2018/11/22

Bons filmes, no Lisbon&Sintra Film Festival


Iniciou-se em 2006, no Centro de Congressos do Estoril, ao lado do Casino. Chamou-se "Estoril Film Festival", que juntava um programa de estreias e ciclos temáticos com a presença de figuras do "jet set" internacional, para dar um ar de "glamour" à coisa, não fossem os convidados não saberem onde ficava o Estoril. Claro está que, por detrás do evento, havia o patrocínio do casino (a principal receita da região) e a necessidade de pôr aquela, que em tempos idos já foi a nossa principal "resort" turística, no mapa. Uma "Cannes", à dimensão nacional, vá. Paulo Branco, o seu principal impulsionador e director permanente, viu ali uma oportunidade de fazer uma coisa de que gosta (divulgar bom cinema) e, ao mesmo tempo, arranjar apoios para os filmes de que é produtor (a sua principal actividade). Portanto, criou-se um festival, à imagem de acontecimentos semelhantes no Mundo, com alguns meios e contactos, ainda que sem o reconhecimento internacional e as "luzes" de Cannes, Veneza ou Berlim, eventos onde os filmes na secção de competição são apresentados em estreia mundial, onde os prémios atribuídos constituem um passaporte para a fama, onde o júri é constituído por personalidades do meio e onde os directores são nomeados pelos conselhos de administração dos eventos...
Logo nas primeiras edições, o Festival criou uma extensão em Lisboa, passando a chamar-se "Lisboa & Estoril Film Festival", com a maior parte da sua programação a ser apresentada nos cinemas Medeia, dirigidos por Paulo Branco.
Pesem as individualidades do Mundo do cinema e outras artes trazidas ao Estoril (Bertolucci, Robert de Niro, David Linch, J. Coetzee, Willem Dafoe, Juliette Binoche, Laurie Anderson...), a estância turística da costa do sol, nunca se afirmou como centro cinematográfico e é em Lisboa que os filmes são vistos e comentados. Provavelmente, por essa razão, a designação "Estoril" deixou de figurar no nome do Festival, tendo sido substituída por "Sintra", o que pressupõe um novo patrocinador do evento. Desde a última edição, que os filmes em competição são igualmente exibidos no Centro Olga Cadaval, a principal sala de espectáculos da vila, que substitui o antigo Centro de Congressos do Estoril.
Em Lisboa, os cinemas Medeia (Monumental e Nimas) continuam a exibir 80% da programação e é lá que os cinéfilos se encontram para ver o programa que, mais uma vez, é vasto e variado.
Nesta edição, a 12ª desde a criação do festival em 2006, destaque para os 11 filmes em competição, que um júri, do qual fazem parte nomes como Walter Salles, Marthe Argerich, Jonathan Littell e Chrysta Bell, entre outros, julgará e premiará de acordo.
Outros destaques da programação, são os filmes da selecção oficial (fora da competição), o ciclo "Waiting for Mr Lynch", os tributos a Darezhan Omirbayev, João Botelho, Walter Salles e Mario Martone e as retrospectivas dedicadas a Mike Leigh e Paul Schrader, para além dos programas especiais como "O Desejo Chamado Utopia" e "Neoliberalismo - A semente do Populismo e dos novos Fascismos?", estes últimos centrados em obras e temas da actualidade, com debates ao longo do evento. São mais de 200 filmes, a maior parte deles já estreados em Portugal (que agora regressam em cópias restauradas) e noutros países e festivais, que nunca foram estreados no nosso país.       
Dos filmes vistos esta semana, elogios para "Central do Brasil", o mais célebre filme de Walter Salles, que, após a exibição, manteve uma interessante conversa com os espectadores, sobre o filme e a actual situação politica no seu país, que o realizador caracterizou estar mais próxima das Filipinas de Duterte, do que da América de Trump. Vimos ainda um dos poucos filmes de Leigh que desconhecíamos ,"Um dia de cada vez", uma agradável surpresa, onde o realizador confirma todos os seus dotes, no tratamento de um argumento, aparentemente banal (o quotidiano e as relações de uma jovem professora londrina) e na direcção de actores, uma marca em todos os seus filmes. Muito bom.
Finalmente, "8, Rue Lenine", de Valérie Mitteaux e Anna Pitoun, um filme de tese, sobre a integração de uma família cigana de origem romena, que as realizadoras acompanharam ao longo de 15 anos, desde a sua expulsão e permanência em França em 2003, até ao regresso à Roménia, onde vivem actualmente. As realizadoras, presentes na sessão, pretendem continuar a filmar os descendentes destas famílias romenas e, dessa forma, acompanhar a sua integração na sociedade que os acolheu. Seguiu-se uma animada conversa com a assistência, onde estavam presentes portuguesas de origem cigana e a comparação entre a sociedade francesa e a sociedade portuguesa, relativamente à discriminação e integração das comunidades ciganas nas respectivas sociedades.
O Festival continua até domingo. Motivos para ver bons filmes, em Lisboa e em Sintra, não faltam.