2015/06/24

Pedir contas

"Foram descendo o Chiado. Do outro lado os toldos das lojas estendiam no chão uma sombra forte e dentada. E Carlos reconhecia, encostados às mesmas portas, sujeitos que lá deixara havia dez anos, já assim encostados, já assim melancólicos. Tinham rugas, tinham brancas. Mas lá estacionavam ainda, apagados e murchos, rente das mesmas ombreiras, com colarinhos à moda."

Os Maias (1888), Eça de Queirós


A jornada de solidariedade com a Grécia da passada segunda feira foi um fracasso total.
Uma vergonha, diria mesmo, à semelhança do que se tem passado com outras iniciativas destinadas a protestar contra a loucura neo-liberal que têm sido (mal) organizadas neste país, tenham elas maior ou menor expressão, maior ou menor adesão. Uma vergonha que não conseguiu sequer mobilizar os transeuntes que passavam do outro lado da praça ou os artistas de rua que se exibiam mesmo ali ao lado. Uma vergonha que defrauda as expectativas mais profundas de uma larga maioria de Portugueses que sofre na pele as consequências das políticas desta Europa fascizóide.
São actos que revelam uma total irresponsabilidade e têm consequências desastrosas para a luta política.
É que, este tipo de inciativas, para além de projectar uma imagem deturpada do que significa a solidariedade com o Povo Grego e uma falsa perspectiva sobre as reais consequências que a sua luta tem para a nossa luta, dá argumentos ao governo para insistir nas suas teses políticas sobre a Grécia e, no pólo oposto, dá razão aos fanáticos da organização, que criticam com razão a sua inconsequência, mas se esquecem que a sua "organização" há muito que se transformou em móbil único e é, ela própria, no fundo, inconsequente.
Esta é uma causa que nos diz respeito a todos. Não há fracturas possíveis. A todos, na proporção das suas responsabilidades, é necessário pedir contas sobre o seu papel nesta luta. O que andam, particularmente, a fazer as direcções políticas da oposição em Portugal?

2015/06/21

A ouvir

Recomendo vivamentte a audição das 3 edições do programa Quinta Essência (de João Almeida), na Antena 2, com Frederico Delgado Rosa. Esta série foi emitida a propósito do seu livro "Humberto Delgado: biografia do general sem medo".
Relembrar este processo ajuda-nos a perceber muito do que se passa ainda hoje na nossa vida política e explica muito dos tiques do poder que persistem.
A Democracia continua, tantos anos volvidos, a não ser um valor sagrado em Portugal. Vivemos, de facto, num regime fascista.
Os programas (emitidos a 31 de maio, 7 e 14 de junho) estão disponíveis aqui.