2020/06/02

Onze semanas noutra cidade: Pandemia, Recursos e Soluções


Há precisamente três meses (2 de Março) morria a primeira vítima de Coronavírus em Portugal. Por coincidência, nesse mesmo dia viajava para umas curtas férias em Espanha. Desde então, permaneço no país vizinho, aguardando a abertura da fronteira que, prevê-se, estará para breve.
Três meses de confinamento, a exemplo da maior parte dos países europeus com estratégias de contenção semelhantes, ainda que os resultados nem sempre tenham sido os mesmos. Da explosão da epidemia em Itália e Espanha, os países mais atingidos na fase inicial, à relativa contenção em países como Portugal e Grécia, o processo de confinamento revelou virtudes e defeitos, que terão de ser avaliados em conjunto, única forma de limitar recidivas, que se anunciam como prováveis e para as quais não haverá argumentos. Não basta culpar a China pelo encobrimento inicial da existência do vírus (detectado em finais 2019), mas perceber a razão da desvalorização da informação, quando esta já era conhecida a 23 de Janeiro deste ano. De então para cá, muito tempo se perdeu e essa é, provavelmente, uma das razões (não a única) porque hoje temos a lamentar tão elevado número de mortes. Uma prevenção atempada, aliada a meios sanitários de qualidade, são condições indispensáveis para combater qualquer epidemia e esta não é excepção. O facto de ser um vírus desconhecido e não haver vacina para combatê-lo, explica parte do problema, mas a montante há factores que não podem ser iludidos. Desde logo, a incapacidade da maioria dos sistemas de saúde pública para receber um número elevado de contagiados, seja a nível logístico (camas, ventiladores, máscaras...), seja a nível de pessoal (médicos e enfermeiros) seja a nível financeiro (descapitalização do sector público, após a privatização da saúde nos últimos anos). Para evitar o colapso dos serviços sanitários, muitos países tiveram de optar entre dar prioridade aos doentes infectados pelo vírus, ou tratar de doentes crónicos, que aguardam agora a sua vez de serem atendidos. Foi o caso de Espanha e da Itália, como o do Reino Unido e da Holanda (que chegou a pedir à Bélgica reforço de camas). É por isso que é importante a solidariedade na União Europeia, ainda que alguns países continuem a pôr reticências a um "pacote" de ajuda lançado na passada semana pela Comissão Europeia, que prevê a libertação faseada de 750.000 milhões de euros para ajudar os países europeus mais atingidos pela pandemia. Através da combinação de empréstimos e transferências, Von der Leyen pretende satisfazer os países mais atingidos pela crise (Itália e Espanha) e, simultaneamente, os chamados países "frugais" (Holanda, Austria, Suécia e Dinamarca). A chanceler Merkel e o presidente Macron, já tinham mostrado o seu apoio em respaldar um fundo de meio bilhão de euros, financiado com dívida europeia, que seria injectado em forma de subsídios, enquanto os "quatro frugais" aceitavam a criação do fundo, mas punham como condição limitá-lo a dois anos, desde que canalizado em forma de empréstimo. Nesta nova versão, também apelidada de "bazuka europeia", Von der Leyen propõs o aumento temporário do "plafond" orçamental da UE, que passaria de 1,2% para 2% do Produto Nacional Bruto. A margem adicional, de mais de 100.000 milhões de euros, seria utilizada em forma de garantias dos estados, para a emissão de uma dívida conjunta da UE. A emissão destas garantias (créditos) poderia oscilar entre 300.000 e 500.000 milhões e seria amortizada através dos orçamentos da União, num período de 20 a 30 anos. Esta primeira proposta, foi aperfeiçoada e, finalmente, apresentada no dia 28 de Maio.
O programa "Next Generation EU", como agora passou a ser apelidado, assenta em 3 pilares:
1) Apoio aos estados membros, com investimentos, onde se destaca um fundo de 560.000 milhões para investimentos  e reformas relacionadas e.o. com a transição verde e digital das economias;
2) Incentivos ao investimento privado;
3) Apoio às políticas mais castigadas pela crise, como a saúde, investigação e acção externa.
Contas feitas, de um total de 750.000 milhões, a Itália receberá 170.000 milhões (dos quais 80.000 em subsídios e 90.000 em empréstimos), enquanto a Espanha receberá 140.000 milhões (dos quais 77.000 em subsídios e 63.000 em empréstimos). Os 440.000 milhões que sobram, serão para os restantes países.
Para Johannes Hahn, comissário europeu de orçamentos, o "Fundo Europeu de Recuperação não é um altruísmo, mas um investimento", já que interessa a todos os membros da União que a Europa saia desta crise rapidamente. Nas suas próprias palavras: "A tarefa da Comissão é velar por um bom funcionamento do mercado único, não apenas agora, mas também no futuro. Se actuarmos com rapidez e prudência, não haverá risco de ruptura. Creio que Angela Merkel também assim o entendeu e, por isso, aceitou a nossa ideia (de um fundo com subsídios). A Alemanha é a "rainha das exportações", não apenas no Mundo, mas também na Europa. E, para exportar, faz falta um mercado. Sem mercados, não há clientes. Por isso, penso que a nossa proposta, não é só altruísmo, mas sim investimento" (in: "El País" d.d. 30 de Maio).
Melhor do que isto, só mesmo aquela conhecida definição do futebol: "são 11 contra 11 e, no fim, ganha a Alemanha".