2016/01/08

Eleger (ou não) um trampolineiro

foto tvi24
A um dia e dois debates do fim desta primeira ronda de campanha eleitoral, os dados parecem estar lançados: Marcelo, o "comentador", será o candidato mais votado na primeira volta. Resta a dúvida, se haverá (ou não) uma segunda. Neste caso, quem será o adversário de Marcelo?
Depois de termos assistido à maioria dos debates, e excluíndo os sete candidatos com menos possibilidade de passarem à fase seguinte, fácil é concluir que Maria de Belém e Sampaio da Nóvoa, reúnem a preferência da maioria dos portugueses. Serão estes dois candidatos que, em princípio, poderão passar a uma segunda volta, caso Marcelo não consiga reunir uma maioria absoluta à primeira. O "comentador" sabe disso e terá todo o interesse em ganhar logo com mais de 50%, pois não é garantido que consiga aumentar a percentagem dos seus votos numa segunda volta. Também sabe que o candidato adversário poderá reunir a maioria dos votos dispersos nesta primeira fase e, nesse caso, ter mais votos do que Marcelo.
Esta é, neste momento a grande diferença destas eleições: Marcelo corre por si e Belém e Nóvoa, correm entre si.
Curiosamente, ou talvez não, a comunicação social portuguesa (controlada por 3 ou 4 grupos económicos) depois de ter levado Marcelo "ao colo" durante meses a fio, tem evitado publicar sondagens nesta fase dos debates, o que é susceptível de várias interpretações. Marcelo, incensado como o (virtual) vencedor destas presidenciais, desde o anúncio da sua candidatura, surgiu de tal forma destacado nas sondagens (chegaram a dar-lhe 52% à primeira volta) que, dificilmente, podia subir. Ora, como bem observou um comentador televisivo, quando se começa uma campanha com expectativas muito altas, a tendência é para descer. As pessoas inqueridas, conhecem Marcelo da televisão (onde foi visto, semanalmente, nos últimos 20 anos) e é natural que gostem do seu estilo de
conversador nato, que entre meia-dúzia de opiniões avulso, sobre política, futebol ou livros (não esquecendo as "ofertas" dos presuntos aos "pivots") fabricava factos políticos, dizendo tudo e o seu contrário, quando lhe convinha. Nestes seus "monólogos" semanais, nunca escondeu as suas preferências partidárias, chegando a imiscuir-se na linha política do PSD, partido do qual foi secretário-geral. Sem contraditório.
Acontece que, agora, é obrigado a debater com candidatos cultos e experientes no combate político, seja na área partidária (Maria de Belém, Marisa Matias, Edgar Silva), seja na área da cidadania independente (Sampaio da Nóvoa, Paulo Morais, Henrique Neto). E é aqui que o candidato comentador, habituado a dizer tudo e o seu contrário, foi obrigado a responder às questões centrais que preocupam os portugueses: as desigualdades na sociedade, as questões de género, as causas fracturantes, a dívida pública, a promiscuidade entre a política e os interesses económicos, a corrupção ou o Tratado Europeu.
Ontem, mais uma vez, confrontado com as contradições políticas apontadas por Nóvoa, irritou-se, perdeu a calma e chegou ao desplante de sugerir outro assunto, dizendo ao "pivot" de serviço (Clara de Sousa) que mudasse de tema (!?). Percebe-se: não está habituado a ser criticado e sempre impôs a agenda nas suas homílias dominicais. Agora, a arena política é outra. Marcelo, pela primeira vez nestes debates, teve um adversário à altura e foi obrigado vir a terreiro justificar-se pelas incongruências passadas. Vai ser assim, daqui para a frente. Nada será igual, nos quinze dias que faltam. A tendência na campanha poderá ter mudado ontem. O que parecia uma vitória indiscutível do "comentador", poderá vir a revelar-se uma surpresa para muitos. A começar por ele próprio.   
 

2016/01/04

Taxi Driver (3)

Para onde é que vamos?
- Para a Buraca, sff...
Tem algum caminho preferido?
- Talvez pelo Monsanto, há menos semáforos...
Terminou mais um dia de trabalho, não?
- Não, já não trabalho, no sentido formal do termo...
Ah... reformado... Também gostaria de estar assim, agora sou taxista...
- Então?
Tive de agarrar o que havia... a minha empresa foi à falência e tive de arranjar um táxi. Tenho dois filhos para criar. Estão ambos na faculdade, um com 19 e outro com 22. Alguém tem de ganhar dinheiro. A minha mulher trabalha e, até ver, tenho de ser taxista...
- Pois, não deve ser fácil. Ainda para mais há muita concorrência nos táxis...
Concorrência? Isto são tudo "curiosos" que vêm aqui estragar o negócio dos outros. Está cheio de oportunistas.
- Não há controlo?
Controlo? Ando aqui há seis meses e nunca fui controlado. Ninguém controla nada neste país...
- Lá isso, também é verdade... Isto está bom é para os banqueiros...
Lá está, para os banqueiros e para os políticos que estão feitos com os banqueiros. Veja lá na América, se o Madoff não apanhou centenas de anos! Centenas de anos! Ou na Islândia... onde deixaram falir os bancos.
- Certo. Fizeram eles muito bem.
Cá, mandam os gajos para casa com pulseiras, como o gajo do BPN, que pôs os bens todos em nome da mulher. Mas, a culpa também é deste povo que aceita tudo. O meu pai sempre me disse que Portugal era um país muito pequenino e que não sabíamos cuidar de nós. Tivemos aquele século dos Descobrimentos e nunca mais... vivemos sempre à custa de alguém: das colónias, agora da Europa...
- Sim, somos pouco letrados e críticos...
Lá está. Esta gente nova não se interessa por nada...os meus filhos, se eu não fôr acordá-los de manhã ficam a dormir. O mais novo, quando eu, hoje, saí de casa ainda ficou na cama...
- Também têm a vida mais facilitada...
Lá em casa, não. O meu mais velho só teve computador aos 18 anos. Se queria trabalhar num, ia para o meu escritório. Não pago extravagâncias, como aqueles pais que mandam os filhos para Espanha, embebedar-se no fim do curso. Não há para mim, não há para eles. É igual para todos...
- Acho muito bem...
Eu também tive o primeiro carro aos 18 anos, mas o meu pai tinha posses e eu ajudava-o a arranjar carros na oficina. Fazia serões a limpar as peças todas...e hoje ando aqui, a fazer nem sei bem o quê...
- Ainda por cima com esta crise e a falta de dinheiro...
Falta de dinheiro? Tem visto os debates? Veja lá a corrupção que para aí há...começa logo pelos impostos no mesmo ramo de actividade: se você dormir num hotel de 5 estrelas paga 6% de IVA, mas se for a um restaurante em frente, paga 23%! Acha isto bem? Só defendem os grandes grupos económicos...
- Sim, essa afirmação é do Paulo Morais, que também disse que 30% da economia não pagava impostos.
Pois não! 30% ou mais! Já viu para que dava esse dinheiro?...
- Imagino...para pagar reformas, por exemplo...
Sim, eu acho que esse senhor tem razão, mas não devia candidatar-se a presidente da república. Devia ir para o Ministério Público...
- Também acho que faria um bom lugar no MP.
Mas, julga que esta gente vai votar nele? Vão todos votar no Marcelo, porque o conhecem da televisão. Uns broncos. A mim não me enganam, vou votar no reitor da universidade.
- No Nóvoa?
Nesse. Um homem culto e de confiança.
- Bom, chegámos.
São €9,75. Bom ano para si.
- Bom ano.