2010/07/03

"Tudo o resto é hermenêutica"

Alberto Manguel é um autor por quem tenho uma especial admiração. Numa excelente entrevista publicada ontem no Público, quando lhe perguntam se pensa que a leitura está a perder terreno, responde "O que está a perder terreno é a inteligência. Estamos a tornar-nos mais estúpidos porque vivemos numa sociedade na qual temos de ser consumidores para que essa sociedade sobreviva. E para ser consumidor é preciso ser estúpido."
Não sei se a Ministra da Cultura percebe perfeitamente o que significa ocupar um cargo de Estado e se sabe do que fala quando usa a expressão hermenêutica no seu artigo "Cultura sem hermenêutica", também ontem vindo a lume no Público.
Mas, sei que esse artigo confirma a total justeza do comentário de Manguel.

2010/07/02

"Façam sopa!"

Prossegue a nova telenovela "Ao Vivo com a Telefónica". Os accionistas não querem saber do valor estratégico da PT. O Governo decide ditar a política de gestão da empresa. Se tem valor estratégico por que razão está na mão de privados? Se deixaram que se tornasse privada por que razão o governo decide intervir?
O valor estratégico da empresa resume-se --uma ideia chave que me parece consensual-- à sua capacidade como empregadora e criadora de mais valia tecnológica inovadora. A Vivo só estorva neste contexto. Vamos inovar tecnologicamente para a Vivo? É isto o valor estratégico da PT?
A inovação e a mais valia tecnológica constituem um activo que não tem limite e pode ser rentabilizado até ao infinito. A Vivo limita o desenvolvimento estratégico da empresa. Os espanhóis querem a Vivo e oferecem pela empresa praticamente o que vale PT. Os portugueses acham que sem a Vivo voltam ao campeonato da 2ª divisão. O sentido de "inovação" e a dimensão do seu conceito de futuro revelam-se em todo este processo: passa por vender chamadas aos brasileiros.
Eu cá nem hesitava. Vendia já a Vivo, criava uma PT fornecedora de mais valia tecnológica inovadora e comercializava-a. Se calhar, vendia-a à Vivo, à Telefónica e a quem mais dela necessitasse. Com a massa feita pela venda criava um grande centro de inovação tecnológica, uma coisa mesmo a sério num projecto com dimensão. A PT é talvez a empresa que está melhor colocada para corresponder aos desafios que se colocam a Portugal.
Mas, sair da "crise", pelos vistos, para estes dirigentes é obrigar uma das maiores empresas nacionais a remeter-se ao papel de vendedor de chamadas a brasileiros e assim ir criando mais valias financeiras que vão enganando o défice... Eis o significado de estratégia.
Por aqui se vê o que valem a ambição, a visão, o sentido de voo e de valor acrescentado e os grandes desígnios de todas estas aventesmas que nos dirigem politicamente. O que vale o discurso tipo Magalhães.
Por aqui se vê também o que vale a crítica dos críticos deste governo, porque ainda não vi ninguém insurgir-se contra esta tendência para o voo rasteiro e esta ambição que se fica pela criação de pacotes de chamadas para brasileiro comprar. De uma forma ou de outra (a favor ou contra a golden share), os partidos querem é vender chamadas. Todos unidos contra os espanhóis! Este caso convocou os fantasmas de Aljubarrota e até criou um inusitado grupo de "bed fellows", como se diz em inglês.
É isto Portugal hoje. O TGV avança, para logo recuar, os chips avançam para logo recuarem, a retroactividade dos subsídios na cultura avança para logo recuar. E agora, para completar o ramalhete, a PT transmite a Vivo em diferido.
Hoje o PM achava que perante um novo recorde da taxa de desemprego está tudo na maior, a Ministra da Cultura defende a venda da hermenêutica também quiçá aos espanhóis, ou mesmo aos brasileiros, e a Ministra da Saúde manda, de forma grotesca, a malta  "fazer sopa", para, aproveitando a crise, não engordar.
O pior, de facto, que poderia acontecer seria deixar os portugueses engordar...

2010/06/30

Estado Português 1 - Telefonica Espanhola 0

Cá se fazem, cá se pagam...

The Island

Hoje ouvi o senhor Procurador Geral da República barafustar contra "os portugueses" porque dizem mal de tudo. Ele é a saúde, a justiça, a educação, nada está bem para "os portugueses", segundo o senhor PGR.
Como se depreende das palavras do senhor PGR está, pois, tudo uma maravilha, o que está errado... são os portugueses.
Pois senhor PGR, há que dizer que V. Exa. está totalmente equivocado. Fosse isto um país a sério e não a infeliz opereta de que V. Exa. é um dos protagonistas e talvez V. Exa. estivesse já há muito fora do elenco, ou talvez nem nele tivesse mesmo entrado.
Repare V. Exa. no seguinte. A minha mãe tem 95 anos e foi há pouco operada a uma fractura do fémur, num hospital recentemente inaugurado com pompa e circunstância. Ainda mal lhe tinham tirado a máscara da anestesia já a ameaçavam com alta, porque "hospital não é asilo", sic! Mas, adiante...
Ora, hoje fui com ela a uma consulta nesse hospital recentemente inaugurado, com pompa e circunstância. Lá chegado dirigi-me ao serviço para requisitar uma cadeira de rodas
Será fácil imaginar que a minha mãe não está em condições de percorrer os longos corredores desse magnífico e novo hospital, inaugurado com pompa e circunstância...
A funcionária do serviço informou-me que durante o fim de semana a sala onde se encontram armazenadas as ditas cadeiras de rodas tinha ficado aberta e que as urgências deste magnífico hospital,  inaugurado com pompa e circunstância, tinham vindo sacar à sorrelfa todas as cadeiras disponíveis. A solução, dizia-me a solícita funcionária, seria eu ir ao serviço de urgência (um outro edifício, longe deste onde me encontrava) recuperar uma das cadeiras surripiadas, em pleno fim de semana, do serviço de consultas do moderno hospital.
Como fazê-lo? Onde iria eu deixar a senhora enquanto participava na operação de resgate da cadeira surripiada? Onde a iria sentar entretanto? Não podendo aceder à sugestão da dita e gentil funcionária lá tentei resolver o assunto como me foi possível. Acaba sempre por haver uma maneira, ou não fossemos nós conhecidos pelo desenrascanço.
Já na sala de espera, à falta de cadeiras de rodas, havia dois monitores que passavam, sem cessar, imagens obsessivas, felizmente mudas, do primeiro ministro e do presidente do conselho de administração do dito hospital inaugurado com pompa e circunstância, acompanhadas de sequências onde se podia ver o hospital em funcionamento quase idílico, tudo brilhante e funcional, e o slogan "A saúde da nova geração" a aparecer em momentos cuidadosamente cronometrados.
As imagens faziam-me lembrar aquele filme chamado "The Island", não sei se viu. Era tudo branco e luminoso. Os personagens das tais imagens idílicas sorriam de felicidade. Dos seus dentes soltavam-se pequenas estrelas.
Neste hospital não está tudo mal. Melhor seria! Mas, são pormenores como este que lhe descrevi que juntando-se a todos os outros levam a dizer que está tudo mal. Infelizmente, situações como esta multiplicam-se com uma frequência indesejada. Uma só já seria demais. E a solução acaba sempre por cair em cima do cliente. Seja nos desmandos da banca, seja nos da administração pública, seja nas cadeiras de rodas. O cliente desta unidade de "saúde de nova geração" que vá buscar a cadeirinha que uma organização deficiente permite subtrair...
Nos monitores da sala de espera aparecem os responsáveis por tudo e é isso que levará os utentes a pensar que tudo está mal. Pois se o primeiro ministro e o administrador-mor aparecem nos monitores da sala de espera a dar a cara por uma unidade hospitalar tida como exemplar, ainda com cheiro a tinta fresca e a gente quer uma cadeira de rodas e ela foi palmada, o que quer V. Exa. que a gente pense? Se eles são os responsáveis por tudo, e isto acontece, está tudo mal!
É como V. Exa.. Tivesse V. Exa. pensado melhor, senhor PGR, e talvez a simples ideia de que o cliente poderá por certo ter alguma razão o obrigasse a temperar as declarações. Tivesse V. Exa. pensado que o cliente lhe paga o ordenado e que tanta queixa poderá, poderá!, acabar mesmo por ter fundamento e teria V. Exa. ficado calado. Levasse V. Exa. a sua função a sério e talvez os alvos do seu comentário se invertessem. Outros alvos seriam objecto da sua intervenção. Por isso a gente pensa que a PGR está toda mal.
Não estamos todos (ainda) na Island... Mas, pagamos já todos os altos custos da insularidade.

2010/06/27

Swiss-brazuca


Este desporto da febril troca de videos do Youtube que grassa por aí traz-nos, por vezes, surpresas. É raro, mas acontece. Um amigo chamou-me há tempo a atenção para o video anexo (Top Secret Drum Corps, de Basileia - Suiça), adicionando o comentário: "parecem brazucas disfarçados"...
É preciso ver o video para compreender a expressão, que é, de facto, totalmente apropriada.
Para honrar o comentário criei o singelo poema que aqui vos deixo. Dedico-o ao querido amigo que me deu isto a conhecer e, em pleno espírito do Mundial 2010, a todos os sopradores da vuvuzela por esse mundo fora... Que o som dela vos traga os piores pesadelos!
Assim se dá oficialmente início à silly season aqui no Face.


Swiss-brazuca

Misto de precisão tresloucada!
Relógio que tiqui-tiqui-táka!
Tikitikitikiti!
Tá-tá-boom-boom!
Acarajé de chocolate!
Edelweiss do Pantanal!!
É Wilhelm? No telling...
É Guilherme? More likely!
Eh suiço ruim!
Nestlé-té-té-ré-ré!
Eh brazukas dos alpes!
Pauliteiros de pulso e de bolso.
Cangaceiros da confederação helvética do Piáui!!
Yodelériti-ti-ti-ti-taka-dadabum-bum!
A conta é secreta?
Que grande forró.
Cuíca não é cantão!
Tem mania d'arrumação?
Samba tem precisão?
Não, é anal na retenção.
E é neutral de coração...
Saravah, meu'irrrrrmão!!