2012/03/14

Sobre a volatilidade da comercialização de produtos voláteis

É um verdadeiro escândalo aquilo que se passa com os preços da energia em Portugal. Por mais voltas que se tente dar para perceber as razões que levam os preços dos combustíveis, da electricidade e outros, a atingir estes valores criminosos que temos hoje, deparamos sempre com um novelo intrincado. Ao tentar desembrulhá-lo a única coisa que se nos revela é um outro sistema fiscal, escondido, por detrás do sistema, já de si terrorista, aprovado no Orçamento de Estado. Um sistema que recorre a uma plêiade de outros instrumentos como a factura da electricidade, as taxas "moderadoras" na saúde, as portagens, etc.. Um contributo, nosso, uma verdadeira inovação, na vetusta arte da administração fiscal: a economia paralela de estado.
A novela "eléctricas"promete (leia aquiaqui, por exemplo). Mas há outras novelas e outros artistas.
O presidente da Galp dizia ontem à TSF que "estamos a viver num período de alta volatilidade, o negócio de produtos petrolíferos é totalmente globalizado, portanto, os preços não são definidos nem condicionados pela economia portuguesa." Pois... Não sei se a expressão utilizada "alta volatilidade" tem a ver com o produto ou se se trata de fazer humor negro. O que sei é que olhando para os preços no estrangeiro e em Portugal, comprovando as discrepâncias brutais de preços nas bombas, que cá se registam (repare-se, por exemplo, nas diferenças inexplicáveis de preço em bombas de gasolina urbanas e rurais, entre bombas situadas numa autoestrada e numa estrada normal, a escassas dezenas de metros, por vezes, uma da outra, ou nas diferenças entre os preços praticados pela omnipresente Galp e as outras), verificando o gráfico da progressão do aumento dos combustíveis, o termo volátil vem, sem dúvida, à mente...
Ferreira de Oliveira mostrou-se também preocupadíssimo com os postos de venda. Haverá centenas em perigo, o negócio escasseia, a situação é, concorda o presidente da ANAREC, grave, 250 postos de venda terão encerrado nos últimos dois anos e 300 estão em vias de encerrar. Perto de 2 500 postos de trabalho irão perder-se. Ferreira de Oliveira fala num tom que mais parece querer dizer que, mandasse ele, iríamos todos nós, desavergonhados sem sentido patriótico, ser obrigados a comprar mais gasolina, ainda mais cara, para que o sector se pudesse salvar.
Tudo isto se passa sem aparente controlo, sem visão estratégica, com o Estado em intrigante ponto morto, em nome sabe-se lá de que misteriosos desígnios.
Entretanto os preços dos combustíveis em Portugal estão "em linha com o resto da Europa," constata o Secretário de Estado da Energia (*). Claro que se exigiria mais neste domínio de uma economia que se pretende mais competitiva do que a do resto da Europa, mas para quê ser tão picuinhas? Há sempre a componente salarial para equilibrar a competitividade, constatamos nós.
A economia afunda-se, o preço dos combustíveis, um dos factores que mais contribui para a fraca produtividade da economia portuguesa, não pára de aumentar. O negócio dos combustíveis, esse, baixa, os comerciantes do sector fecham as portas e despedem pessoal, os portugueses arrumam os carros, as empresas tentam fazer reflectir nos preços dos produtos o preço irracional dos combustíveis e, com isso, afundam-se e afundam ainda mais uma economia já quase em hipotermia. O Estado deve certamente perder, na diminuição do negócio e nos encargos que terá de suportar com os despedimentos, o que ganha nos impostos (a componente mais pesada da factura da gasolina que pagamos; 60% no caso da gasolina e 50% no do gasóleo.)
É assim a liberalização dos preços, é assim a globalização, é, enfim, assim a volatilidade. São assim os estranhos caminhos da gestão...

(*) Não sei que "linha" é esta, mas, no caso dos combustíveis, deve-se escrever direito por "linha torta". Diz-se que a nossa é a gasolina mais cara dos 27...

4 comentários:

rui mota disse...

Pior do que os combustíveis, é a electricidade, da qual somos todos mais ou menos dependentes.
Ver e decifrar as facturas da EDP é um trabalho digno de "mestrado".
A roubalheira é total e já vem de longe. Penso que isto não tem nada a ver com as leis da concorrência, que impedem a formação de monopólios, mas sim com a ganância e permissividade de um estado que nunca esteve preocupado com os seus cidadãos.
Há dezenas de anos que os preços de energia (gasolina+electricidade) é dos mais caros da Europa, em termos absolutos e relativos, mas ninguém consegue parar estas máfias. Um escândalo!

Carlos A. Augusto disse...

A factura da gasolina é igualmente escandalosa e a sua decifração é outra cadeira curricular digna de um mestrado... A conversa do comissário local do "negócio global", Ferreira de Oliveira é um insulto à nossa inteligência, na boa tradição dos insultos de Mexia Feng Shui.

Fusível Ativo disse...

Todos os detentores energéticos são um oligopólio (e aqui ainda entram as telecomunicações). Por isso, a concorrência neste tipo de mercados é uma grande utopia, numa em que até os partidos mais à direita acreditam.

Carlos A. Augusto disse...

A Autoridade da Concorrência concorre para a confusão. Estuda, compara, analisa... pero todavia no pasa nada! http://www.tsf.pt/PaginaInicial/Economia/Interior.aspx?content_id=2361779