O Mundo é um lugar perigoso. Sabe-se há muito. Que os conflitos, nos tempos que correm, parecem mais eminentes que nunca, só pode ser coincidência. E, no entanto, eles existem e não devem ser menosprezados.
Uma pequena listagem, feita ao correr da pena, a partir de notícias diárias:
Ucrânia - Continua a guerra, iniciada pela Rússia em 22 de Fevereiro de 2022, já lá vão quase três anos. Anunciada como "uma manobra militar, destinada a combater o nazismo e a desmilitarizar a Ucrânia", o conflito internacionalizou-se: primeiro com o apoio da UE, dos EUA e da NATO, à Ucrânia; depois, com o apoio à Rússia, por parte do Irão, da Coreia e da China. Dois blocos antagónicos, que disputam o mesmo território, numa guerra por procuração (proxy war) que está longe de terminar. O que, pensava-se, iria durar uns dias (dada a desproporção de forças em presença) revelou-se uma catástrofe humana e material não-quantificável que, todos nós, estamos a pagar, desde então. As sanções impostas à Rússia, não resultaram e tudo indica que as partes em conflito terão de chegar a um compromisso. Uma trégua imposta pelos mesmos que, durante três anos, continuam a dizer que devemos apoiar a Ucrânia sem limites. Ainda esta semana, numa entrevista à televisão americana, o inefável Blinken (esse arauto da paz!), dizia que a Ucrânia tinha falta de homens para combater e que os jovens entre os 16 e 25 anos também deviam ser incorporados (!?). Ouve-se e não se acredita! Acresce que a Europa continua dividida nesta questão, pois não quer perder o petróleo e o gás russo e, provavelmente, será o "amigo americano" (leia-se, Trump) a ter de "desempatar" a contenda. Um fiasco total para a União Europeia, a braços com uma nova crise financeira e sem meios económicos e militares para financiar uma guerra de longa duração.
Palestina - Iniciada por Israel, como resposta aos ataques do Hamas de 7 de Outubro de 2023, a actual guerra entre israelitas e palestinianos está para durar, pesem as declarações vitoriosas de Netanyahu que, ao fim de 14 meses, não conseguiu atingir os dois objectivos principais: recuperar os reféns israelitas e derrotar o Hamas. É difícil entender, como é que um dos "melhores" exércitos do Mundo, ainda não conseguiu eliminar um grupo de "terroristas", acantonados num território de 360km2, sem qualquer possibilidade de fuga. Por explicar, há ainda a "inoperância" da Mossad (portanto, um dos serviços de informação mais sofisticados do Mundo) ao permitir o ataque do Hamas de 7 de Outubro (!?). Catorze meses e 45.000 vítimas depois (a maior parte, civis), a comunidade internacional tem já poucas dúvidas. O Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), a Amnistia Internacional, a Cruz Vermelha e a ACNUR, vieram confirmar o óbvio: o que as tropas israelitas fazem em Gaza, indicia crimes de guerra e um genocídio étnico contra a população palestiniana, executado com mesma frieza e sanha de vingança nazi, que perseguiu os judeus na segunda guerra mundial. No seguimento das acusações feitas em Haia, o TIJ já decretou um mandato de captura contra os responsáveis palestinianos e israelitas (entre os quais, Netanyahu) pelos crimes cometidos. Será desta que o "carniceiro de Telaviv" é detido e julgado?
Moçambique - A contestação popular tomou conta das ruas de Maputo, após ser conhecido o resultado provisório das eleições nacionais de 9 de Outubro, que indicam Daniel Chapo (Frelimo) como provável vencedor. A oposição, liderada por Venâncio Mondlane (Podemos) já contestou os resultados e apelou à insurreição geral, acusando o partido governamental de manipular as eleições. Uma segunda guerra civil em embrião, que já causou centenas de mortos e pode vir a alterar a ordem vigente no país, governado pelo mesmo partido, desde a independência, já lá vão mais de 40 anos. Mais ao norte, em Cabo Delgado, o exército, apoiado pelas forças da Tanzânia, luta contra o movimento Daesh, infiltrado no país.
Síria - Após anos de relativa acalmia, estalou no país uma nova guerra contra o regime de Assad, agora liderada pelos islamitas radicais do Hayat Tahrir al Sham (HTS), que anunciaram um estado islâmico na região. Em semanas, o movimento conquistou Aleppo e Hama, duas das principais cidades do país e continua a avançar em direcção a Homs e Damasco. Entretanto, a Rússia, secundada pelo Irão, entrou nos confrontos ao lado de Assad, enquanto a Turquia aproveitou a guerra para combater os curdos, os seus principais inimigos internos e externos. Um conflito "adormecido" desde 2016, que pode incendiar o Médio-Oriente, já confrontado com as guerras de Gaza e do Líbano.
Geórgia - Há sete dias consecutivos que milhares de manifestantes protestam nas ruas da capital (Tbilisi), contra o primeiro-ministro, por este ter suspendido as negociações de adesão à União Europeia. Entretanto, o líder do principal partido da oposição foi preso, enquanto a repressão já causou dezenas de vítimas. Curiosa é a posição da presidente do país, que diz apoiar os manifestantes e recusa abandonar o cargo.
Coreia do Sul - Um golpe de estado improvável, parece ter sido a "lei marcial" proclamada pelo presidente do país, Yoon Suk-Yeol, alegando distúrbios e ameaças comunistas no país. Após seis horas do "estado de sítio", durante as quais o Parlamento foi cercado por uma multidão que protestava contra a medida, o presidente da Assembleia Nacional convocou uma reunião onde garantiu a maioria de deputados (188) que aprovaram uma moção que bloqueou a decisão do governo. Aguarda-se um inquérito e a destituição do presidente do país, agora que os ânimos parecem ter acalmado. Resta saber, até quando.
Alemanha e França - Se, noutras latitudes, a situação não é brilhante, na Europa não parece melhor. Na Alemanha e em França, os principais motores económicos europeus, duas crises governamentais distintas conduziram à queda dos respectivos governos. Na Alemanha, após a demissão do ministro das finanças, provocada pela crise financeira que assola o país, Scholz anunciou eleições antecipadas para Fevereiro; em França, caiu o governo do primeiro-ministro Barnier, depois de este ter aprovado uma lei de Segurança Nacional (sem votação) com base no artigo 49.3 da Constituição. Os principais partidos da oposição ("União Nacional", de extrema-direita e "Nova Frente Popular", de esquerda) opuseram-se à decisão e uniram-se na votação parlamentar que derrubou o governo. O presidente Macron, já aceitou o pedido de demissão do primeiro-ministro e recusa-se a abandonar o governo, ainda que tudo indique poder haver eleições antecipadas que, de acordo com a constituição, não deverão acontecer antes de Maio do próximo ano. Resta saber quais serão as consequências políticas e económicas para ambos os países, confrontados com o avanço da extrema-direita internamente e, no caso de França, com uma dívida pública de 112% e um défice de 6% do PIB (por comparação, Portugal tem uma dívida pública de 97,4% e um défice de 0,4% do PIB). Para os restantes países da União Europeia, as expectativas não são melhores, pois, como sabemos, "quando a economia alemã espirra, a Europa fica constipada"...
Muitos outros conflitos em África (Líbia, Sudão, Mali...) haveria a assinalar. Falta contabilizar o "efeito Trump", ainda que o governo norte-americano só tome posse em Janeiro. A avaliar pela nomeação dos ministros, teme-se o pior. Na realidade, o pior mesmo é o Mundo continuar "suspenso", enquanto espera por Trump...
Há quem pense que estas coisas são uma consequência do "ar do tempo". O tempo sombrio.
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