2013/02/21

Esta gente não se enxerga

Portugal está numa encruzilhada e, tão cedo, não sairá dela.
É uma verdade de “La Palisse”, mas é necessário pensar depressa, porque a realidade não se compadece com análises macro económicas e, muito menos, com as projecções de Victor Gaspar que, ontem mesmo no parlamento, admitiu o erro crasso que cometeu. Resta saber se por incúria, incompetência, estratégia, ou todas estas coisas ao mesmo tempo...
Já não são necessárias estatísticas do INE, da OCDE ou do EUROSTAT, para os portugueses perceberem o que lhes está a acontecer. A simples observação empírica da realidade que nos rodeia, é um bom barómetro da situação. Basta andar pelas ruas, ver o número de pedintes a cada esquina, ou os sem-abrigo que se amontoam nas arcadas das lojas de luxo da Avenida da Liberdade, dos ministérios no Terreiro de Paço e nas estações do Cais do Sodré e de Santa Apolónia, para confirmá-lo. O número de lojas com promoções acima dos 60%, ou anunciando saldos por encerramento, aumenta de forma exponencial. A restauração (depois do aumento do IVA de 13% para 23%) enfrenta a sua pior crise dos últimos 40 anos e, com o fecho do comércio de retalho, os fornecedores a montante têm cada vez mais dificuldade em sobreviver. A economia há muito que deixou de crescer a níveis mínimos de sustentabilidade (2%) que permitam criar emprego duradouro e impulsionador do consumo para dinamizar a dita. Um círculo vicioso. Chama-se recessão e, como dura há mais de 18 meses, tornou-se estrutural, de tal forma que até o insuspeito economista Cavaco Silva já lhe chamou “espiral recessiva”.
Perante tal calamidade, que está a levar à indigência social e económica milhares de portugueses, que faz o governo? Refugia-se em discursos hiperbólicos, argumentando que a culpa foi de quem deixou o pais neste estado, como se o PSD (em alternância com o PS)  não tivesse governado o país nos últimos 37 anos! Pior: os seus governantes mais odiosos e odiados, mantêm-se em exercício de funções, mesmo quando contra eles pendem acusações tão graves como o das “viagens fantasma” no parlamento, as pressões censórias sobre jornalistas como Pedro Rosa Mendes na TSF ou uma jornalista do “Público”, de recente memória. Isto, para já não falar do escândalo da Ongoing e do papel da loja maçónica da Mozart à qual pertencerá o referido ministro, ou da licenciatura “turbo” feita em 20 meses, uma afronta para todos aqueles que estudam e pagam do seu bolso uma formação de 5 anos!
Não é, pois, de admirar, que nos últimos dias, as manifestações de desagrado e indignação tenham subido de tom, normalmente ao som da “Grândola” de boa memória. Foi no parlamento com Passos Coelho, no Porto e posteriormente em Lisboa com Miguel Relvas e, ontem, com Paulo Macedo, no Porto. Não nos devemos admirar que mais manifestações se repitam por estes dias. A democracia não se esgota na representatividade parlamentar: há muitas formas de protesto e a indignação, como, de resto, a desobediência civil, são apenas duas delas. Ainda não estamos na Grécia, onde a violência campeia nas ruas, mas estamos muito perto e não se podem culpar as pessoas por isso. São as actuais medidas de austeridade que sufocam a maioria da população  e que não lhes deixam alternativas. Até porque, este governo foi eleito com promessas que nunca cumpriu e por isso quebrou o contrato social pelo qual foi eleito. Perdeu, por isso, qualquer legitimidade democrática.