2006/08/25

A VIDA É ASSIM

Segundo uma notícia do Público do passado dia 10, o Tribunal de Comércio de Lisboa decretou a falência de Cardoso e Cunha (CC).
Acerca deste assunto muito se poderia analisar, ou mesmo especular. Por exemplo poderia relembrar-se a afirmação de CC de que o então ministro António Vitorino lhe deveria mandar fazer uma estátua; e a réplica deste dizendo que não lhe fizessem a tal estátua, porque assim lhe seria impossível continuar a andar com ele ao colo. Agora, tomando a falência como prova de incompetência de CC para os negócios, seria fácil dar razão ao ministro.
Também no processo da TAP, ainda segundo o Público, "depressa se incompatibilizou com Fernando Pinto, que já era o principal executivo. Na sequência saiu da operadora para se dedicar a tempo inteiro aos seus negócios particulares". Sabido o sucesso que teve a gestão da TAP sob o comando de FP, também não custa agora admitir que era este quem tinha razão.
Levando este tipo de raciocínio mais longe, até se poderia dizer que CC, esgotadas (será que estavam?) as hipóteses de gestão do dinheiro dos outros, se dedicou a gerir o seu, sem que os resultados tenham sido melhores.
Não é esse tipo de reflexão que quero fazer, mas outra mais estrutural, isto é, que tem a ver com a própria natureza humana. Ou, mais propriamente, a natureza humana condicionada pelo processo de obtenção da riqueza. A questão do dinheiro, em suma.
Na condição de "protagonista dos últimos vinte anos", como lhe chama o Público, CC foi ministro, comissário europeu, comissário da EXPO/98 e presidente da TAP, entre outros importantes cargos. Ganhou, seguramente, muita massa. Ter-lhe-ia bastado pôr de parte alguma dela para agora estar nas calmas, reformado ou não, continuando ou não a fazer alguma coisa de útil e que lhe desse gozo, a viver dos rendimentos. Preferiu, contudo, seguir o caminho mais comum e tentar enriquecer.
É aqui que entra a tal natureza humana em regime capitalista (o único credível que existe, apesar de tudo), a qual se pode traduzir em duas máximas, que formularei assim: "dinheiro faz dinheiro" e "quem é rico quer ser mais rico".
Como todos os princípios têm excepções, neste caso vigorou o segundo, mas, seja por aselhice ou por azar, o primeiro não teve confirmação.
Como se depreende deste exemplo, a ambição de riqueza (e do poder que lhe está associado) é, nos humanos, uma característica que, vendo bem, é até irracional. Não seria bem melhor que o homem tivesse posto os seus talentos (não se vá, agora que ele está na mó de baixo, achar que não tem nenhuns) ao serviço do bem comum, em vez de tentar enriquecer? Isto é fácil de dizer, mas quando se orientou uma vida num caminho como o de CC, de grande senhor acostumado a mandar e a ter as mordomias a tal associadas, é muito difícil que a fuga não seja para a frente.
Mas nestas só se mete quem quer. E CC tem bem consciência disso, honra lhe seja feita; em vez de se pôr com desculpas ou a deitar as culpas para cima de outrem, como é costume nestes casos, assumiu o seu falhanço e, com ele, as regras do jogo, dizendo que a decisão do Tribunal "é definitiva, irreversível e não há nada a fazer". A esta hora CC deve estar na difícil fase de ter de tomar drogas para conseguir adormecer, pois não se deve livrar do pensamento de que estaria muito melhor se não tivesse cedido à tentação da riqueza.
Se querem que vos diga não consigo ter pena dele... A ver se aprendemos com estas e outras, porque a vida é assim!

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