2007/04/26

Memorizar

Como manda a tradição, o Presidente discursou na Assembleia. Disse ele, entre outras coisas, que "é tempo de (re)avaliar a cerimónia" e que "o futuro pertence aos jovens". O discurso do Presidente vale o que vale e cada um extrairá dele as conclusões que melhor entender.
Que a cerimónia da Assembleia cheira um bocado a mofo, todos estamos de acordo. Que o futuro pertence aos jovens, nem se discute. Resta saber, como manter a memória, após trinta e três anos de comemorações.
E é aqui que bate o ponto: sem educação cívica digna desse nome, difícil será a um jovem compreender o regime que ninguém (à excepção de alguns saudosistas) quer ver de volta. Eu não quero e, estou certo, o Professor Cavaco também não. Portanto, há que repensar o ensino da democracia, com o risco de sermos obrigados a ver cerimónias destas até ao fim dos nossos dias... Ora a melhor forma de manter viva a memória - coisa com que os portugueses convivem mal - é ensinar nas escolas o que era o regime ditatorial e o que significou o "25 de Abril", por oposição aquele. A avaliar pelos programas curriculares conhecidos (onde a História ensinada termina, muitas vezes, em 1820) dificilmente os jovens, de que o falava o Professor, entenderão o que se passou. Como também sabemos, o futuro pertencerá aos jovens que melhor compreendam o passado. Quanto mais não seja, para não repetirem os seus erros.

1 comentário:

Carlos A. Augusto disse...

Há uma coisa estranha que se está a passar hoje nesta matéria.
O 25 de Abril --que nós celebramos hoje no nosso dia a dia, na nossa prática quotidiana, no trabalho, na nossa vida privada, na nossa participação cívica e democrática, no nosso envolvimento em múltiplas formas de associação, na projecção internacional do país, enfim, num sem número de ocasiões e circunstâncias que ocorrem da nossa vida real, pessoal e colectiva-- está, diz-se, a perder fulgor e a sua celebração a rotinizar-se. A realidade é esta, rica e diversificada, e o facto dela fazer parte do nosso quotidiano é a melhor celebração que dela podemos fazer.
Já as loas cantadas a Salazar --uma figura que parece subitamente ter entrado na moda, que não corresponde hoje a nada de real e vivido-- surgem como tema de primeira página nos jornais ou de abertura de telejornais... A esmagadora maioria da população não viveu o regime salazarista na prática, não tem dessa figura uma experiência na primeira pessoa e não conhece de todo o regime que encabeçou senão alguns ecos distorcidos. Contudo, os elogios ao ditador feitos à margem do que é a realidade quotidina do país merecem grande destaque jornalístico e generoso tempo de antena.
Parece pois que as observações do Presidente da República deveriam ser viradas para outro lado...
Mas, sabem que mais? Até na liberdade com que se presta vassalagem póstuma ao cadáver salazarento os portugueses comemoram o regime do 25 de Abril. De uma forma arrevesada é certo, mas, no fundo, é disso que se trata: uma celebração das liberdades, no sentido que invoquei atrás...
De igual oportunidade não gozaram as inúmeras vítimas desse regime.