O primeiro caso, seguiu-se a um incidente em que um alemão foi esfaqueado e morreu no hospital na sequência de ferimentos, num episódio que ainda está por esclarecer. A polícia prendeu dois suspeitos, um iraquiano de 21 anos e um sírio de 22 anos. À morte do cidadão, seguiu-se um "rastilho" de rumores nas redes sociais (de que a vítima teria tentado defender mulheres de assédio dos estrangeiros) e uma manifestação de nacionalistas, que acabou com perseguições a "pessoas que tivessem uma aparência não-alemã". As imagens desta acção persecutória foram registadas nas redes sociais e mobilizaram as forças de esquerda da cidade, que convocaram uma contra-manifestação "em defesa do bom nome e cosmopolitismo de Chemnitz, por oposição à xenofobia dos grupos nacionalistas". O que se seguiu, foi uma batalha campal, que se prolongou por dois dias, com um balanço final de 20 feridos, entre os quais dois polícias, e a prisão de 10 manifestantes acusados de fazerem a saudação nazi, ilegal na Alemanha. O caso, que continua a ser discutido nos media, veio alertar para o crescimento dos movimentos nacionalistas e xenófobos naquele país, que têm maior expressão nos territórios da antiga Alemanha de Leste. A polícia alemã também não escapou a críticas, por ter permitido a escalada de violência. Na opinião do jornalista Hans Pfeifer (Deutsche Welle) esta atitude "pode ser interpretada como falta de empatia pelas vítimas, uma vez que parte dos políticos e funcionários públicos não são o primeiro alvo da extrema-direita". Ainda de acordo com o citado jornalista, "o que aconteceu não é um atentado contra estrangeiros ou contra a extrema-esquerda, mas contra a própria democracia". O mesmo parece ter entendido o governo de Merkel, ao declarar que "não serão toleradas reuniões ilegais, nem perseguição de pessoas que pareçam diferentes, nem tentativas de espalhar o ódio pelas ruas".
O segundo caso, prende-se com uma cimeira entre dois políticos conhecidos pelas suas posições populistas e xenófobas, cujos governos têm vindo a endurecer posições relativamente a refugiados e imigrantes, que procuram entrar nos países europeus. No caso de Salvini, a recusa em salvar náufragos à deriva no Mediterrâneo, foi condenada nas mais diversas instâncias e atenta contra o direito internacional e o código marítimo, que obrigam ao salvamentos de náufragos em mar-alto. No caso de Orbán, os atropelos às leis europeias são já incontáveis, desde as sucessivas alterações à constituição, que lhe permitem controlar a justiça e a imprensa, às políticas de racismo interno (ciganos) e à imigração. Orbán declarou recentemente que "a Hungria não quer receber gente, porque não deseja que os povos se misturem". O mesmo governo que, ainda esta semana, foi acusado de ter recusado comida e abrigo a estrangeiros (considerados) ilegais, enquanto esperam passagem, dado não poderem permanecer na Hungria. Órban está, neste momento, a violar a Convenção de Genebra para Protecção dos Refugiados, a Convenção Europeia dos Direitos Humanos, a Carta dos Direitos Fundamentais da UE, e os próprios tratados da UE, após o Tratado de Lisboa.
Dois biltres, que apoiados pelos países da chamado "bloco soberanista" (checos, polacos, húngaros, eslovacos e italianos) desejam regressar ao passado nacionalista, que esteve na origem de guerras que devastaram o continente europeu.
É contra esta gente, que continua impunemente a passear-se pelos corredores de Bruxelas, enquanto desrespeita as regras mínimas da democracia e ameaça com boicotes ao orçamento da União, que os partidos democráticos do Parlamento Europeu devem unir-se, exigindo o cumprimento da lei em vigor na UE, condição primeira para serem membros de direito. Isto, ou a perda de apoios europeus, única linguagem que os ditadores percebem. Esta é a melhor forma de defendermos a democracia.
Como bem lembra Rui Tavares, num recente artigo de opinião ("Público" de 13.08.18): "Não é por acaso que a Constituição alemã proíbe a existência de partidos nazis ou que a Constituição da República Portuguesa contenha também uma proibição - ainda que pouco usada - contra a possibilidade de existência legal de organizações fascistas. É para não nos esquecermos de onde viemos. As nossas democracias nasceram contra o fascismo e essa história faz parte da sua razão de ser. Se nos esquecermos ou cansarmos desta história, estaremos já a caminho da regressão".
Antes que seja tarde.