2022/01/14

Entre o PAN e o "Pântano", venha o diabo e escolha...

 

Terminadas as festas, começaram os saldos. Este ano, para além das promoções com desconto, temos as promessas eleitorais, que - a acreditar no Pai Natal - estão cheias de "presentes" para oferecer a quem se portar bem. Desde logo, o famigerado PRR (vulgo "bazuka") que é suposto "curar" grande parte dos nossos males e, lá mais para diante, os dinheiros dos programas europeus de coesão, que dão pelo nome de "20-20" e "20-30". No total, cerca de 60 mil milhões de euros, até finais da década. Ou seja, Portugal (se nos portarmos bem, lá está...) vai receber, só nesta década, tanto quanto recebeu desde a sua adesão à CEE, já lá vão 36 anos...

Por razões que a razão desconhece, a legislatura (que devia ter durado até 2023) foi interrompida a meio,  obrigando a eleições antecipadas (agendadas para o dia 30 de Janeiro). Até lá, teremos duas semanas de debates (que estão a decorrer neste momento) e duas semanas de campanha propriamente dita que, este ano, por via da restrições sanitárias, será mais contida no tempo e no espaço. 

Regressado do estrangeiro esta semana, perdi metade dos debates e, dos que restavam, vi os considerados mais importantes, entre os quais o frente-a-frente entre o actual primeiro-ministro (António Costa) e o "challenger" de serviço, o líder do principal partido da oposição (Rui Rio).

Primeira Nota: ao contrário dos restantes debates, que tiveram a duração média de 30 minutos, este debate durou 60 minutos. O dobro. Porquê? Claro que podemos sempre argumentar que se tratava do debate mais importante, já que um dos dois oponentes irá ser o próximo primeiro-ministro. Mas, se 60 minutos não dão para falar em mais de 4 ou 5 temas, como é que 30 minutos poderão ser suficientes para explicar o que quer que seja? A menos que os jornalistas de serviço estivessem interessados em aprofundar os temas em discussão, o que não era o caso.

Segunda Nota: para além de temas clássicos (economia, saúde, emprego, reformas...) e à excepção de temas marginais trazidos por partidos da extrema-direita (impostos, subsídios diversos, pena de prisão perpétua ou castração química de pedófilos...), nunca ouvimos falar de coisas tão importantes como: educação, cultura, habitação, transportes, mobilidade, ambiente, imigração, problema demográfico, descentralização e desertificação do interior. Isto, para não falar na política estrangeira (temos alguma?) ou da Europa, que nos subsidia há 36 anos. 

Terceira Nota: todos os oponentes, sem excepção, falaram no passado (virtudes próprias e defeitos alheios) sem apresentarem uma estratégia futura que nos permita ter uma ideia, ainda que geral, do que é que se propõem fazer, caso sejam governo. Mais, no caso dos partidos de esquerda, passaram o tempo a culparem-se mutuamente, pelo chumbo do Orçamento e pela consequente queda do governo. É verdade que existem programas partidários e, em tese, todos nós podemos lê-los e aferir do seu conteúdo. Mas, quem é que, nos tempos que correm, lê programas de 20 partidos?   

Quarta Nota: estamos em eleições legislativas para eleger deputados para a Assembleia da República. Só depois, saberemos a composição da AR. Porque razão é que, nestas eleições, António Costa, passou a afirmar que estamos a eleger o primeiro-ministro (!?). A menos que se trate de um "lapso freudiano", não se percebe esta afirmação, ainda que nela possa estar implícita a mensagem subliminar "votem em mim" (se querem que o PS governe...). 

Quinta Nota: do debate de ontem, algumas coisas parecem claras: Costa parece apostar numa maioria absoluta (usando o eufemismo "uma maioria estável") o que lhe permitiria dispensar alianças à esquerda e à direita; ou, caso não a obtenha, procurar governar com quem o apoiar (chegou a mencionar o PAN) ou continuar como até aqui, fazendo acordos caso a caso, como aconteceu durante o consulado de Guterres, no qual ele foi ministro dos assuntos parlamentares e que terminou no "pântano". Ou, terceira hipótese, aceitar o repto de Rio (governar com o apoio do segundo partido mais votado), o que ficou por esclarecer, já que ninguém sabe qual vai ser a composição da próxima assembleia.  

Sexta Nota: não é provável que qualquer dos dois maiores partidos (PS e PSD), ganhe as eleições com maioria absoluta. A acreditar nas sondagens publicadas entretanto, há uma tendência que se mantém constante em todas elas: existe uma maior polarização à esquerda e à direita e o PS ganhará as eleições, ainda que sem maioria absoluta. "De acordo, com os dados da sondagem do Centro de Estudos e Sondagens de Opinião (CESOP) da Universidade Católica Portuguesa, para o PUBLICO, RTP e Antena, entre os dias 6 e 10 de Janeiro, os socialistas poderão beneficiar de uma significativa transferência de votos de eleitores que em 2019 votaram na CDU, no Bloco de Esquerda, no Livre e no PAN, enquanto o PSD também faz uma boa "pescaria" nos eleitores do CDS, além de algumas franjas do Chega, Iniciativa Liberal e até do PAN" (in "Público" d.d. 14/01/22). 

Sétima Nota: De acordo com a mesma sondagem, o PS vencerá com cerca de 39%, o PSD terá cerca de 30%, o BE 6%, o Chega 6%, a CDU 5%, a IL 4%, o PAN 3%, o CDS 2% e o Livre 2%. Estes serão, em princípio, os partidos que elegerão deputados. A confirmar-se este cenário, não haveria grandes alterações na composição da AR, maioritariamente de esquerda, o que levantará de novo a questão de Outubro: se o Orçamento de Estado foi chumbado, porque é que o mesmo orçamento seria, agora, aprovado?

Oitava Nota: ainda que o debate de ontem não esteja contabilizado nas sondagens, não é muito provável que a opinião dos votantes se altere, já que a maioria tem o seu voto definido. No entanto, daqui até ao lavar dos cestos, é vindima. Pode acontecer o PS ganhar as eleições, mas a esquerda ficar em minoria no Parlamento; ou, o contrário: o PSD ganhar, mas a maioria do Parlamento continuar a ser de esquerda. Nesse caso, qual será a solução preconizada? Uma "geringonça" de direita, ou uma (segunda) "geringonça" de esquerda? E Costa, sairá do governo, se perder? E Rio, ficará como líder do PSD? As máquinas partidárias não costumam ser benevolentes para líderes perdedores. O mesmo é válido para os líderes de outros partidos, de resto.

Tempos interessantes. No dia 30, saberemos mais.