Foi ontem divulgado o ranking da "Transparência Internacional" (TI), sobre corrupção a nível mundial. Um índice, criado em 1995 pela TI, que classifica anualmente 180 países membros daquela ONG, de acordo com a (percepção de) corrupção existente em cada um dos países analisados. Trata-se de uma percepção da corrupção e não da corrupção em si.
Sem surpresa, a classificação de Portugal no ranking 2024, quedou-se pela 43a posição, uma queda de nove lugares relativamente a 2023. Esta é a pior classificação de sempre, desde que uma nova metodologia foi introduzida em 2012. Portugal somou 57 pontos (numa escala de 0 a 100) em que países onde existe mais transparência somam mais pontos e países com menos transparência, somam menos pontos.
De acordo com este critério, os dez países considerados "mais transparentes" (menos corruptos), são:
Dinamarca (90 pontos), Finlândia (88), Singapura (84), Nova-Zelândia (83), Luxemburgo (81), Noruega (81), Suíça (81), Suécia (80), Países-Baixos (78), Austrália (77). No fim da lista, estão os três piores países: Venezuela (10 pontos), Somália (9) e Sudão do Sul (8).
Ainda que Portugal esteja à frente de países como a Espanha e a França, a reputação do nosso país está ao nível do Ruanda e do Botswana e abaixo da média da Europa Ocidental e da União Europeia (64 pontos). Não se pode dizer que seja um bom indicador e muito menos um bom "cartão de visita"...
Há várias explicações para a queda de Portugal no ranking. Duas das justificações, avançadas pela TI, são a "percepção de abuso de cargos públicos para benefícios privados" e "as fragilidades nos mecanismos de integridade pública para evitar abusos". Lendo as conclusões da relatório, não custa pensar em casos mediáticos como a "Operação influencer" (que levaria à demissão de António Costa e posterior queda do governo), o caso "Tutti Frutti" (com 60 implicados, dos dois maiores partidos, a nível nacional), para além da crise na Madeira (onde o presidente da região autónoma está acusado de crimes de corrupção e peculato), entre outros casos menos mediáticos.
Posto isto, fácil é concluir que é nos países mais desenvolvidos da Europa do Norte - onde os regimes democráticos têm maior tradição e as sociedades são mais inclusivas ("open societies") - que os índices de corrupção são menores; ou seja, onde o "estado social" está mais desenvolvido, há menos desigualdade, maior distribuição da riqueza e, por conseguinte, menos corrupção. Contrariamente, é nos países onde o estado é mais fraco e onde existe mais pobreza e desigualdade, que os índices de corrupção são maiores. Já as ditaduras, por não fornecerem dados fiáveis, estão por definição excluídas deste ranking, o que explica a sua não-classificação.
Perante estas conclusões, logo se apressaram alguns notáveis (Presidente da República, Juiz Conselheiro do Tribunal de Contas, Partidos da Governação...) a desvalorizar os dados apresentados: que Portugal, apesar de ter descido no ranking, não era um país de corruptos (!?), ainda que a classificação não fosse boa para a nossa "imagem", nomeadamente entre potenciais investidores estrangeiros, que pensariam duas vezes antes de pôr cá o seu capital. Trata-se, portanto (e mais uma vez) da "imagem". Ou seja, não interessa se há corrupção ou não, mas da "percepção" da coisa. O que pensam os "outros" de nós, é a filosofia subjacente.
Para quem não sabe, uma última nota relacionada com a corrupção e possíveis interpretações do acto em si. Fala-se de corrupção, "quando uma pessoa que ocupa uma posição dominante, aceite receber uma vantagem indevida em troca de prestações ou serviços". Ou seja, qualquer acto de corrupção, exige sempre dois actores, o corruptor e o corrompido, tanto no sector público, como no privado. Da mesma forma que, para além das compensações meramente pecuniárias, podemos distinguir diversos níveis de corrupção. Basta lembrar os "favores" de reciprocidade, como sejam as famosas "portas giratórias", prática em que Portugal se tornou exímio nas últimas décadas, ou não fossemos um país onde o "compadrio" e o "patrocinato", são inerentes à cultura mediterrânica. No fundo, tudo se resume à frase que celebrizou Don Corleone na famosa saga: "I'll make you an offer that you can't refuse" (faço-te uma oferta que não podes recusar). É assim tão difícil de perceber?
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