2008/09/24

O crime de incúria não prescreve

O fenómeno do "aquecimento global" já há muito que chegou a Portugal. Antes afinal de se tornar preocupação à escala planetária, antes de todos os outros países, já Portugal padecia das consequências do fenómeno. 
Outros países "aqueceram" com a mecanização, a dinâmica económica, com o desenvolvimento do conhecimento e com a inovação. "Aqueceram" com a proliferação, certamente desregulada, de novos meios, que vieram, no fim de contas, proporcionar um maior bem estar material às respectivas populações. 
Portugal passou à margem de tudo isto. "Aqueceu" com o mal estar gerado pelo aumento da  injustiça, do desleixo, da irresponsabilidade, da indiferença, da corrupção e da ignorância. Há de facto quem fique em braza com toda esta bandalheira. Aqui no Face, somos apenas mais um blog a olhar também as causas e os instrumentos deste "aquecimento" à Portuguesa e a analisar e denunciar alguns epifenómenos daí resultantes. 
Este pequeno "furacão" gerado pela questão dos painéis da Maria Keill veio mostrar que, apesar de tudo, os agentes responsáveis pelo aquecimento à portuguesa estão debaixo de olho e que uma parte nada despicienda da população está sempre atenta e tenta, ela também, com todos os meios que tem à sua disposição, combater este fenómeno sui generis, que é resultado desta nossa triste e manhosa natureza. Uma parte significativa da população pratica o tal direito à indignação. Tão somente... 
A internet, não é só o motivo de encantamentos serôdios --a internet já tem mais de 40 anos, a pacovice portuguesa é que acha que ela só começou com o "cabo"--, nem o tal fenómeno marginal e incontrolável como muitos a classificam --para disfarçar, quiçá, a vontade que teriam em controlá-la, eles próprios; o pé de muito boa gente desliza para o chinelo do fascismo e do "controleirismo" com enorme facilidade... As pessoas que assinaram a petição fizeram-no de forma consciente e sabem que esta é uma arma que não atira balas, mas que pode até talvez ser mais acutilante do que as armas que o fazem. Sabemos para quem a estamos a apontar. 
O caso da destruição dos painéis da Maria Keill passou-nos ao lado na altura em que ocorreu. Paciência. Mas, foi e é um crime! O modo como foi tratado pelo Metropolitano, os acordos a que esta instituição terá chegado com a autora não acrescentam, nem retiram, nada à gravidade deste caso. Os painéis faziam parte do património artístico do País. Não eram do Metropolitano, nem já sequer da autora. Eram nossos. 
Por um conjunto fortuito de circunstâncias, acabámos por ter conhecimento de tudo isto, a maior parte de nós, apenas agora. Através, imaginem, dos blogs. E reagimos. Para admiração, inclusivamente, de alguns camaradas bloguistas, que parecem achar que, opiniões, só as deles...
E, vejam lá!, somos muitos! Aparentemente, somos muitos a reagir e a mostrar a nossa enorme indignação. Somos muitos dentro do País e são muitos os que, pelos vistos, estão também atentos lá fora às tropelias que por aqui se vão fazendo. Tropelias que ainda há pouco, se repetiram, com outros autores e com outros painéis. 
Porquê reagir agora? O crime da incúria e da leviandade não prescreve. Ontem foram os painéis da Maria Keil, amanhã será o quê, de quem? Ou serão só os Budas do Afeganistão que devem merecer o repúdio das almas piedosas? 
O que pedimos é de uma enorme singeleza e clareza. Queremos uma resposta.

7 comentários:

Rini Luyks disse...

Acho lamentável o recuo desproporcional no blogue "As causas da Júlia", post dia 22, que parece mais um acto de vassalagem ao poder, com muita gente a dizer que "sim, muito bem, Júlia" (também num comentário no "Anacruses").
Triste espectáculo!

Carlos A. Augusto disse...

É caso para perguntar quem é que criou um efeito de "bola de neve" a quem...?
É triste é.

Rui Mota disse...

Rini,
Uma das caraterísticas dos portugueses é confundirem o coração com a razão. As pessoas que apoiam a Júlia são amigas dela e defendem a sua posição. Acontece amiúde nesta sociedade tolhida pelo medo e onde não há tradição de movimentos cívicos/cidadania. Uma pecha que vem de longe, a falta de "inscripção" na história, de que fala o José Gil no livro "Portugal hoje: o medo de existir".
Quando alguém aponta para a Lua, as pessoas têm tendência a olhar para o dedo e a esquecer a Lua... Passa-se com os azulejos, como com outras coisas importantes na sociedade. E não tem, necessariamente, a ver com vassalagem ao poder.

Rini Luyks disse...

O.K. caro Rui, posso ter-me enganado quanto à "vassalagem", como também percebi da reacção de Carlos António no "Anacruses".
Definitivamente não sou latino, ainda menos português...
Outra vez com razão a referência ao José Gil. O homem merecia uma estátua, só que pouca gente ia perceber (e ele também não queria, penso!)

Júlia Coutinho disse...

Convido este blog a lerem a carta do filho de Maria Keil que acabo de colocar no www.ascausasdajulia.blogspot.com

Rui Mota disse...

Julia,

Já lemos a carta do Pitum, que não nos enviou nenhuma carta. Não sabia que representavas a família Keil. Tens procuração?

Carlos A. Augusto disse...

Já agora, reproduzo aqui o comentário que me merece o post do arquitecto Keil do Amaral.

Como promotor da Petição devo dizer que li e compreendo as razões apresentadas pelo arquitecto Keil do Amaral.
Tenho pena que ele não tenha tido uma palavra para as cerca de 4.000 pessoas que se manifestaram pela obra da sua mãe e que reagiram perante este acto de destruição (não está aqui em causa se foi há vinte anos ou vinte minutos, só o soubemos agora...) como se se tratasse de algo que lhes foi feito a elas.
O nosso móbil e o "jeito" desta petição era (é) esse...