2009/09/17

É possível rir disto?

Tenho uma costela que me grita a todo o momento a inutilidade do Estado e de outras instituições da "civilização". Mas, tenho uma outra que me diz que alguns poderão encontrar nele um justificação legítima. E tenho outra ainda que me diz "ai de nós se não tivermos um Estado activo e actuante."
O Estado tem um único objectivo: o exercício da justiça. Seja qual for a área --agricultura, indústria, ambiente, economia, cultura...-- o Estado serve apenas para corrigir, de uma forma ou de outra, as perturbações e os desequilíbrios que resultam da interacção social e dos handicaps sociais e individuais. O Estado serve para equilibrar e não pode ser, ele próprio, factor de desequilíbrio. O Estado serve para introduzir o factor justiça na nossa vida colectiva.
No actual "debate" eleitoral este tema, que considero ser o único que (nos) interessa, não aparece.
Ora, os cidadãos contribuem com uma percentagem muito significativa dos seus rendimentos para sustentar uma máquina que há muito deixou de obedecer a esta lógica de exercício da justiça e existe apenas para se auto-perpetuar. Em Portugal, a actividade do Estado resume-se praticamente a sustentar a sua máquina. A máquina que existe para garantir justiça entre os cidadãos serve apenas para sustentar os seus membros. E eles sabem que a gente sabe que eles sabem que nós sabemos.
Em vez de exercer o seu desígnio de forma serena e categórica, o Estado está em permanente confronto com o cidadão para, debaixo da capa do exercício legítimo da justiça, se auto-alimentar.
Os cidadãos sabem disto e desconfiam do Estado. De tal maneira isto é verdade, de tal maneira o Estado está desacreditado e desautorizado, que das raras vezes em esse exercício de justiça é efectivamente levado a cabo o cidadão comum, desconfiado, insurge-se.
Neste confronto entre o Estado e os cidadãos, perante a desigualdade das forças que se defrontam, alguns acabam por se acoitar debaixo da asa do Estado na esperança que, assim, a vidinha lhes possa correr melhor. Desta forma, numa espiral terrível, o Estado sai ainda mais desacreditado, o confronto aprofunda-se e a injustiça aumenta.
A vitória por maioria absoluta nas últimas eleições deveu-se apenas a um facto: aqueles que deram ao PS e a Sócrates o decisivo apoio extra, destinado a legitimar a introdução de reformas sérias na organização do Estado, acreditaram que esta situação iria ser afrontada. Sabemos agora que isso não se passou assim. E sabemos agora, depois do PSD nos seus diferentes sabores e do PS 1 e 2, o que é o tal centrão: uma espécie de super-máfia destinada a garantir esta máquina do Estado complacente consigo próprio, à sombra do qual se resguardam os acólitos.
O centrão não está contra os professores, juizes, polícias ou médicos. O centrão está contra todos os que estejam dispostos a garantir o desígnio do Estado: o exercício da justiça.
À falta de debate sério é interessante observar como o debate político virou comédia. Os grandes temas da vida nacional são agora introduzidos pelos "Gato Fedorento".
Há quem defenda que o riso é uma expressão de libertação perante a passagem do perigo. Neste programas já percebi onde está o perigo para cada um dos intervenientes. Ainda não consegui foi perceber o que está a provocar o riso dos seus protagonistas, nem de que perigo eles julgam que se estarão a libertar.
Vamos ver quem ri por último no dia 27...

2009/09/15

Debates

Após dez dias de debates "a dois", em que a televisão portuguesa ensaiou o "modelo americano", ficaram no ar mais perguntas do que respostas. Por exemplo: porque é que as discussões, propriamente ditas, demoraram apenas 45 minutos e os comentários dos painéis de "politólogos" chegaram a demorar 60 minutos? Em debates centrados em questões económicas, porque é que nunca foi abordado o problema da dívida externa, quando se sabe que esse será um dos maiores problemas que Portugal enfrentará no futuro? Porque é que ninguém falou de energia ou questões climatéricas? Porque é que, estando Portugal integrado no espaço europeu, nunca foram discutidas questões como a do Tratado de Lisboa, a política de imigração europeia ou a adesão da Turquia, para apenas citar três exemplos da actualidade? Porque é que, estando Portugal na NATO, nunca foi questionada a presença de tropas portuguesas em cenários de guerra, como o Iraque, o Afeganistão ou o Kosovo? Enfim, a lista seria interminável e a única explicação plausível para a ausência de temas considerados "não-convencionais", só pode ser uma: os participantes acordaram entre si o que eles consideram interessante para os potenciais votantes, formatando à partida o modelo de discussão que lhes interessava mais. Ora o que mais interessa aos políticos não é, necessariamente, o que mais nos interessa a nós, eleitores. Se o modelo de debate em grupo não favorece a clareza das propostas políticas, o modelo espartilhado de debates a dois, para mais cronometrado ao segundo, pareceu-nos demasiado limitativo para os fins pretendidos.
Resultado: um "anti-climax", na maior parte dos confrontos, o que não favorecerá a participação eleitoral no próximo dia 27. Ora, era essa tendência que era necessário inverter: a da abstenção galopante, reflexo do desinteresse que as actuais políticas nos provocam. Mas, se são os próprios políticos a concordar participar numa farsa, como é que o "sistema" pode mudar?
Assim, não vamos lá...