2011/05/13

Coisas simples de perceber

Portugal entrou hoje, oficialmente, em recessão técnica (dados do INE). Uma notícia esperada, que o ministro da economia (Vieira da Silva) logo veio desvalorizar com o fantástico argumento de que estas coisas são naturais em época de crise económica.
Simultaneamente, vamos sabendo que os juros a pagar pelo empréstimo de 78.000 milhões de euros, rondam os 30.000 milhões, a taxas de 5% e mais por cento. Ou seja, um total de 110.000 milhões de euros que ninguém sabe muito bem quando serão pagos, com uma economia a crescer a menos de 1% ao ano.
Hoje mesmo a Agência Bloomberg concluia que Portugal não terá condições para pagar esta dívida, opinião que confirma a análise da Standard & Poors de há dias e da maior parte dos economistas nacionais e internacionais de renome.
O mais provável será Portugal chegar a 2013 com os juros pagos e - como a economia não crescerá mais do que 2% - entrar de novo em recessão e ser obrigado a pedir mais dinheiro para pagar a dívida que, entretanto, contraiu...
Como sabemos da Grécia e da Irlanda, a terapia de choque aplicada pelo FMI e pelo BCE, naqueles países, agravou a sua condição social e económica, de tal modo que o desemprego disparou para níveis nunca atingidos e os juros no mercado chegam aos 20 e mais por cento! Um cenário provável para o nosso país que alguns arautos da economia liberal desvalorizam e chamam de previsões "catastrofistas". O principal argumento destes iluminados crâneos é que não há volta a dar e que a alternativa é sair do Euro o que tornaria as coisas ainda piores. Postos perante a alternativa de (re)negociar a dívida de forma a obter prazos mais dilatados e juros mais baixos (única forma de não estrangular a economia que tem de crescer para podermos criar riqueza e, dessa forma, pagar a dívida), dizem-nos que isso é criar calotes e Portugal tem de pagar aos seus credores. Ou seja, para pagarmos agora aos credores, ficamos endividados até às calendas, pois nenhuma economia débil (como a nossa) tem capacidade de recuperar desta crise (estrutural e conjuntural) em que Portugal está metido há mais de dez anos.
Neste contexto de especulação internacional, os nossos obedientes governantes (os actuais e os que vierem após 5 de Junho) querem-nos impôr o "pensamento único" que advoga o conformismo em relação à situação por eles próprios criada.
Porque com esta gente não iremos a lado nenhum, é tempo dos cidadãos criarem formas democráticas de participação activa, para obrigar os políticos a defender os interesses nacionais, ou sairem pelo seu próprio pé, única forma de darem voz a quem de direito. Ou seja, só fora do modelo parlamentar actual, controlado por partidos acomodados e reféns do sistema, parece ser hoje possível construir uma democracia mais participativa, pois a democracia não se esgota no modelo representativo (eleições de 4 em 4 anos) que afasta cada vez mais os cidadãos conforme as percentagens de abstenção claramente o indicam. O desinteresse e a apatia conduzem ao conformismo que poderá revelar-se fatal no dia em que formos governados por um regime autoritário para o qual indirectamente contribuimos.

2 comentários:

Carlos A. Augusto disse...

A questão que levantei do inquérito sobre causas e responsáveis da crise é, quanto a mim, a questão mais pertinente que se nos coloca neste momento. Sobretudo apurar as causas da nossa crise para poder corrigir o que está mal. Saber quem são exactamente os causadores seria um bónus.
Não percebo por que razão não está já em marcha um muito amplo movimento nacional para andar com este processo para a frente. Por muito menos (a questão do inquérito à actuação das agências de rating, questão importante, mas não prioritária para nós nesta altura) juntaram-se quase 12 000 pessoas e isso levou a PGR a ter de agir.
Este não é um problema que entre naquela categoria definida pelo Catroga...

Rui Mota disse...

De acordo. Essa foi de resto a sugestão do economista islandês que nos visitou há pouco. E ele sabe do que fala. Por isso é necessária uma auditoria à dívida para apurar qual é parte pública e a parte da dívida soberana, única forma de saber quem é culpado de quê.