2010/03/11

Leis e corolários

Os jornais revelaram recentemente um inquérito, levado a cabo pela BBC, dando conta que 87% dos portugueses consideram a Net como um direito fundamental. Só os turcos nos batem nesta fé digital.
Contudo, há um outro resultado bastante perturbante neste inquérito. 53% dos portugueses inquiridos revelam que se sentem inseguros quando expresssam das suas opiniões usando este meio.
Os portugueses, com outros povos que estiveram ou estão sujeitos ao garrote da censura, prezam a possibilidade de exprimirem livremente os seus pontos de vista, e vêem naturalmente na net uma garantia dessa liberdade e do repeito pelos seus direitos. Mas, avisadamente, percebem que há por aí ainda muitas caixas de lápis azuis escondidas.
Intuitivamente, sentimos que os espaços de opinião, designadamente aqueles que a internet proporciona, são espaços de liberdade rigorosamente vigiada. E não estou sequer a referir-me ao controlo do poder. Os próprios cidadãos convivem mal com a opinião dos outros. Embora o exercício público, saudável, desejável e democraticamente indispensável, do direito de opinião vá assumindo formas variadas e pujantes, esta prática da cidadania através da manifestação livre e responsável é ainda um acto que está longe de ser banal, e está visivelmente mal enraizado nos nossos hábitos colectivos.
Repare-se nos blogues e, sobretudo, no comentário. Aí se vê o mais das vezes o quanto esse exercício é penoso para alguns e suscita indisfarçáveis tiques fascistóides a outros. É disso exemplo o culto do "anonimismo" e a tentativa de boicote técnico, mais comum do que se pensa.
Numa perspectiva mais alargada, esta bronquite cívica, que impede a opinião de respirar livremente, longe de ser uma tendência em declínio, parece querer medrar.
Depois de --certamente com justiça, pelo que se sabe hoje-- o PSD ter acusado o PS de "asfixia democrática" (eu chamo-lhe bronquite, mas continuamos sempre no domínio da pneumologia...), eis que o próprio PSD faz aprovar uma norma que nos lembra aquela máxima do Frei Tomás.
Santana Lopes exigia neste último congresso do seu partido, que o primeiro ministro se demitisse ou "desse um murro na mesa", como forma de responder à crítica sobre as sinistras tentativas de limitação da liberdade de imprensa que lhe é feita. Logo a seguir vem propôr e vê aprovada a tal "lei da rolha" desenhada para conter a crítica interna. O congresso aprovou, Sócrates deve-se ter rebolado a rir com o resultado da votação e os paladinos da asfixia democrática foram todos para a tenda de oxigénio respirar à vontade...
Enquanto se critica o regabofe inaceitável a que tudo isto chegou, vemos aparecer por aí umas criaturas, aparentemente pias, preocupadíssimas com a possibilidade de a crítica a estes partidos, a esta vergonha de seitas que desgraçadamente temos de aturar, a estes partidos que dão tais exemplos de irresponsabilidade, poder estar, quiçá, a abrir a porta a putativos ditadores que saiam da toca e tomem conta da ocorrência. É o corolário da lei da rolha...

2010/03/10

Pessoas de Bem

Assistir às sessões da Comissão de Ética, que por estes dias decorrem na Assembleia da República, pode não ajudar a esclarecer quem pressiona quem, mas ajuda-nos certamente a perceber quem são sempre os mesmos que pressionam. Se já tinhamos as pressões de Sócrates (denunciadas explicitamente por Mário Crespo, Henrique Monteiro, Moura Guedes e Eduardo Moniz) ontem tivemos as pressões de Morais Sarmento (denunciadas por Henrique Granadeiro, ao tempo administrador do grupo Lusomundo). Segundo Granadeiro, o ex-ministro de Durão Barroso e Paulo Portas ter-lhe-á exigido a demissão de Leite Pereira (JN), Luís Tadeu (CM) e Joaquim Vieira (GR), directores de publicações controladas pela Lusomundo. Sarmento já se apressou a desmentir e quer agora ir à Comissão contar a sua versão. A opinião pública está a ficar cada vez mais baralhada e, se calhar, é mesmo essa a intenção: baralhar e dar de novo. Para que tudo recomece, com os partidos do costume a pressionarem e a manipularem os grupos económicos que detêm orgãos de informação e para serem estes a pressionarem os jornalistas. Daí ao despedimento, ou à aceitação da auto-censura, a que muitos jornalistas se prestam, vai um pequeno passo. Se isto não é pressão, vou ali e já venho. Tudo gente de bem, como se depreende.

2010/03/09

À guitarra e à viola

O Face foi alvo de uma tentativa de violação. É um facto. Não alinho em teorias da conspiração, acredito em coincidências e não quero fazer tempestades em copos de água, mas é um facto que houve uma tentativa de entrar aqui. Isto está a ficar interessante...
Temos backups do blog e, se por um azar, este ficasse inoperacional era subsituído em segundos.
É tudo.

2010/03/08

Há vida para além do PEC

A música não vai salvar o mundo, mas pode ajudar. O projecto das Orquestras Geração é uma iniciativa da Fundação Gulbenkian e da Câmara da Amadora, apoiado na Escola de Música do Conservatório Nacional e na Fundação EDP. Já conta, creio, dois anos. A inspiração vem do conhecido Sistema Nacional de Orquestras Juvenis e Infantis venezuelano, fundado por José António Abreu.
É justo dizer que no domínio da aplicação dos princípios da inclusão social e da aprendizagem do trabalho cooperativo através da música, as bandas filarmónicas, em particular --de uma forma voluntarista e totalmente desapoiada-- e as escolas Menuhin vêm de há muito dando um contributo decisivo nesta matéria. Mas, estas Orquestras Geração constituem um caso de sucesso, hoje e aqui, que contém lições que ultrapassam em muito o domínio das artes.
Se o País quisesse mesmo perceber o que tem de fazer para conseguir ir além do sacrossanto PEC --uma oportunidade perdida; um documento que lá ficou naturalmente aquém do que os abutres esperavam e do que seria necesssário-- bastaria atentar nos princípios e nos resultdos destas Orquestras Geração. Está lá tudo para quem quiser entender. Tudo!
Eu aconselharia os governantes (incluíndo a pianista Gabriela Canavilhas), os opinadores, políticos e para-políticos paralíticos deste país a atentarem melhor nestes exemplos que estão mesmo debaixo dos seus narizes e a inspirarem-se neles para fazer qualquer coisa de verdadeiramente útil pelo país.
Portugal entendido como uma orquestra de gerações? Uma orquestra criada para combater a exclusão social, onde o contributo de todos e de cada um é valorizado e onde cada um é responsável pela qualidade e valor colectivo desse seu contributo, onde se ensinam as virtudes do trabalho cooperativo e se enaltece a necessidade de regras colectivas para atingir um fim maior? Porque não?
Dá trabalho, exige criatividade e paciência. Se não perceberem vão lá ouvir estes miúdos que eles ensinam-vos como é...