2006/11/22

As aulas de substituição

Temos assistido desde há algum tempo a "manifestações" de estudantes do secundário contra as aulas de substituição. O assunto não teria importância nenhuma se não se adivinhasse por trás de tudo isto interesses e manobras absolutamente vergonhosas.
Penso que ninguém contestará a ideia de que a questão da educação é mesmo crucial para o País. O panorama nesta área é tristemente mau e é fácil concluir, em consequência, que as nossas fraquezas nesta matéria nos tornam especialmente vulneráveis aos efeitos da "globalização" e de outros fenómenos mais ou menos sazonais. As consequências de tudo isto são devastadoras.
Por todas estas razões o assunto educação merece ser tratado por todos com uma seriedade, quase diria, sagrada. Por todas estas razões também, a todos os agentes da educação (não só professores profissionais, mas também pais, governantes e funcionários) se exige que se coloquem ao nível das circunstâncias e das respectivas responsabilidades.
Pois é neste quadro que surgiram por todo o País, desde há alguns dias, "manifestações" de alunos que começaram por ser contra as aulas de substituição. Os alunos já vêm apresentando entretanto outras razões para o "protesto". Estou seguro que da escalada resultará, em breve, o protesto contra as aulas em geral...
De todo este folclore a que temos vindo a assistir, porém, há uma coisa que fica clara: ninguém afinal contesta as aulas de substituição, a não ser alguns, poucos, professores. Mas, os argumentos que tenho ouvido da boca dos representantes desta ruidosa troupe que agora aprendeu a sair à rua são justamente contra os professores escalados para dar estas aulas. São os professores que se revelam, aos seus olhos, incompetentes para cumprir a sua tarefa.
É tempo de, como se diz, fazer um ponto de ordem à mesa...
Ninguém acredita na espontaneidade destas "manifestações". Parece no entanto que os desígnios de quem anda a manipular toda esta maltinha fizeram ricochete: são os professores que saem mal na fotografia! A conclusão que tiramos de todas estas "manifestações" só pode ser esta: os educadores profissionais, a quem todos nós pagamos salário para educar os nossos filhos, não estão à altura da sua tarefa.
Todos saimos um pouco beliscados por tudo isto. Mas, há hierarquias de responsabilidades e estou certo que a maioria dos professores não se revê nestas manobras e repudiará certamente a manipulação a que os alunos têm sido sujeitos. Era bom que o tivesse manifestado claramente.
O comportamento leviano em matéria de educação é criminoso.

2 comentários:

Carlos Alberto Augusto disse...

...não se lê, não se escreve, mas há muitos escritores!
(de uma conversa entre professores e professores-alunos)

Correspondendo ao desafio do meu amigo Carlos A A, para ler e comentar o texto que escreveu aqui, sobre as aulas de substituição, fiquei atento ao telejornal, um dos raros momentos em que ligo a televisão, confrontei-me com o movimento de manifestações de alunos sobre as aulas de substituição. Tinha presenciado a notícia da primeira e até me parecia que havia uma preocupação séria, mas tudo isto e muito mais era e é previsível face ao que se está a passar na ou com a Escola e Educação.
A crise na Escola não é nova e não é só em Portugal, ela tem-se agudizado desde os anos 80 ou talvez antes, com o seu afastamento da sociedade em mutação permanente e esta, cada vez mais, demitindo-se do seu papel, descarregando para a Escola, a Educação.
Se analisarmos qualquer iniciativa da sociedade civil, desde as preocupações ambientais às alimentares, passando pelos animais, os grandes desígnios do século, as imagens/importância de corporações como a polícia, os bombeiros e tudo o mais que há para alertar, sensibilizar, etc... a primeira resposta face à pergunta: Como pensam fazer? A quem se vão dirigir? é : Escola. Depois temos a sociedade civil, continentes & oceanos com grandes generosidades e “preocupações com o conhecimento, educação, literacia, pondo assim, no mesmo saco, diferentes coisas” com grandes campanhas do oferendas em épocas específicas e bem estudadas, mas oferecendo se... e depois a oferta: 500 livros para a escola! Mas livros de quem? Do escritor Vítor Baía, das MRP para as crianças e jovens, do Noddy, dos Morangos com Floribelas ... ). Por fim os concursos, do yorgurte ao livro (mas só de determinado autor) há de tudo para justificar empregos à conta da Escola, até em diversos departamentos do estado e das autarquias. Há uma “poluição” da sociedade civil para a Escola em nome da educação e esta que atitude toma no seu entulho de papeis? Embarca. Não diálogo entre sociedade e escola e o ME nada faz para provocar esse diálogo de forma elevada, legisla e já está dado como feito.
Paralelamente a tudo isto os sindicatos (de um dos quais sou sócio e que tem algumas pessoas muito válidas, que respeito pelo seu passado e presente), continuam a não perceber que o emprego estável para o resto da vida, perto de casa e sem investimento por iniciativa própria acabou.
O que se está a fazer no ME já deviria ter sido feito, mas há muito mais para fazer, por isso concordo este abanão da parte ME, mas para fazer o que ainda tem de ser feito, pondo em causa alguns valores “democráticos”, encontrando nas legitimidades democráticas o controle com os interlocutores executivos (presidentes dos Conselhos Executivos, formadores de seus seguidores, vice-presidentes e assessores – uns candidatos asporne, assessores de porra nenhuma – Alexandre O’Neil) prontos a isto tudo e muito mais, em nome da moralidade, igualdade e da qualidade, mais uma vez nivelando por baixo, “esquecendo” aplicadores das bases programáticas – os professores não vá dar a bom porto. Nada disto é novo no ano que se comemora o centenário de Rómulo de Carvalho, Professor que se foi afastando da nova Escola no final da sua carreira, tal qual o seu colega Virgílio Ferreira. Cansados e tratados de forma pouco digna, os Professores afastam-se e ficaram os professores, abrindo caminho ao oportunismo, ao carreirismo vitalício nos CE, pois aqui não limitação de mandatos, um novo fosso sugerirá (já os há hoje) entre os professores o os “gestores” que se apresentam verbalmente como professores (sem darem aulas – fora da realidade diária da sala de aula), de memória muito curta sobre o que é ser Professor, perpetuando o fosso entre a Escola e Sociedade.
Vamos então às aulas de substituição (2º e 3º ciclo + Secundário) – AS e actividades de acompanhamento curricular (1º ciclo) AEC.
Quanto às AS, no meio deste ruído há música. A situação não dava para continuar, mas substituir um professor por outro de uma área muito diferente, fazendo este seguir o plano do primeiro é um absurdo e uma vigarice só para manter os alunos presos a uma escola que só lhes oferece aulas (é mais do mesmo). Poder-se-á argumentar que não há recursos humanos, mas há processos de gestão, como o do professor que vai fazer a substituição avançar com a matéria da sua área, avançando poderá ficar com mais tempo livre para a escola lá para o fim do ano, e o professor faltoso ter que compensar com aulas extras (não horas extraordinárias pagas, tem que haver sentido de responsabilidade, direitos e deveres). Com as autonomias isto está única e exclusivamente nas mãos dos CE, mas para funcionar e envolver os professores a gestão tem que ser clara, aberta e de opções depois das discussõess. Porque não fomentar clubes em que os alunos possam escolher em função do seu interesse? Uma peça de teatro, sobre uma determinada temática, pode ter mais impacto junto de quem faz e de quem a vê, do que estar quatro aulas a falar do tema; uma exposição de fotografia; a projecção de um filme com conversa posterior; desporto organizando torneios, etc, etc,... poder-se-á argumentar que os professores não têm formação. Formação académica para isso não há sequer, mas pessoal sim e isto já mexe com a sociedade em que vivemos e com a formação de professores. Então porque não começamos a discutir isto? Porque continuamos com mais do mesmo: Escola = Aulas?
Quanto à segunda, AEC no primeiro ciclo, estamos a falar de crianças dos 5 aos 10 anos, os alunos que ficarem na escola (opção dos pais, acabando com argumentação dos horários), levam com mais aulas, mais do mesmo e se o inglês faz sentido, o que dizer de “aulas de cidadania” para alunos de seis anos. Neste ciclo há alunos a estarem no espaço escolar nove horas por dia e destas seis horas e meia com aulas. É esta a solução para o défice de conhecimento, retirando o tempo para crescer? Uma coisa é a escola estar aberta e outra coisa é estar aberta sempre com aulas ou estudo acompanhado numa sala em que alunos que precisam de muito apoio, outros de algum apoio e outros que não precisam de todo? Não é isto um aumento do tempo lectivo, mantendo a realidade da turma em regime de pós tempo lectivo?
Adoptando uma organização de “centralismo democrático” (é interessante esta adopção) para os seus diversos orgãos, aquilo que o ME e a Escola diz que estão a fazer para alterar (talvez fosse melhor o termo combater) a situação escandalosa dos níveis de ensino, estaremos nós a discutir no próximo acto eleitoral se não for antes, avaliar... com novas mudanças e de mudança em nome da qualidade assim vamos com a cabeça entre as orelhas (SG).
Ensinar e Educar é da única exclusividade da Escola?
Que Educação? Pensamento crítico - acolhimento processamento?

Leio, mas não sei se sou leitor, escrevo, mas não sou escritor

Carlos A. Augusto disse...

O DN de ontem trazia um estudo interessante sobre estas coisas. Um dos sublinhados dizia que em todos os paises principais existem aulas de substituiçao. Não há furos!
As aulas nesses países são pagas e aqui talvez resida a triste diferença: os profs querem ser pagos. Mas não conseguem dar uma aula de substituição! Faz-me uma grande confusão ouvir um aluno que diz que um prof não sabe cativar a atenção dos alunos nas aulas de substituição. Deviam ter aulas de substituição preparadas. Deviam conseguir falar de assuntos da sua experiência. Devia conseguir divulgar outros conhecimentos, outros saberes a que, justamente, o aluno não está normalmente exposto... Tudo isso são técnicas que qualquer profissional tem de adquirir.
Por outro lado, o estudo indica que o número de horas de aulas que ficam por dar é de 7.5 ...milhões!! Sete milhões e meio de horas de aulas que não são dadas.
Nada do que se passa neste país nos deve admirar depois de sabermos estas realidades, acho eu...