2020/05/09

Justiça!


O argumento da "gripezinha" é conhecido. Os teóricos dos modelos também vieram afiançar que tudo não passava de uma conspiração. Não há razões para alarme, a economia não pode parar, siga a morte. Tudo aquilo a que assistimos hoje é o que acontece todos os anos com o influenza, etc. e tal, dizem os negacionistas da Covid19.

Sempre me pareceu, intuitivamente, que esta simplificação dos números constituia um argumento miserável. Já nem falo na sua manipulação ou falsificação. Mas só hoje tive tempo para ver os números reais. Com o surto de influenza nos EUA, em 2017-2018, terá havido um pico anormal, com cerca de 60 000 (não atingia esse valor há décadas) óbitos contabilizados. Em 2018-2019, terão ocorrido cerca de 35 000 óbitos.  São números relativamente elevados, claro. 
Mas as mortes pela "gripezinha," hoje 9/5, já rondam os 80 000!! 
No Brasil, a gripe gerou 1009 mortes no ano passado. Com a "gripezinha" já vai (hoje, 9/5) em cerca de 10 700 mortos. E isto é o que se sabe. Em dois meses! 

Claro que há responsáveis e responsáveis por tudo isto, a quem se deve exigir prestação de contas. O que se passa nos lares ingleses, nos países adeptos da tal teoria do rebanho ou nos outros onde as medidas de mitigação tardaram, é um escândalo. Mas, para além desses outros dirigentes, com largas culpas no cartório — que os cidadãos dos respectivos países não deixarão certamente de sancionar política ou criminalmente —, Trump e Bolsonaro têm de ser JULGADOS por crimes contra a Humanidade. O que está a acontecer nestes países é genocídio! Estão ao nível de um Pol Pot, de um Charles Taylor ou de um Ratko Mladić. 

Correm abaixo assinados, há muita gente que tem vindo a pedir estes julgamentos, mas creio que alguns não se terão apercebido, eles próprios, da verdadeira dimensão deste problema. 
E tão cedo o número de mortes pela COVID19 não vai parar de crescer...

2020/05/04

Sete semanas noutra cidade: começou a fase 0...


Depois do levantar o confinamento para "niños" até aos 14 anos, desde que acompanhados pelos pais ou tutores identificados, o governo espanhol "autorizou" os maiores de 70 anos (leia-se "grupo de risco") a saírem da quarentena, em períodos diferenciados do dia. Podem, agora, sair das 10h às 12h e das 19h e as 20h, diariamente. Uma alegria.
Durante o dia, só os adultos empregados em funções imprescindíveis (médicos, enfermeiros, maqueiros, bombeiros, condutores de transportes públicos, taxistas, polícia, ou serviços indispensáveis, como a água, electricidade e gaz) estão autorizados.
Para além destes grupos etários, as restantes pessoas (todas, portanto!) podem sair para tarefas indispensáveis: ir ao supermercado, à farmácia, ao multibanco, passear o cão e fazer "jogging", desde que mantenham o distanciamento social de dois metros e usem máscara e luvas. Para dentro de casa mantêm-se as recomendações iniciais: lavar as mãos com álcool ou gel (sabão azul e branco, também serve), mudar de roupa e acessórios quando se sai/entra em casa, lavar as máscaras e as luvas com desinfectante, etc. Uma trabalheira, para além da despesa implícita. Já vou na terceira versão da máscara e cada vez as compro mais caras. Há as ordinárias (misto de papel e têxtil) que custam 96c e são para usar e deitar fora; as de têxtil melhorado, que custam €5,90 e as profissionais ("bico de pato") que custam €6,60. As primeiras (quirocirúrgicas) evitam contaminar o parceiro, mas nós podemos ser infectados; as segundas, sendo mais seguras, exigem lavagens frequentes; as terceiras, que parecem viseiras da idade média, dada a sua forma ponteaguda, impõem respeito e mantêm as pessoas à distância. O pior é o calor na cara. Ontem, estiveram 35 graus em Sevilha e as máscaras profissionais são insuportáveis. Se o vírus não morrer com esta temperatura, morrem os cidadãos de certeza...

Fase 0
A Espanha entrou, oficialmente, na fase 0.
Entretanto, o governo deu a conhecer o programa de desconfinamento por fases. Serão cinco no total, com a duração de duas semanas, cada. Se tudo correr bem, em Julho terminará a quarentena. Se não (leia-se, aumento do número de infecções), volta tudo ao princípio.
A estratégia, subordinada ao título "A que horas posso sair à rua?", é a seguinte:   
Das 06h às 10h -  Maiores de 14 anos, sózinho ou acompanhado, num raio de 1km, sempre à distância de dois metros. Os desportistas individuais, não têm limite de circulação, dentro do município;
Das 10h às 12h - Maiores de 70 anos, sózinhos ou acompanhados.
Das 12h às 19h - Menores de 14 anos acompanhados.
Das 19h às 20h - Maiores de 70 anos, sós ou acompanhados.
Das 20h às 23h - Exercícios físicos ou passeios. Não são permitidos carros ou transportes públicos.
Estas medidas não se aplicam em municípios com menos de 5000 habitantes.
Consultada a tabela, verifico que posso sair em todos os períodos, à excepção daquele compreendido entre as 12h e as 19h, dedicado aos "niños". Nada mau...
Como era de esperar, pouca gente respeita as regras e não se vê tanta polícia como nas primeiras semanas de confinamento. Os carros de patrulha, passam agora discretamente pelos transeuntes e só interferem quando vêem grupos parados nos passeios. A ordem, nesta altura, é para circularem.
O plano gerou inquietação no mundo empresarial (indústria, hotelaria, restauração, imobiliárias e grandes armazéns) e os protestos não se fizeram esperar. Na melhor das hipóteses, só na 2ª quinzena de Maio e com restrições (ocupação de 1/3 dos lugares disponíveis, distanciamento mínimo nos hotéis, restaurantes, etc...), haverá um afrouxamento de algumas medidas. As reuniões e as petições contra as medidas do governo, já surgiram e os partidos políticos da oposição aproveitam o descontentamento dos empresários, para apertarem o cerco a Sanchéz/Iglésias, que tentam manobrar no meio da tempestade que se avizinha. O PIB deve cair 9% e tudo aponta para que a dívida espanhola ultrapasse os 120% do PIB, enquanto o desemprego pode disparar até 20% da população activa. A "tempestade perfeita", no dizer dos analistas. É por isso, natural, que o PP, o CCds e o VOX tentem explorar a crise. 
A boa notícia, é que o IFEMA (hospital provisório, construído em Madrid, para receber infectados) encerrou as suas portas, por não ter mais pacientes. Pelas suas instalações, passaram no último mês, mais de 4000 infectados. Ontem, foram registadas 164 mortes,  a nível nacional, o número mais baixo desde a primeira quinzena de Março.

Ainda que estejamos longe do fim da pandemia (que parece ter ultrapassado o seu pico na Europa, mas continua a deslocar-se para outros continentes), os métodos utilizados para combatê-la, podem ser reduzidos a três tipos de intervenção distintos: o do confinamento tradicional (exemplos: Portugal, Espanha, Itália, França, etc...); o do semi-confinamento ou sistema aberto (exemplos: Suécia, Holanda, UK, EUA) e o sistema asiático, de controlo digital (exemplos: China, Coreia do Sul, Taiwan, Japão e Singapura). Todos têm os seus adeptos e detractores, pelo que a polémica está longe de encerrada.
Na Ásia, onde o vírus foi detectado (China), os países mais atingidos debelaram o vírus com relativa rapidez e eficácia, graças ao sistema de controlo digital existente, que permite seguir todos os passos dos cidadãos, através de uma "app" instalada nos seus telemóveis que, por sua vez, estão ligados a um sofisticado sistema de cãmaras de vigilância. A "app", que serve para medir a febre do portador do telemóvel, está ligada ao sistema central de informação e, a partir de identificação pessoal, é fácil rastrear quem está infectado ou não. Dessa forma, foi possível confinar a população infectada e isolá-la do resto da população. Um êxito (só possível em estados fortemente centralizados e autoritários) onde os cidadãos, aparentemente, confiam no estado "protector" e não se importam de partilhar informação.
Método diferente, e mais consensual, é o do confinamento total (afinal, já usado na Idade Média) quando se desconhecem as causas (vírus) e não existe tratamento (vacina) para a cura. Isolam-se as populações em casa, coercivamente se necessário, de forma a diminuir o risco de contágio e a evitar o colapso das unidades hospitalares que, em caso de pânico, ficariam sobrecarregadas.
Finalmente, o sistema aberto (ou "inteligent lockdown") que tem os seus adeptos nos países europeus mais liberais e foi seguido e.o. pela Holanda, pela Suécia, pela Noruega, pelo UK e pelos EUA. Este sistema defende a "imunidade do rebanho" (herd's imunity) segundo a qual, a imunidade de grupo, é atingida quando 60% da sua população fica infectada. Nessa altura, o grupo-alvo, está imune. Isto, enquanto não houver vacina, claro.
Johan Giesecke, ex-director geral da saúde sueca e actual assessor para questões epidemiológicas naquele país, deu ontem uma entrevista ao "Público", onde defende o método sueco, aconselhando as pessoas a fazer a sua vida normal ao ar livre, ainda que mantendo o distanciamento social aconselhável. Também diz que a imunidade de grupo, na Suécia, rondará os 25% na região da grande Estocolmo (2,5 milhões de habitantes), o que quer dizer que cerca de 625.000 cidadãos suecos, já estarão imunes. Na mesma entrevista, afirma que, quando esta pandemia terminar, os números de mortes serão muito semelhantes em todo o continente europeu...
Fomos consultar os dados disponibilizados pela Organização Mundial de Saúde (site "worldometer"):
Dos 30 primeiros países da lista, só 6 países apresentam mais mortes em números relativos (mortos por milhão de habitantes) do que a Suécia: a Espanha (544), a Itália (478), o Reino Unido (419), a França (381), a Bélgica (684) e a Holanda (297). A Suécia tem 274/por milhão. Os restantes 23 países, entre os quais Portugal (104/por milhão), têm todos menos mortes.
Em ambos os grupos, há países que defendem o confinamento geral e países que defendem o sistema aberto. Portugal, que tem sensivelmente o mesmo número de habitantes da Suécia (10 milhões) e defende o confinamento geral, tem quase 3 vezes menos mortos que a Suécia, que tem um sistema aberto. Afinal, em que ficamos?
Numa coisa, estou de acordo com Giesecke. Ele alerta para os perigos dos estados de emergência, que os ditadores não deixarão de aproveitar para aumentar o seu poder. Dá o exemplo de Orbán (Hungria). É verdade. Por isso, para além de combater o vírus, também é preciso combater os ditadores.