2010/11/25

O pendor para a direita

O dr. Ferraz da Costa veio tentar apequenar os resultados da Greve Geral, e mais-não-sei-quê de alterar a lei da greve, acrescentando que os sindicatos não sabem a verdadeira situação em que o país se encontra. Uma metralhadora a atirar em todas as direcções. (Ouça tudo aqui.)
Ó dr. Ferraz da Costa, se calhar não é sua intenção, mas esta conversa é um triste insulto à inteligência dos seus ouvintes, que são muitos, fervorosos e devotados, creia...
Então os sindicatos não sabem o estado em que o país se encontra?! Permita-me discordar. Sabem e sabem melhor do que ninguém, antes de mais nada porque os sindicatos são de trabalhadores e os trabalhadores sentem na pele —e são os primeiros a sentir— o "estado em que o país se encontra". Ao contrário de outros sectores da sociedade portuguesa a quem não falta calor para aquecer neste inverno, roupinha pinoca e comidinha no prato para manter a barriguinha aconchegada.
Por outro lado, diga-me lá: os sindicatos não sabem como o país está, mas depreende-se então das suas palavras que o senhor sabe. Se sabe, porque não o revela? E se não o revela porque razão o não faz? Será uma razão política? E se o senhor tem direito a não o fazer, por uma razão política, os sindicatos não terão o mesmo direito, ou pretende para si regime de excepção...?

4 comentários:

Rui Mota disse...

O Sr. Ferraz da Costa (ex. presidente da Confederação Patronal) nunca enganou ninguém, porque sempre disse ao que vinha. O mesmo não se pode dizer dos governantes actuais, que continuam a pedir sacrifícios aos que trabalham, mantendo as mordomias dos Ferrazes deste país. Isso é que é grave...

Carlos A. Augusto disse...

Ora aí está uma questão interessante: "nunca enganou ninguém"! Será?
Num outro passo da sua intervenção Ferraz da Costa dá conta de um pacote de 20 medidas que este Fórum propõe para combater a presente situação.
Fá-lo com o ar convicto de quem pretende transmitir aos ouvintes 'a' ideia, de quem está acima de qualquer suspeita, de quem se vê como pertencendo ao grupo dos virtuosos, enquanto o resto da maralha não passa de um bando de estroinas e de destruidores do bem comum.
Propõe, entre outras coisas, contratos flexíveis para os jovens e desempregados com a isenção por parte das empresas dos pagamentos à Segurança Social e, segundo o Económico, "uma política de congelamento salarial, pelo menos, até à fixação de um novo sistema de remunerações que garanta moderação salarial a crescer abaixo do crescimento da produtividade."
Sair da crise, para ele, e travar a vinda do FMI passa assim por aumentar os sacrifícios dos trabalhadores e por fazer recair ainda mais sobre o Estado o pagamento dos desmandos e da generalizada falta de nível dos empreendedores portugueses. É fácil.
Mas, como diz isto com ar sisudo e austero, sobrolho franzido para compor ainda mais a imagem, a malta vai certamente julgar que este personagem é idóneo. Tenta enganar, sim, e bem. Mas, engana-se também!
A falta de produtividade em Portugal só tem uma causa: o patronato incapaz e parasita que nos calhou em sina. Não sou contra a existência de patrões. Já o fui, em diversas circunstâncias e não vejo nada de mal nisso. Mas, em Portugal, a palavra "patrão" não tem, infelizmente, outra significado que não seja ociosidade, nível rasteiro e abuso de poder. E quanto a isto Ferraz da Costa não diz nada.
Os trabalhadores trabalham bem com quem saiba trabalhar. Infelizmente, em Portugal os patrões (estou naturalmente a generalizar e as generalizações são abusivas, incluindo esta...) não sabem dirigir um colectivo e não estão (mais uma vez generalizo...) preparados para as funções que desempenham e para as responsabilidades que têm.
Ferraz nada diz sobre a reorganização das empresas, nada diz sobre a elevação dos níveis de formação dos patrões, nada diz sobre o que quer que seja que implique a reforma do patronato português e a elevação dos seus comprovadamente baixos padrões de competência. Nada diz, enfim, sobre o fim da impunidade social de que o patronato português inexplicavelmente goza (generalizo mais uma vez).
O patronato aplaudirá as "medidas" que Ferraz propõe, os trabalhadores mais conservadores verão nele a imagem de pessoa idónea e austera que cuidadosamente projecta. Tenta enganar e bem!

Rui Mota disse...

Obviamente de acordo. Quando escrevi que ele "não engana ninguém" é porque ele defende medidas que penalizam os trabalhadores em geral. É coerente com a sua ideologia. Já o mesmo não se pode dizer do partido do governo que faz, exactamente, a mesma política e proclama estar a defender o estado social...quem é mais mentiroso?

Carlos A. Augusto disse...

Sim, cinismo não falta a uma boa parte das figuras chave do PS. Deve ser por isso que eles sorriem, sorriem sempre. Não sei se repararam como eles sorriem, com ar a dar para o trocista.
De resto, ou é cinismo ou é obstipação...