2012/09/08

V de verme

foto Valter Abrucez
Não vou perder tempo com o conteúdo do anúncio feito ontem pelo PM. Não vou manifestar a minha incredulidade face à cronologia e ao horário e a esta tentativa patética de fazer de todos nós parvos. Não vou referir os comentários prévios do PR, nem especular sobre a sua reacção, que perante eles se espera, quando se tratar de aprovar o OE2013. Não vou falar das contradições recorrentes, dos atropelos, da incompetência, da mentira, do carácter rasteiro, nojento e classista de toda esta governação. Não vou alongar-me sobre o exemplo de experiências passadas que remeteram outros personagens, bem mais ingénuas afinal, para a mais pura marginalidade política. Não vou sequer lembrar a questão central: esta imperdoável desonestidade que consiste em propor ao eleitorado um determinado programa, ganhar com ele as eleições e depois executar um programa totalmente do avesso, como ontem ficou mais uma vez demonstrado.
Não, o que me intrigou foi ouvir aquele "meus caros portugueses" (ora leia aqui), com que pontuou a sua homilia de ontem. Quando o ouvi dizer aquilo pensei: "meu?" Eu sou "dele"? "Caro?" Como poderei ser "dele," como poderei eu ser-lhe "caro" e, ao mesmo tempo, como pode ele fazer-me, fazer-nos, uma desfeita destas? Aquilo soava-me estranho.
Depois percebi. Momentos antes, em tom de "tem que ser, sou eu que mando" o doutor Coelho tinha feito uma dessas pontuações com um formal, autoritário e assertivo "Portugueses." Momentos mais tarde, muda o registo, hesita e parece tentar amenizar o discurso, introduzindo nele um tom mais tu-cá-tu-lá. Caros, meus!?
Uma interpretação possível é a do português Coelho se comportar como um qualquer dignitário estrangeiro, de visita, a tentar defender os seus interesses. O premier chinês ou o presidente angolano, de visita a Portugal para inspeccionar a colónia, usariam porventura a fórmula "meus caros portugueses"... Do PM português  perceberia "meus caros concidadãos," admito o institucional "Portugueses," mas, "meus caros portugueses"? Por que se permite este safardana tais familiaridades?
Seja como for, nem quando pretende soar assertivo e institucional nem quando pretende fazer o número do buddy-buddy, Coelho convence. O que me intriga em tudo isto é ouvir, como ouvimos ontem, no meio de muita gente irada, é certo, gente que ainda defende esta política e culpa o anterior governo pela situação actual.
Esta gente esquece que o primeiro ministro disse, ele próprio, que não se iria escudar nesses argumentos. Esquece que o problema a resolver é a situação do país, não as culpas do actual anterior governo. Esquece que a situação do país está pior do que estava antes.
São eles o sustentáculo destes miseráveis, é a esses vermes, que cada vez mais me incomodam, que devemos, nesta altura, pedir contas.