugueses, como Sócrates e Cavaco, repetirem à exaustão que os nossos bancos são saudáveis e que não temos uma crise sistémica semelhante à Irlandesa. A pressão é enorme e Merkel, secundada por Sarkozy, não esconde o seu desejo: uma Europa "a duas velocidades", onde os países economicamente mais fracos devem abandonar o Euro se tal for necessário.
Acontece que, a verificar-se tal medida, o próprio Euro será posto em causa. Tentar resolver um problema económico, sem medidas políticas adequadas, é mais um passo para o abismo a que esta política desastrada conduziu. Ou seja, sem coragem política que limite o desregulamento financeiro actual, não há projecto europeu que resista e, para isso, é preciso voltar a pôr a política a comandar a economia, questão que os governos da União Europeia não querem resolver. É nestas alturas que são necessários estadistas, coisa que, obviamente, não se verifica na Europa a vinte sete, hoje dirigida por meros executantes da grande finança especulativa. Não extrair as devidas lições no tempo certo, conduzir-nos-á, inevitavelmente, a uma crise ainda maior, cujas consequências são para já imprevisíveis. A Irlanda devia, por isso, constituir o aviso necessário. Mas, pode já ser tarde.

2010/11/21

A hermenêutica e as frases históricas

A ministra da cultura diz que não há outra solução senão aceitar os cortes de 23% previstos para a cultura. Vai ficar na história esta ministra.
É conhecida aquela expressão "quando ouço a palavra cultura saco logo da pistola", que terá sido proferida por Hanns Johst (um escritor expressionista nazi) e depois aproveitada por Göring.
Vejam lá quem, ao fim destes anos todos, acabou mesmo por dar o tiro...! Que o sorriso vos não engane.