2007/11/16

A corrente "página 161"

Rini Luyks (colaborador do blogue "Anacruses") incluiu "A Face Oculta da Terra" numa lista de cinco blogues a quem desafia continuar uma "corrente literária" com base nos seguintes pressupostos:
1. Escolher um livro ao acaso, com mais de 161 páginas.
2. Abrir na página 161 e escolher a 5ª frase completa dessa página.
3. Transcrevê-la no blogue.
4. Descrever o seu contexto.
5. Indicar 5 blogues e desafiá-los a fazer o mesmo.

Respondendo ao desafio (sabe-se lá o que o destino me trará de bom!) aqui vai a frase encontrada:

"Nesse teu jardim - disse Noel - o que é que lá plantaste?"

(do livro: "A Vida e o Tempo de Michael K" de J.M. COETZEE, Trad. Ricardo Fernandes, Ed. D. Quixote, 2007)

O livro relata a odisseia de um jovem (Michael K) que decide levar a sua mãe, doente, para fora da área policial da península do Cabo, durante o regime "apartheid" na África do Sul. Trata-se da mais recente tradução portuguesa de J.M. Coetzee (que não o seu último livro) um dos grandes escritores da actualidade.

Aproveito, para sugerir outros cinco blogues:

"aspirina b"
"crónicas da terra"
"miniscente"
"respirar o mesmo ar"
"esculpir o tempo"

Boas leituras!

2007/11/13

OTA "jamais"?

Agora que a presidência portuguesa "europeia" vai terminando o seu mandato, regressa a polémica da OTA. O processo, interrompido em Junho para evitar danos que podiam tornar-se irreparáveis para o executivo, foi adiado por seis meses com a promessa de mais e melhores estudos sobre a localização definitiva do aeroporto de Lisboa. Uma manobra inteligente, que afastou temporariamente as atenções de um ministro desastrado e permitiu ao governo dedicar-se a questões internacionais mais importantes. Só que o tempo não pára e, aos estudos encomendados pelo governo, outras encomendas se seguiram, das quais a primeira (CIP) já é, entretanto, conhecida. Outra se seguirá (ACP) e nada prova que seja pior que as anteriores.
Temos assim, duas propostas conhecidas e uma em vésperas de tornar-se pública, para além de um instituto (LNEC) que fará a análise comparativa e a avaliação definitiva do que - espera-se! - seja a última palavra sobre esta interminável saga.
Em todo este intrincado processo algumas questões parecem óbvias. Por exemplo: como é possível que, durante os trinta anos de estudos, a opção Alcochete nunca tenha estado em cima da mesa? Se esta não era possível (dada a existência de um campo de tiro) porque é que uma simples intervenção do Presidente da República alterou definitivamente as limitações da escolha? Mais, como é possível que o estudo da CIP, em apenas meia-dúzia de meses, tivesse chegado a conclusões notoriamente mais favoráveis do que todos os estudos precendentes encomendados pelo governo?
Estas são, naturalmente, perguntas do senso-comum que qualquer cidadão interessado fará. Não se percebe, por isso, a reacção do ministro Lino, ao desvalorizar as conclusões que dão preferência a Alcochete e declarar, inclusive, que não tem tempo para ler todos os relatórios que lhe chegam às mãos. Pior, ao que parece encomendou um terceiro estudo (RAVE) que contraria as conclusões do estudo da CIP. Ou seja, mesmo que não seja essa a intenção do ministro, dificilmente ele conseguirá fazer passar a ideia de que tudo está a ser feito para construir o aeroporto no melhor sítio e ao melhor preço possível. Se não é assim, porquê estas reticências?
A menos que haja razões que a razão desconhece, este comportamento relembra-nos um passado não muito distante em que a margem Sul não passava de uma miragem. Confesso que já tinha algumas saudades da "stand-up comedy" nacional.

Leituras cruzadas

O meu amigo, o encenador Fernando Mora Ramos, publicou no Público do passado dia 10 de Novembro um artigo intitulado "Um em cada cem". O artigo aborda a questão das verbas destinadas pelo OE à cultura e a este propósito lembra a posição do governo: que não haja "ilusões, o Governo tem de definir prioridades."
FMR afirma "Como a história ensina não há transformação sem uma base cultural forte. E a mudança actual é para trás, não ao contrário. Não tenhamos ilusões."
Mas, então e os propósitos anunciados pelo governo quanto ao desenvolvimento? E a aposta no incremento do conhecimento e na qualificação dos Portugueses? E a ciência? A ciência não é cultura?
Quis o acaso que andasse a ler um livrinho intitulado "Scientific Curiosity", de Cyril Aydon, onde a páginas tantas deparo com o seguinte parágrafo (traduzo livremente):
"A ciência, tal como hoje a concebemos, aconteceu apenas duas vezes na história do mundo. E entre o crepúsculo do mundo Grego e o amanhecer da moderna era científica tivemos um hiato de 1500 anos, durante o qual pouco ou nada foi acrescentado ao nosso património de conhecimento científico. Porquê? Poderia ser genético. Os Gregos não eram mais espertos que os Romanos ou os Chineses, nem os habitantes da Europa mais espertos que os Aztecas, ou o povo do Zimbabwe. Talvez a explicação esteja na economia: a ciência só pode prosperar em sociedades suficientemente ricas para permitir que uma série de gente se sente para pensar e conversar. Mas, a riqueza e o tempo livre não podem ser a explicação senão a antiga Roma e a China Clássica teriam sido fábricas de ciência. A explicação deve ser de índole cultural, para além de econonómica. Algumas sociedades estão organizadas de forma --e desenvolvem hábitos de pensamento-- que torna a ciência viável. Outras, igualmente prósperas, tem formas de organização, códigos de crenças e formas de pensamento que fazem definhar a ciência. As sociedades com um respeito exagerado pelo passado não podem gerar a atitude de desafio às ideias feitas que produz novas formas de compreensão. As sociedades em que os sacerdotes têm poder tendem a aprisionar ou suprimir aqueles que ameaçam o seu monopólio na explicação das coisas. Quando o discurso e o pensamento livres são constrangidos, a mente e o corpo apodrecem agrilhoados."
Não há sequer mudança em Portugal. Nem para trás, nem para a frente.