2019/10/07

Eleições: o dia seguinte

Terminada a contagem dos votos no continente (ainda faltam apurar os votos da emigração) o balanço corresponde em larga medida às projecções da Universidade Católica para o Público/RTP, de há anos a esta parte a mais fiável no universo das sondagens portuguesas.
Contas feitas, o PS ganhou (como se esperava) sem maioria absoluta; a direita tradicional (PSD/CDS) perdeu (como se esperava) com um dos piores resultados de sempre; o BE consolidou o número de deputados (como se esperava), ainda que tenha perdido votos; a CDU (PCP/PEV) perdeu votos e deputados (como se esperava), confirmando a descida das ultimas 4 eleições; o PAN cresceu (como se esperava), duplicando os seus votos. Surpresas (relativas) foram as votações no "Livre" (Esquerda Verde), na  "Iniciativa Liberal" (Neo-Liberais) e no "Chega" (Extrema-Direita) que conseguiram, pela primeira vez, eleger um deputado. Desta forma, o Parlamento passará a contar com 9 partidos, um "unicum" na democracia portuguesa.
Resumindo, a esquerda em conjunto (PS, BE, CDU, Livre) obteve 138 deputados num total de 230, o que corresponde a uma maioria confortável de 54%.
Com estes números, António Costa não terá dificuldade em governar à esquerda (ou à direita), ainda que no discurso da vitória tenha claramente manifestado a sua preferência por uma solução de esquerda, eventualmente alargada ao Livre e ao PAN.
A confirmar-se esta solução,  não é certo que o PS necessite dos mesmos intervenientes da primeira "Geringonça", para aprovar medidas e/ou orçamentos específicos, sendo certo que (sem o PCP) só o Bloco de Esquerda lhe permitirá obter uma maioria na AR (125 votos em 230),
Já o PCP não parece acreditar na reedição da "Geringonça", o que se compreende dada a perda constante de votos, desde que passou a apoiar o governo PS, o que pode ser interpretado como uma das razões para a sua queda.
Permanece, assim, em aberto, a solução de um governo minoritário (PS), com acordos pontuais em matérias que necessitem de maiorias qualificadas. No limite, bastará que os partidos de esquerda se abstenham nas votações, para que as propostas governamentais passem no parlamento, já que o PS sózinho tem mais votos do que a direita toda junta...
Dos três novos partidos, o "Livre" é o mais antigo e aquele que apresenta melhores pergaminhos. Rui Tavares, o seu fundador, foi deputado europeu entre 2009 e 2014 e só por uma "unha negra" não entrou para o Parlamento em 2015. A "Iniciativa Liberal", é um partido de cariz neo-liberal, apoiado pelo jornal "Observador", pelo "Compromisso Portugal" e pelo grupo "5.7", um "thinktank" criado pelo deputado M. Morgado (PSD). No fundo, uma tentativa de criar algo sem tradições no panorama político português, um partido de cariz liberal "puro e duro", que não disfarça os seus tiques de "capitalismo selvagem", bem mais próximo do "Chega" (xenófobo e racista) do que muitos pensarão. Será à sua volta, que a direita mais extrema irá reconstruir-se, agora que o dinheiro parece não faltar  e os contactos com Steve Bannon (o guru de Trump) já existem, como os seus líderes admitiram.
Uma última palavra para a abstenção (45%), a maior de sempre em eleições legislativas, uma velha pecha, ainda que, pela primeira vez, os emigrantes tenham sido recenseados automaticamente, o que contribui para mais votos em números absolutos.
Seguem-se, agora, as audiências com o PR e as conversações habituais entre partidos, que ajudarão a perceber qual o modelo de governo que se seguirá: minoritário, em coligação ou apoiado por outros partidos. Costa tem a "faca e o queijo" na mão.       

Sem comentários: