2011/12/31

Honour and Shame

Simin e Nader, um casal de classe média iraniana, têm um conflito conjugal. Ela pretende abandonar o país, por razões que nunca saberemos; ele recusa-se a abandonar o pai, demente com Alzheimer. Simin quer o divórcio e levar a sua filha e esta recusa-se a abandonar o pai, que não concede o divórcio a Simin.
Razieh e Holjat, um casal pobre em dificuldades, estão empenhados com dívidas, o que leva Razieh a procurar trabalho doméstico. Através de uma amiga comum, a professora das filhas de ambos os casais, arranja emprego em casa de Nader, sem saber que o pai deste tem Alzheimer.
Um dia, ao chegar a casa, Nader depara com o seu pai caído no chão, com um braço atado à cama. Razieh não estava e faltava dinheiro no cofre. Nader confronta a empregada com o abandono do pai e o desaparecimento do dinheiro e despede-a. Na discussão que se segue, Razieh, grávida, é empurrada e cai na escada, o que lhe provoca um aborto e a morte do filho. Segue-se um processo em tribunal, onde Holjat acusa Nader da morte do seu filho e Nader acusa Razieh de ter abandonado o seu pai.
O que se segue, é uma verdadeiro processo na procura da verdade, onde o juíz (de acordo com a lei da "sharia") confronta acusadores e acusados com as suas contradições, obrigando-os a reconhecer os factos. O realizador, Asghar Farhadi (fixem este nome) recusa-se a tomar partido e convoca todas as testemunhas factuais: as filhas dos casais, a professora, os familiares e as vizinhas, para deporem, num filme que nos prende e entusiasma do primeiro ao último minuto. Nada fica por escalpelizar: das relações familiares, às classes sociais, do ateísmo à religião, das convenções na vida social e do medo existente na sociedade iraniana. Uma obra, que julgávamos impossível fazer no Irão actual. Definitivamente, um dos grandes filmes do ano. Chama-se "Uma Separação" e só posso recomendá-lo. Boas entradas e melhores filmes em 2012!

2011/12/26

A fé remove montanhas

Passos Coelho diz querer restaurar a confiança dos portugueses, promete mudança, anuncia um tempo novo. É tudo mentira!
São desejos aparentemente motivadores, são palavras fortes, mas é outro o seu valor facial. Suponho que a "confiança" que pretende restaurar seja a que os portugueses perderam inexoravelmente em si e no seu governo. Suponho também que a "mudança" que anuncia para 2012 seja em direcção a uma perseguição ainda mais feroz, mais dissimulada e mais cínica aos trabalhadores, agora que a sua prática —a que gerou a tal desconfiança— lhe fez perder credibilidade, mesmo junto de alguns dos seus mais ferrenhos apoiantes. Suponho ainda que o "novo tempo" que quer ver implementado seja o da instalação dos seus láparos para consolidar este trabalho prévio de teste à resiliência dos portugueses perante a tentativa de destruição do país em curso.
Não percebo como é que com a mesma corrupção, os mesmos protagonistas, os mesmos maus exemplos, as mesmas desculpas, as mesmas irresponsabilidades, a mesma impunidade, as mesmas práticas, as mesmas tentações e os mesmos pecados, sem um plano, sem um pensamento fundador que se possa perceber, mesmo lá muito ao longe, no seu discurso, o senhor Primeiro Ministro quer demonstrar que é capaz de mudar o que quer que seja.
A observação é válida, de resto, também para os seus ministros e afins. O "cientista" e o "economista" (e, lá no fundo, vê-se mal porque está desfocado, o "escritor"), por exemplo, parecem ter esquecido a "teoria" toda que os conduziu ao seu presente estatuto. Não o dignificam. A reflexão que produziram sobre as suas áreas de especialidade foi toda pelo cano abaixo. Agora é tempo de levar a teoria à prática e executar o papel que lhes foi distribuido: manter a mesma corrupção, os mesmos protagonistas, os mesmos maus exemplos, as mesmas desculpas, as mesmas irresponsabilidades, a mesma impunidade, as mesmas práticas, as mesmas tentações e os mesmos pecados, a mesma falta de plano e de um pensamento fundador... sem dinheiro.
Talvez tudo isto não passe então de uma questão de fé. Não me surpreenderia se viéssemos a ver Passos Coelho, acompanhado pelas câmaras da tv, arrastando-se um destes dias de joelhos até Fátima na esperança de que a coisa mude e a confiança volte, enquanto canta "Ó tempo volta p'ra trás..."