2015/12/31

Filmes que valem a pena



E pronto, terminou mais um ano. O do calendário e o das efemérides. Também o ano dos acontecimentos, para lembrar e para esquecer. Para esquecer, já basta assim. Para lembrar, entre outras coisas boas, ficam os filmes, o sonho possível, que a realidade não se deixa sonhar.
Comparado com o ano anterior, 2015 não foi um ano de grande safra. Entre as dezenas de filmes vistos, alguns ficaram na retina que é, como quem diz, na memória. Eis os meus favoritos, ordenados cronologicamente, sem qualquer ordem de preferência:

  1. PASOLINI de Abel Ferrara (2014)
  2. LEVIATÃ de Andrey Zvyagintsev (2014)
  3. O ÚLTIMO DOS INJUSTOS de Claude Lanzmann (2013)
  4. BIRDMAN de Alejandro G. Jñárritu (2014)
  5. O OLHAR DO SILÊNCIO de Joshua Oppenheimer (2014)
  6. REGRESSO A CASA de Zhang Yimou (2014)
  7. AS MIL E UMA NOITES de Miguel Gomes (2015)
  8. LISTEN TO ME MARLON de Stevan Riley  (2015)
  9. RIO CORGO de Maya Kosa e Sérgio Costa (2015)
10. MINHA MÃE de Nanni Moretti (2015)  

Para além dos filmes estreados, de assinalar as retrospectivas e os ciclos dedicados a Roberto Rosselini, Ingrid Bergman, Jacques Tati e  Krzysztof Kieslowsky, como os mais marcantes, num ano em que a Medeia e a Midas, uma vez mais, deram a ver bom cinema em Portugal.
2015 seria também o ano do desaparecimento de dois dos mais marcantes realizadores portugueses, Manoel de Oliveira e José Fonseca e Costa. O cinema português ficou mais pobre.
Resta desejar um bom ano - e melhores filmes - em 2016!


2015/12/30

Casa Júlia

"Os agressores, raramente são psicopatas. Não é esse o padrão mais comum. São, normalmente, homens criados em meios sociais de baixa educação, onde o papel da mulher continua a ser de submissão. Estamos a falar de uma questão cultural, ainda que a violência doméstica possa ter lugar em todos os estratos sociais, dos mais pobres e destruturados aos mais ricos e educados. Uma herança de uma sociedade patriarcal e machista, como é a sociedade  portuguesa". As palavras são da representante da UMAR (União de Mulheres Alternativa e Resposta)  no dia em que a comunicação social anunciava mais uma vítima de violência doméstica: a 29º em 2015. De acordo com o relatório anual da mesma organização, entre 1 de Janeiro e 20 de Novembro, 33 mulheres foram vítimas de tentativa de homicídio. Em 2014, 35 mulheres foram assassinadas por ex-maridos, companheiros ou namorados. Outras sete mulheres foram assassinadas por outros familiares.
Uma verdadeira chaga social e civilizacional, que nos devia envergonhar a todos.
Para combatê-la, foram criados programas, organizações e pontos de apoio (casas abrigo), onde podem ser denunciadas (e protegidas) as vítimas deste verdadeiro flagelo nacional.
Uma delas, é a "Casa Júlia", situada numa esquadra policial de Lisboa, baptizada com o nome de uma dessas mulheres, morta na mesma rua.
Os contactos escritos, para informações ou denúncias, podem ser feitos através do endereço de mail: <casajulia.lisboa@psp.pt> ou, telefonicamente, através dos números: 214161147 e 214161148.
Denunciar a violência doméstica é um dever moral e cívico em qualquer sociedade.               

2015/12/29

Urgente

A Jovem e a Morte, de Marianne Stokes

É urgente remodelar as urgências dos hospitais, que não funcionam, quando mais urgentes são os seus serviços. A recente morte do jovem de Santarém, por falta de assistência atempada no tratamento de um AVC, veio despoletar uma discussão velha de anos, agora divulgada pelo relato dos familiares, sem o qual não teríamos sabido a existência de mais quatro casos semelhantes. Ontem mesmo, um novo caso, agora no hospital de Faro, provocou a sexta morte (!?) por falta de assistência a uma vítima de AVC nas urgências, o que excede toda e qualquer tolerância para este tipo de procedimentos.
Invocam-se os cortes verificados na saúde, devido à austeridade financeira a que Portugal está sujeito, como explicação para a falta de médicos nos fins-de-semana. É certamente uma explicação contabilística, que não resolve o problema de saúde dos cidadãos, que têm direito constitucional (SNS) a serem tratados, independentemente de terem posses financeiras, ou não. Em última análise, se os hospitais públicos não estão apetrechados para determinado tipo de intervenções (as operações de doentes, que sofreram um AVC, implicam uma equipa de cirurgiões especializados), devem existir escalas nos principais hospitais nacionais (privados inclusive) que permitam, de forma rotativa e satisfatória, operar doentes em risco de vida iminente. A filosofia só pode ser uma: salvar a vida primeiro e exigir o pagamento depois.
Por outro lado, e não sejamos ingénuos, as lacunas do incensado Serviço Nacional de Saúde, já vêm de longe e não começaram com a chegada da Troika a Portugal. O desmantelamento progressivo de apoios intermediários e unidades hospitalares no interior do país, é uma tendência da última década e iniciou-se com as aberrantes decisões do ministro de saúde de então (Correia de Campos), cujo afã para encerrar serviços, obrigou dezenas de portuguesas irem ter os filhos a clínicas espanholas. Alguém imagina uma cidadã espanhola vir a Portugal ter os seus filhos, por falta de apoios no seu país?
Eu próprio, fui testemunha da falta de meios humanos em diversos hospitais da periferia de Lisboa, nomeadamente durante a noite e nos fins-de-semana. No Hospital Amadora-Sintra, por exemplo. Por alguma razão, as urgências nesse hospital registaram, no ano passado, tempos de espera de 17 e mais horas (!?), o que pode revelar-se fatal, como é o caso de um AVC, com sequelas para a vida.
Não basta, por isso, pedir a demissão, como fizeram os principais responsáveis pela saúde da região de Lisboa. Por muito nobre que o gesto pareça, a causa desta inoperância é estrutural e tem de ser assumida pelos governantes em gestão. O sistema existente não funciona, os meios humanos são reduzidos, os médicos queixam-se de não serem chamados aos fins-de-semana por falta de verbas e os doentes têm de esperar mais de 48horas, antes de serem atendidos. Para seis desses pacientes, a espera foi fatal. E é isto que não pode acontecer. Nunca mais.
Esperemos que o partido do novo governo, responsável pela criação do Serviço Nacional de Saúde, motivo de orgulho de todos nós, saiba extrair as lições desta catástrofe. É urgente tratar das urgências.