2023/10/26

Taxi Driver (29)

Mimi Smith, “Bang Bang” (1990)

Boa tarde. 

- Para a Buraca, sff.

Depois ajuda-me, que eu ando há pouco tempo com o táxi e não conheço bem aquela zona.

- Não há problema, eu indico. 

Mas, a Buraca é fora de Lisboa, não é? 

- Sim, era um bairro que pertencia a Oeiras, no tempo da ditadura. Depois do 25 de Abril, passou a fazer parte do concelho da Amadora.

O senhor falou aí em ditadura, mas esta democracia já existia antes do 25 de Abril.

- Nunca dei por isso, ainda que não vivesse cá na altura. De qualquer forma, a guerra colonial continuava e essa foi, de resto, a razão principal para o derrube do regime.

Qualquer pessoa que perceba alguma coisa de política, sabe que o Marcelo Caetano queria fazer de Portugal uma democracia avançada, como na Suíça, sem parlamento e com referendos. Só que não o deixaram.

- Pois não, os "ultras" do regime queriam continuar com a guerra. Ainda durou 5 anos (a guerra e o regime). Só que os "ultra", acabariam derrotados pelos oficiais do MFA, que queriam acabar com a guerra colonial. Por isso, fizeram o 25 de Abril. 

Isso das colónias, foi uma grande "tanga". Saíram de lá os portugueses e quem é que lá ficou? Eu não andei na guerra nessa altura, mas conheço bem aqueles países. Na Guiné, em Angola, traficam drogas e diamantes e ninguém controla. Pediam-nos para fazer escoltas e levar uns certos sujeitos ao aeroporto. Claro que eu não controlava nada. Sabia eu bem o que ia naquelas malas...

- Sim, a Guiné é um "estado falhado", infelizmente. 

Só a Guiné? E Angola e Moçambique? Eu treinei batalhões da ONU e oferecemos os nossos préstimos a Moçambique, para combater em Cabo Delgado. O governo moçambicano não aceitou. Não confiavam nos portugueses, pois diziam que eram racistas e só lá iam para roubar diamantes. Sabe quem é que lá está agora? O Grupo Wagner. 

- Não sabia, mas sabia dos atentados do Daesh em Cabo Delgado. Nunca percebi porque é que não aceitaram o apoio dos portugueses.

Nós somos considerados dos melhores soldados do Mundo em luta de guerrilha. Foi assim na Bósnia, no Kosovo e no Afeganistão. Eu estive lá e as populações gostavam de nós. Entrávamos nas povoações e fazíamos amigos em ambos os sectores. Criávamos um círculo onde protegíamos as populações de ataques exteriores e íamos alargando o círculo à medida que entravam mais pessoas. Funcionava sempre a até fomos condecorados por isso. Nunca perdemos um homem, à excepção do Afeganistão, onde perdemos dois.

- Sim, os soldados portugueses, que incorporaram as forças da ONU, têm sido sempre elogiados. 

Claro. E perdemos 2 soldados, porque o major responsável pelas tropas no Afeganistão era um homem de secretaria e não tinha prática do terreno. Eu próprio fui dado como morto! Calcule o senhor, a minha mulher e a minha sogra estavam a ver televisão e, antes mesmo de falarem comigo, já anunciavam no telejornal que havia dois soldados portugueses mortos. A minha sogra, até desmaiou! 

- Imagino...

Isto é uma coisa que nunca mais esquecerei. Quando elas telefonaram e me contaram o que aconteceu, fui ao quartel pedir explicações. Ia tão desesperado, que se encontrasse o tal major, dava-lhe um tiro! Estas coisas nunca se esquecem...

- Sempre é melhor estar na vida civil.

Não sei. Anda tudo com medo de usar armas. Mas ter armas não quer dizer que tenhamos de usá-las. 

- É verdade, mas na América, morreram ontem 18 pessoas e ficaram feridas 60... Nos EUA, as armas podem ser compradas por qualquer adolescente.

Também na Noruega e no Canadá, os pais ensinam os filhos a atirar aos veados, porque dizem que isso faz deles homens. Na América, não se entende: os miúdos podem guiar aos 16 e são maiores de idade aos 18. Mas, podem treinar tiro aos 10, desde que acompanhados pelos pais. 

- Como explica isso?

Como explico? Porque os americanos são estúpidos. Comportam-se como nos filmes. Não vê aquelas séries americanas? Os polícias, assim que detêm uma pessoa suspeita, começam logo a disparar. Eu falava com americanos no Afeganistão e dizia-lhes:" então vocês disparam primeiro, sem saber se as pessoas são inocentes? Tem que se presumir que são inocentes e só depois actuar". Respondiam-me que, às vezes, os detidos tinham movimentos suspeitos e era preciso neutralizá-los. Eu também tenho aqui armas no carro e nunca as utilizo. 

- Já percebi. Bem, chegámos. Boa noite. 

2023/10/25

Ainda a Palestina


"O povo palestiniano foi sujeito a 56 anos de ocupação sufocante. Viram a sua terra constantemente devastada por colonatos, assolada por violência, a sua economia esmagada, as suas populações deslocadas e as suas casas demolidas"

(...) "O sofrimento do povo palestiniano não pode justificar os terríveis ataques do Hamas, mas isso, por seu lado, não pode fundamentar as "claras violações da Lei Internacional em Gaza", que Israel está a cometer, vitimando a população civil palestiniana".  

As palavras, são do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres.

Não podia estar mais de acordo. Assino por baixo.


(Photo credit: Pinterest)