2022/06/12

"Check-Up"


Acontece aos melhores. 

Dirijo-me ao Centro de Saúde António Arnauth, recentemente inaugurado, para marcar uma consulta com o meu médico de família. Passada a triagem inicial (senha e tal...) sou chamado ao "guichet" para marcar a consulta. Não pode ser quando eu quero, mas um mês mais tarde...como não era urgente, aceito a data proposta. Estamos em Abril deste ano.

Semanas mais tarde, perante o médico, este faz-me a pergunta clássica: "Então, qual é a queixa?". 

- Nada em especial. Acontece que tenho por hábito fazer um "check-up" regular e há três anos que não faço nenhum, devido à pandemia de Covid e à sobrecarga nos hospitais. Pensei que estava na altura de retomar a rotina...

E faz muito bem. Então, diga lá quais os exames que quer fazer...

- Bom, para além das análises habituais, sangue, urina, psa, etc..., exame cardiológico (electro-cardiograma),  radiológico (pulmões) e ecografias (rins, estômago...). Parece-me que é tudo...

Sim senhor. Só um momento, para escrever e imprimir. Quando tiver os resultados não se esqueça de passar por cá outra vez...

Passadas umas semanas, dirijo-me ao Hospital mais próximo, no caso uma extensão do "Lusíadas", uma cadeia de hospitais privados da região de Lisboa. Uma vez chegado e passada a triagem, dirijo-me ao balcão das marcações. As análises eram num edifício e as radiografias noutro. A funcionária, olha-me com ar de comiseração e pergunta-me se desejo fazer o "check-up" num dia só, ou se pode ser em dias separados...

- Bom, se puder ser num só dia, ou em datas próximas, preferia...

Pois é, mas no mesmo dia, só tenho datas livres em Setembro...posso marcar-lhe as análises em Junho e as radiografias em Agosto...Pode ser? 

- Que remédio. Então marque já para as datas que tiver livres. 

Imprime as respectivas marcações e agrafa-as em separado. Faço uma leitura transversal da papelada e volto para casa.

Na data indicada, regresso ao hospital para fazer as análises e duas radiografias marcadas para esse dia. A funcionária que me atende examina os papéis e diz-me: "Não estão aqui os pedidos do médico para as radiografias de hoje. Sem pedidos, não podemos fazer os exames. Volte ao andar de baixo e veja lá com a minha colega das marcações. O resto pode fazer aqui". 

Dirijo-me ao laboratório de análises. A enfermeira olha para mim e pergunta-me pela amostra de urina e se tinha comido alguma coisa de manhã...

- Não trouxe nada e comi esta manhã. Ninguém me disse nada e nas marcações não estava escrito que devia vir em jejum..

Bom, nesse caso, diga-me do que constou o seu pequeno-almoço. Acha que tem vontade para urinar outra vez, mesmo que seja pouco?...

-  Ok. Hei-de arranjar vontade. Com vontade, tudo se consegue...

Quando voltar a falar com o médico, explique-lhe o que se passou, porque os valores podem não estar correctos (açúcar no sangue, ácido úrico...). Se ele pensar que tem de fazer novos exames terá de cá voltar...

Saio dali e dirijo-me ao andar de baixo para fazer as radiografias. Mesma questão: sem guia do médico, nada feito. Onde estavam os pedidos do médico?

- Só trouxe comigo as marcações para hoje. As outras, são para o dia 1 de Agosto...

Ah, que pena. E mora perto? Se quiser ir buscá-las, eu guardo aqui a sua senha e pode fazer as radiografias esta tarde...

Saio a correr, apanho um táxi, vou a casa buscar as guias médicas e regresso meia-hora mais tarde. Desço à cave e mostro triunfante os pedidos do médico; "Aqui estão os pedidos!".

Mostre cá. Claro, já percebi, a minha colega das marcações agrafou mal as receitas e estão com as datas trocadas. Ainda bem que guardei a sua senha. Não se preocupe, entra já, depois daquele senhor. Espere que o chamem pelo número. 

Assim foi. Dez minutos mais tarde, estava a ser chamado. Duas radiografias e estava na rua. Os resultados iriam ser comunicados através de um SMS no meu telemóvel ou, se preferisse, podia ir buscá-los em mão. Volto ao primeiro edifício e falo com a funcionária das marcações. Pede-me desculpas pelo erro e pergunta-me o que desejo. 

- Bom, queria saber se é possível alterar os exames ECG e as Ecografias, marcados para 1 de Agosto, pois estou de férias nessa data. Pode ser para mais tarde...

Claro, não há problema. o dia 8 de Setembro é a data que tenho livre. Convém-lhe?

- Que remédio. Já estou por tudo...

Agradeço, recolho o papel com a nova marcação e volto para casa. Passados dois dias tinha o resultado das análises e das primeiras radiografias no telemóvel. Volto ao Centro de Saúde, para marcar nova consulta com o médico de família e mostrar-lhe os resultados. O funcionário que me atendeu, olha para mim e diz-me com ar paciente: "Dia 1 de Julho, às oito da manhã. É o primeiro do dia. Não se atrase..."

- Não pode ser antes? É só para mostrar umas análises...

Oh amigo, isto aqui não é quando a gente quer! Para além disso, o médico também vai de férias. Veja lá bem.

- Pronto, pronto. Dia 1 de Julho, está perfeito.  

4 comentários:

Carlos Alberto Augusto disse...

Enquanto andarmos a brincar ao SNS, favorecendo os "privados" e desviando milhões para o Zelensky, o SNS (que eu admiro e defenderei até à morte!) não vai poder funcionar melhor. A culpa é deste Governo. Ponto.

rui mota disse...

Sim, claro. Aliás, perguntam-me sempre na recepção do mesmo hospital (Hospital de Sto. António), se venho pelo SNS ou se tenho um "Seguro" (privado). Estou certo que se fosse eu a pagar (já fiz essa experiência várias vezes, quando não podia esperar...), marcavam logo os exames para a semana seguinte. Um "sistema" viciado, pois o estado paga aos privados para fazerem exames comparticipados. Desta forma, os privados ganham nos dois lados. Não falta dinheiro para a "saúde" (ainda que falte sempre dinheiro, como sabemos), mas faltam sempre meios humanos e materiais. Ainda ontem li, que no Algarve (Faro), não existe tratamento para doentes oncológicos no público (!?). Existe, sim, um convénio com uma clínica privada em Faro que ganha todos os anos o concurso para poder prestar esse serviço (!?). Só que, este ano, os espanhóis também concorreram e ganharam o concurso! Resultado, os serviços hospitalares portugueses do Alagarve, ofereceram transportes semanais aos doentes, para poderem fazer o tratamento químio em Sevilha (500km)! Isto faz algum sentido? Faz lembrar a velha questão dos partos (e dos abortos) em Badajoz, pois na região fronteiriça não havia unidades hospitalares que o pudessem fazer. Alguém imagina um(a) espanhol(a) a deslocar-se a Portugal para fazer tratamentos hospitalares? Nem pensar! Estes gajos estão todos doidos e não têm vergonha nenhuma.

Carlos Alberto Augusto disse...

"Um "sistema" viciado, pois o estado paga aos privados para fazerem exames comparticipados." Mais grave: parece que o estado paga porque alguns médicos que jogam nos dois tabuleiros manipulam o jogo. Duplamente grave e incacreditável vergonha. Parece que os processos disciplinares no MS não estão na moda...

rui mota disse...

Os médicos aproveitam-se do "sistema", que forma poucos médicos, como sabemos. Quando há poucos médicos, o governo deve providenciar para formar mais. Só que vivemos num estado corporativo e a Ordem dos Médicos impõe um sistema de "numerus clausus", impeditivo de muitos estudantes chegarem à faculdade de Medicina. Basta lembrar que o critério principal para entrar em Medicina, é o da média mais alta do ano precedente. Se a média for, por exemplo, 19,8, isso quer dizer que quem não tem esta média, fica automaticamente excluído e tem de ir estudar outra coisa, ou tentar estudar no estrangeiro (muitos vão para Espanha, por exemplo). Depois, há a questão dos médicos "tarefeiros". Formam-se, tiram a especialidade e vão trabalhar para o privado. Quando há necessidade (como durante a pandemia) voluntariam-se para fazer horas extraordinárias no Publico, a 60euros/hora. Esta é uma situação que se arrasta há anos e tende a piorar, pois 25% dos médicos está a atingir a idade da reforma e já não faz urgências. Um circulo vicioso. O governo continua a afirmar que aumentou o Orçamento para a saúde (o que é verdade) e que Portugal tem um "ratio" 1 médico para 1500/pacientes (média Europeia), mas esquece-se de dizer que 80% dos médicos vive e trabalha no litoral. Ninguém quer ir exercer medicina para o interior. Nem para Algarve querem ir! Ainda recentemente abriram 27 vagas para Faro e só houve duas candidaturas...portanto, uma questão de vontade política e de má organização/gestão. Não sei como sair disto.