2013/11/08

Portugal em 4D

Há tempos escrevi aqui uma prosa sobre o 3D em Portugal (o filme ainda dura...) Hoje ficámos a saber que o director da S&P acha que Portugal deve pedir um 2º resgate. Parecia um desses operadores de telemarketing dos bancos a tentar convencer-nos a pedir um novo cartão de crédito, esforçando-se por nos mostrar as fabulosas vantagens em o fazer. Não há dinheiro, dizem-nos, (lembrem-se das declarações recentes de D. Policarpo e de D. Crato...) mas já se aproximam os tempos do 4D. Afinal os "mercados" estão convictos que Portugal está maduro para  comprar mais crédito. Venham mais juros!!
O negócio do 3D deve estar a ir de vento em popa!

2013/11/07

A Constituição, esse “papão”...

As afirmações, ontem produzidas pelo ministro Aguiar-Branco, sobre a necessidade de rever a actual Constituição, argumentando que vivemos num  “estado totalitário” (!?), só não espanta por conhecermos bem o personagem.
Contudo, não nos devemos admirar.
Durão Barroso, ainda que indirectamente, disse o mesmo em Bruxelas relativamente ao Tribunal Constitucional e, na passada semana, Paulo Portas apresentou o famigerado Plano de Reforma do Estado, que mais não é do que uma tentativa canhestra de alterar as relações sociais existentes, coisa que a actual Constituição assegura. De resto, a tentativa de alterar a Constituição já tinha sido expressa no livro-programa de Passos Coelho, apresentado durante a campanha eleitoral de 2011, objectivo que só não foi atingido ainda por falta de maioria qualificada para poder fazê-lo.
Ou seja, desde que chegou ao poder, a direita vem tentando, umas vezes de “pantufas”, outras de “botas cardadas”, modificar o texto da Constituição que, interpretado pelo Tribunal Constitucional, tem muitas vezes impedido o actual governo de alterar completamente o modelo económico em que a nossa sociedade se baseia e que, nas suas grandes linhas, foi rectificado em sucessivas alterações à Constituição, todas elas posteriores a 1976.
Como muito bem explicou Jorge Miranda, “pai" da actual Constituição, e portanto insuspeito nesta matéria, o texto da actual Lei foi exactamente aprovado contra as tentativas totalitárias de 1975 e não é impeditivo de reformas consideradas necessárias para a sociedade portuguesa, assim o legislador o queira...
O que se está a passar é muito mais grave do que as afirmações de direitolas reaccionários, como Aguiar-Branco e congéneres, fazem supor. Trata-se, no fundo, de modificar as relações económicas que têm prevalecido na Europa do Estado Social e que a recente crise, provocada pela desregulação dos mercados financeiros, está a alterar profundamente em todo o Mundo Ocidental. Ou seja, há uma clara estratégia internacional para alterar o paradigma politico europeu vigente (assente numa economia de mercado supervisionada pelo estado e onde os cidadãos, trabalhadores ou não, estão inseridos num sistema que protege o emprego, a inclusão e a solidariedade social). Os ataques a este modelo, desencadeados um pouco por toda a Europa (veja-se o caso de países relativamente ricos, como a França, a Itália ou a Espanha) mais não são do que tentativas desesperadas do capital financeiro para desregular os mercados, com a conivência dos principais governos europeus, Alemanha à cabeça.
Em Portugal, como de resto noutros países periféricos e de economias mais débeis, já foi atingida a fase de intervenção directa, estádio último do empobrecimento gradual que nos conduzirá à dependência futura, chame-se esta “resgate” ou “programa cautelar”, eufemismos da “troika” que mais não significam do que alteração do sistema democrático vigente. Este é o grande perigo e o grande desafio da sociedade portuguesa, pois dele depende o nosso futuro como nação  independente. Combatê-lo, para além de entendê-lo, é hoje a tarefa prioritária de todas as forças que se reclamam de democratas.

2013/11/04

Chuva em Novembro, Natal em Dezembro

Como se esperava, o Orçamento de Estado para 2014, foi aprovado na generalidade. Nem outra coisa seria de esperar. O simbólico vota “contra” do deputado do CDS-Madeira, Rui Barreto, mais não foi do que isso mesmo: um protesto contra os cortes nos salários e nas pensões, gesto que o mesmo deputado já tinha tido na discussão do OE 2013. Mudou alguma coisa?
Não, não mudou nada, as medidas de austeridade, iniciadas por este governo em 2011, vão prosseguir e os cortes anunciados fazem prever mais do mesmo: despedimentos em massa no sector público, cortes de salários e pensões a partir de fasquia encontrada de 600 euros, cortes nos subsídios de desemprego, inserção social e apoios de toda a ordem, desde a educação, ao abono de família, etc.
No outro lado da balança, o exército dos desempregados continua a aumentar, ainda que o ministro da tutela tenha anunciado uma diminuição de duas décimas na percentagem (17%) de desempregados inscritos nos Centros de Emprego. Esqueceu-se a “luminária” de explicar que essa diminuição deve-se ao simples facto de 120.000 portugueses terem abandonado o pais em 2012, o que obviamente explica tal descida! Será que esta gente é mesmo estúpida ou quer fazer dos portugueses parvos?
Porque os cortes exigidos pela Troika, são de 4.600 mil milhões de euros só no primeiro semestre de 2014, não vemos como este governo poderá evitar as medidas enunciadas no documento ontem votado e aprovado no Parlamento. A descida à especialidade das respectivas comissões será, por isso, um exercício formal que pouco irá alterar nas intenções expressas nestes dois dias de discussão.
Resta a oposição. Mas qual oposição?
O PS, há muito convertido ao discurso eunuco de Seguro, um líder fraco e enfraquecido pelos pares, que fora e dentro do partido é diariamente achincalhado, agora que o “fantasma” de Sócrates voltou à ribalta?
O PCP, entrincheirado nas suas verdades imutáveis que não mobilizam mais de 10% de votantes ou, na melhor das hipóteses, 100.000 manifestantes a descer a Avenida da Liberdade?
O BE, que há muito deixou de ser o partido do crescimento sustentado, para tornar-se um partido em desagregação acelerada?
Ou os movimentos alternativos, como “Que se lixe a Troika!” que, na última concentração, mais pessoas não conseguiu do que alguns (poucos) milhares que encheram a Rua do Ouro em Lisboa?
Não sabemos. Sabemos que o Inverno se afigura mais sombrio e chuvoso. Como sempre foram os Invernos, de resto. Depois, lá para Dezembro, haverá luzes e compras (menos desta vez), mas Natal apesar de tudo. São as únicas certezas, para já. Era bom que houvesse uma surpresa no sapatinho.