2020/03/18

Duas Semanas noutra Cidade: Teatro, Flamenco, Vírus e Confinamento


No âmbito de um programa de intercâmbio, firmado entre a Escuela Superior de Arte Dramático de Sevilla (ESAD) e o Teatro da Rainha (Caldas da Rainha), deslocou-se na passada semana, à capital andaluza, a companhia portuguesa que, este ano, comemora o seu 35º aniversário.
Do programa pré-estabelecido, a apresentação da peça "Planeta Vinil" para além da observação-participativa em aulas de representação e na construção de títeres por professores e alunos de Sevilha que, em data ainda por determinar, retribuirão a visita com a representação de uma peça criada para o efeito, para além de "workshops" de voz e títeres, propostos pelo corpo docente da Escola.     
Quatro dias de intenso convívio e animação, cujo ponto alto constituiu a apresentação da peça portuguesa, da autoria de Cecília Ferreira, representada pelos actores Cibele Maçãs, Mafalda Taveira, Fábio Costa e Nuno Machado. A encenação esteve a cargo de Fernando Mora Ramos e a sonoplastia a cargo de Lucas Keating e António Anunciação.
A peça, uma metáfora sobre o planeta e o perigo de extinção da vida animal, não podia ser mais actual, em tempo de alterações climáticas. Nas palavras da autora:
"Uma criança ruiva, um peixe-napoleão, um escaravelho e uma galinha poedeira, fogem da Extinção. Não sabem ao certo quem ela é, mas pelo tom grave com que todos pronunciam o seu nome, e cada vez com mais aperto, estão certos de que se trata de uma criatura monstruosa e assustadora, que está a aproximar-se deles com largas e demolidoras passadas. Os quatro não decidiram fugir juntos, foi o caminho que os juntou. E nem sempre foi fácil a sua convivência, mas seguiram, guiados pelos seus instintos e convicções, em direcção à Porta do Fundo do Mundo, que lhes permitirá aceder, acreditam, ao Avesso - aquele que está limpo da Extinção e de outros monstros que tais.
Todos parecem saber como chegar até lá, mas o tempo excede-se, elucida e confunde, e o percurso cresce e inquieta" (do programa).
Anfiteatro da escola cheio, para apreciar esta peça para todas as idades que, nas palavras do seu encenador, pode ser vista por espectadores dos 7 aos 77.
Excelentes, as interpretações, de todos os actores, dirigidos desta vez por Mora Ramos, um actor de volta ao papel de encenador.
A representação mereceu rasgados elogios, tanto dos alunos como dos docentes presentes, após a qual se seguiu um debate entre os actores e o público.
A visita a Sevilha, não terminaria sem uma passagem pela Casa de La Memoria, para mais uma sessão de Flamenco, a cargo do corpo dos artistas residentes, que garantem a qualidade da arte neste centro de excelência da cidade.

Como era inevitável, a pandemia existente dominou todas as conversas. A Espanha é, de resto, o segundo país europeu em números de casos detectados e o quarto a nível mundial. Os alarmes nos meios de comunicação social sucedem-se ao minuto e os números de infectados e de vítimas cresce exponencialmente. Também por esse motivo, os membros da companhia optaram por regressar mais cedo que o previsto.
Prevendo o pior, tentámos a habitual reserva num dos autocarros que fazem a ligação entre a cidade e  Faro. Debalde. Tinham sido cancelados e só havia lugares no último autcarro que saía à meia-noite de segunda para terça-feira.
A segunda hipótese seria alguém levar-me à fronteira de carro. Telefonámos para a Guardia Civil. Não era permitido o trânsito, à excepção de ambulâncias, carros da polícia ou de empresas e pessoas que trabalham em ambos os lados da fronteira. Multa para prevericadores: 600euros.
Terceira tentativa: o avião. Preços obscenos e horas de espera infinitas de "tranfers" em Madrid. Exemplo: a Ryanair (não por acaso, considerada a pior companhia "low-cost" nos "rankings" internacionais) oferecia voos directos e via Madrid, a partir de185euros. Uma mala no porão, 70euros. A escolha de lugar, em classe económica, 17 euros. Custos administrativos, pela operação bancária, 7 euros. Ou seja, na hipótese mais barata, com 4 horas de espera em Barajas, a módica quantia de 280 euros...  
Quarta tentativa: o "Blablacar". Para nossa surpresa, ainda funcionava. Escolhido o dia (terça 17) e paga a passagem, restava a confirmação. Confirmado na mesma noite, para as 15h, com 5 horas de viagem "nonstop" até Lisboa. Só que...algumas horas mais tarde, a viagem foi canceldada pelo operador, com os habituais pedidos de desculpa e a promessa de devolução do dinheiro.
Quinta tentativa: um autocarro para Lisboa. Ainda restava um lugar, no último autocarro antes de fechar a fronteira. Reserva feita, pela NET, restava o pagamento. Só podia ser efectuado, mediante a inscripção como aderente da empresa. Preenchido o formulário de viajante frequente, voltámos à página de reserva. Tarde demais: o último lugar tinha sido comprado!
Sexta tentativa: um voo alternativo. Uma obscura companhia de voos internos, em colaboração com a Ibéria, voava a partir de Jerez de La Frontera, para Lisboa via Madrid (3 horas no total). Preço 128euros. Melhor, era impossível. Reservado e comprado.
Entretanto, na televisão espanhola, assisto ao discurso do primeiro-ministro português, em deferido, anunciando o fecho das fronteiras. Duas horas depois, um email da Iberia a anunciar o cancelamento do voo. Devolverão o dinheiro, claro.
Em desespero de causa, consulto o "site" do Ministério de Negócios Estrangeiros. Como esperado,  noticia a abertura de uma "linha de apoio a portugueses no estrangeiro". Fornecem um número de telefone e um mail: Covid19@mne.pt. O telefone está permanente ocupado. O mail foi enviado.
Sexta tentativa: telefonema para o Consulado em Sevilha. Respondem que pouco podem fazer. Informam que, se eu conseguir chegar à fronteira, deixam-me entrar (era melhor!). Depois poderei pedir um táxi para me levar a V. R. Sto. António. Aguardam instruções de Lisboa.
Passaram mais de 36 horas. Esta manhã, telefonema do Consulado: se eu puder esperar, o Consulado está a organizar o regresso de autocarro para portugueses que se encontram em Espanha. Estão a tentar agrupá-los em Sevilha, dada a proximidade da fronteira. Necessitam de 20 pessoas, no mínimo, para justificar o aluguer de um autocarro. A viagem será garantida até Faro. Se eu quiser esperar...

1 comentário:

cabeça disse...

Amigo Rui Mota. Epidemia, espanha, Flamenco, Teatro, e Virus??!!. Pá! fica mas é por aí, a Primavera está quase a rebentar. Mergulha, ouvi dizer que os CoroneVirus não se dão com o sal. Agora toma mas é cuidado, com a merda, do colosteral.
Vai um abraço.