2020/09/01

Silly Season: "Olhe, vá ao "site"!

Para quem, vindo da Andaluzia, entra de carro no Algarve, a travessia fez-se pela ponte do Guadiana, junto a Castro Marim. Uma vez passada a fronteira, são três as direcções possíveis: sair pela direita em direcção a Alcoutim; sair pela esquerda, em direcção a Vila Real de Santo António; continuar em frente pela A22 (mais conhecida por Via do Infante). A última opção, implica pagar portagens, uma modalidade criada em 2003, quando a Via do Infante, pensada inicialmente como via rápida (IP), passou a auto-estrada e foi concessionada por um período de 30 anos.

O que, na maioria das auto-estradas portuguesas pode ser feito através do pagamento a um funcionário ou, na ausência deste, através de uma máquina que aceita cartões de crédito, torna-se mais difícil, na A22, onde a operação é ligeiramente mais sofisticada. Se o carro tiver o sistema de "via verde", não há problema. Se o carro tiver matrícula estrangeira (e se fôr alugado) a coisa complica-se.

Um exemplo, vivido em meados da Agosto: 

Uma vez passada a ponte do Guadiana, deparamo-nos com um grande cartaz azul com estrelinhas da UE, onde os estrangeiros são alertados (em duas línguas) para o pagamento de peagem, através de uma máquina instalada no posto fronteiriço do lado português. Encontrada a máquina, tentámos activar o cartão de crédito com vista a pagar automaticamente as peagens seguintes. Debalde. A máquina não reconhecia o cartão. Explicámos o problema a um funcionário presente que, solicito, nos indicou a estação de gasolina mais próxima (saída de Olhão!) onde poderíamos comprar um cartão de crédito (5 ou mais euros), que permitia pagar peagens até ao montante "carregado" no cartão.

Lá fomos, em direcção à saída de Olhão, a mais de 30km de distância. Aí chegados, e depois de explicada a ocorrência, o empregado da estação vendeu-nos o cartão e um código, que teria de ser activado nas primeiras 24h. através de um SMS, para não termos de pagar peagens.

No dia seguinte, ao tentar activar o código fornecido, fomos informados por SMS, de que tal não era possível. O sistema não reconhecia o código (!?). 

Após várias tentativas frustradas, tentámos o número de telefone de apoio ao cliente, indicado no cartão. A mensagem do operador do "call-center", indicava que o número de telefone não era válido (!?). 

Em desespero de causa, e porque o cartão fornecido, para além do "logo" das Estradas de Portugal, indicava uma parceria com os CTT, dirigimo-nos a uma estação de correios de Tavira. Podia ser que lá pudéssemos activar o cartão e pagar as portagens. Porque já passava das 13h., também a estação dos CTT estava encerrada para almoço. Uma hora de espera e nova tentativa. A funcionária, foi curta e grossa: "aqui só tratamos de matrículas portuguesas. Para matrículas estrangeiras, deve dirigir-se aos correios, no centro da cidade". 

Nova tentativa, agora nos correios centrais de Tavira. Longa fila de espera, ao sol, dado o "distanciamento social" imposto pelo Covid. Uma vez entrados, tirámos uma senha com o "número de atendimento". A máquina estava avariada, imprimia metade da senha,  mas não imprimia os números. Restava-nos perguntar quem era o último da fila e esperar...

Atendidos por uma funcionária, esta mira o cartão e repete a resposta dada no outro posto dos CTT:  "aqui só tratamos de matrículas portuguesas". 

Como? Mas, lá disseram-nos que aqui podíamos activar o cartão e fazer o pagamento...

"Pois, mas a pessoa que lhes disse isso, informou-os mal"...

Sim, mas no cartão está o vosso logotipo, logo os CTT têm uma parceria com a estradas de Portugal. 

"Pois, temos, mas não podemos aceitar pagamentos, só podemos vender os cartões"...

Mas, afinal o que é que funciona bem no Algarve, se nem sequer os estrangeiros podem pagar as portagens que lhe são exigidas? Nós só queremos pagar...

"Não podemos fazer nada...a culpa não é nossa, mas de quem emite os cartões"...

Claro, mas se nada funciona, e ninguém é responsável, de quem é a culpa? Das Estradas de Portugal? Da concessionária? Dos CTT? Explique lá, para nós percebermos...

"Olhe, aconselho-vos a irem ao "site" das "Estradas de Portugal" e tentar a "Via Livre", que é a concessionária da auto-estrada. Lá devem ter um número de contacto e podem explicar a situação"...

Consultar o "site"? E se eu não estiver ligado à NET? E se eu fôr info-excluído e não tiver computador ou sequer telemóvel? Sabia que metade da população não tem computador e 40% é analfabeta funcional? 

"Não tenho nada a ver com isso e não podemos fazer nada"...

Consultado o "site" e encontrado o contacto, explicamos pela enésima vez o sucedido. Só queremos pagar as portagens e não ficar sujeitos a multas por ultrapassar a data prevista. O funcionário, depois de ouvir-nos, pergunta: "já tentaram a "Via Verde"? 

A "Via Verde"? Porquê? O que é que eles têm a ver com isto? 

"Tente a "Via Verde" e, se eles não ajudarem, volte a telefonar-nos". 

Tentámos a "Via Verde". O funcionário, que atendeu, ri-se e diz qualquer coisa como "se calhar venderam-vos um cartão falso... mas, vou ver no computador". Uma vez confirmada a matrícula, diz que este carro já passou várias vezes a fronteira e tem dívidas de 2019 (!?). 

Dívidas de 2019? Sinto-me numa novela de Kafka. Mas, nós, só ontem entrámos em Portugal...

"Pois, mas se o carro é alugado, pode ir e vir cá, várias vezes. Estejam descansados, que não tenho aqui registrada qualquer entrada de ontem. Enquanto não entrarem dados, não mandamos as contas para Espanha e não têm de pagar nada..."

Regressados a casa, decidimos escrever um Mail às "Estradas de Portugal" a explicar a situação e exigindo só pagar os percursos feitos naquele dia. Pelo sim, pelo não, pedimos a anulação do cartão de 5euros e carregámos um novo de 10euros. Simultaneamente, telefonámos para a agência espanhola onde o carro foi alugado. Descansaram-nos: se as portagens em dívida, forem inferiores a uma determinada quantia, eles não se preocupam em cobrá-las.

P.S.: No dia 31 de Agosto, chegou uma resposta das Estradas de Portugal: o cartão de 5euros não cobre as portagens feitas no Algarve, que foram de 8,50euros, pelo que ainda devemos 3,50euros...