2007/11/29

Daqui não sai!

De vez em quando o país cultural e o Ministério da Cultura agitam-se. Fruto desta visão e desta estratégia espasmódica que reduz a cultura à noção de uma convulsão primária que, inadiável, tem de se soltar, de vez em quando um frémito extático percorre os corredores alcatifados da cultura portuguesa. Agora o motivo do sobressalto é o Tiepolo. O quadro fica, o quadro é património português, o quadro está pré-classificado, pré-marcado, o quadro é nosso! E do país não sai!
Na falta de uma política cultural, na falta de uma vida cultural, na falta de medidas, na ausência de ideias surgem então estes episódios, generosamente alimentados por uma dose reforçada de exposição mediática. Agora é o Tiepolo, há tempos foi a colecção Berardo e outros factos político-culturais da mais alta envergadura hão-de surgir, certamente, para inflamar a plebe e dar ao mundo ar de que Portugal pertence efectivamente à elite, a cultura mexe e os propósitos mais nobres e elevados dominam as consciências.
O Tiepolo, vê-se logo, é nosso, tal como os pastéis de bacalhau e o vinho do Porto. E o hóquei em patins! Não nos esqueçamos do hóquei em patins!! E daqui não saem!
Os artistas e os cientistas portugueses, podem ter de fugir desta pátria madrasta para poder exercer a sua actividade e sobreviver, mas o Tiepolo, esse fica! Podemos estar na cauda das caudas de tudo o que seja susceptível de ser aferido por qualquer indicador válido, por mais básico que seja, mas o Tiepolo daqui não sai!


PS- Parece que sou bruxo... Já depois deste "escrito" estar publicado soube-se que o Estado Português arrematou o Tiepolo. Afinal sempre vai havendo massa! Uma milhão e quinhentos UMA! Uma milhão e quinhentos DUAS! Uma milhão e quinhentos TRÊS! Vendido à senhora dos óculos de massa!!

5 comentários:

rui disse...

A "política cultural" deste governo é um verdadeiro desastre. Da nomeação do Carlos Fragateiro, à exoneração do Pinamonti; do afastamento da Dalila Rodrigues, à compra em "comodato" da colecção Berardo, passando pelo aluguer da colecção Hermitage, não se vislumbra qualquer estratégia. Tudo é feito ao "sabor dos acontecimentos" e sempre segundo a lógica do fogacho para "épater le bourgeois". Entretanto, os Museus estão fechados ao domingo por falta de pessoal, o Conservatório de Música está a cair aos bocados, Foz Coa é um projecto adiado e nunca há dinheiro para o que é necessário. Quanto à ministra, há muito que nos habituou só saber navegar à bolina...pode ser que acerte!

i figueiredo disse...

Tá bem, concordo em absoluto com a miséria politica do "comodato" do Berardo e com o folclore desnecessário e pires da colecção (?) Hermitage. Tudo bem. Mas a que propósito vem o resto? Fragateiro? Também desconfiei, e muito, da criatura; agora dou o braço a torcer, e completamente: a programação é excelente (a sério, vocês não vão lá? Vocês lêem?), variada, dirigida a vários públicos e chamando excelentes encenadores (Demarcy Mota, Nuno Cardoso, João Lourenço, etc. etc.). Porra! Pode-se não gostar muito do Fragateiro, mas os dados são mais que objectivos. Bom, e se compararmos com a programação (??) anterior, então nem sequer tem discussão.
Em relação ao Pinamonti, que é uma excelente pessoa e que fez um excelente trabalho, isso é indiscutível, foi o próprio que manifestou publicamente não querer trabalhar com a nova lei orgãnica do São Carlos. É bom ser-se sério, intelectualmente e não só, ó Rui, ó Rui Mota e ao Carlos Augusto, não é? A não ser que também alinhem na histeria idiota tipo Jorge Calado como o "Pinamonti foi o melhor director de sempre do São Carlos". Foda-se, quem fala assim não é gago!! Mas diz enormidades e banalidades do tipo Tide lava mais branco.
Quanto a uma tal de Dalila, ainda vêm à carga? Ou são cegos, surdos e mudos, ou não se informam, ou então, para surpresa minha, são agora rapaziada da direita PP. Qualquer dia, ainda vejo o Rui a citar o Telmo Correia e o Carlos Augusto a ir lanchar com o Nuno Melo. Então vocês não acompanharam a história Dalila? Não viram quem com ela gritou mais? Não leram as suas notáveis declarações (nem a própria ministra diria tontices daquelas)? E o espectáculo Marques Mendes no MNA, também não viram?
Carago, com tanta merda que esta ministra tem feito, sempre o Fragateiro, Pinamonti e Dalila...que curteza de espirito e de ideias. Já agora, só falta a Maria de Medeiros. Ah! Essa não! Essa é pós moderna e vai ao Frágil, e é de esquerda como o carago!! E tem pose!
Tanto blá blá e tanta falta de senso e tomates!!
Aliás, se quiserem discutir seriamente todas as histórias atrás referidas, vamos nisso. Mas é seriamente, não com preconceitos, com frases feitas, demagogia barata e, sobretudo, ignorando a lógica PP. Para direita já basta o governo!

i figueiredo disse...

Já agora, pois só agora acabei de ler o comentário do Rui, a que propósito vem Foz Coa? Foz Coa???
Você ou veio ontem da Libéria, ou então está a brincar! Pois é precisamente por causa de Foz Coa (essa carrilhice que nos custou milhões, como tudo o que pertence à herança guterrista), que vai construir um museu com custos completamente disparatados e nunca vistos em museus públicos, para satisfazer o lobby nortenho encabeçado por Santos Silva, que os museus nacionais estão na miséria. Você é extraordinário: critica a ministra (e bem, o que é muito fácil), mas nem sequer lê o que ela diz - então não ouviu ainda falar nos novos museus? É o da lingua, é o da Estação do Rossio e é o de Foz Coa, que vão custar milhões. E para quê? Você já foi a Foz Coa? Você sabe exactamente o que está em Foz Coa? Você sabe que existe um núcleo de gravuras rupestres, de muito maior valor arqueológico e histórico e, até, estético, na Serra de São Mamede e que estão completamente ao abandono, embora com gestão do IPPAR? E sabe porquê? Pense lá? Porque não há Carrilhos, Santanas, Limas e quejandos que ali vão buscar interesses pessoais ou de aparelho...é tudo a mesma merda!!
Você é mesmo muito ingénuo: acredita em Foz Coa, acredita no Sócrates e, pela época que se aproxima, de certeza que também acredita no Pai Natal!!

Rui Mota disse...

Se quisermos ser sérios, temos de perceber a (falta de) estratégia da ministra no âmbito da (falta de) estratégia do governo PS. Ou seja, este governo não está interessado numa política cultural a sério (baixou para 0.4% o Orçamento de Estado neste Ministério, o que diz tudo da importância que atribui à Cultura).
Vamos por partes: é verdade que o Carlos Fragateiro está a fazer "melhor" do que se esperava. Mas, também é verdade que ele aceitou o cargo depois de ter criticado o sistema de nomeações políticas para os teatros nacionais. Chama-se a isto falta de coerência ou, se quisermos, oportunismo. Se ele não fosse do PS, provavelmente não estaria onde está.
Segunda questão. O caso Pinamoni. A acreditar nas entrevistas que deu à comunicação social, ele foi demitido mesmo antes de ter feito as declarações que fez. E as declarações prendem-se com a fusão da Companhia de Ópera e a Gestão do S. Carlos. Se calhar, tinha razão...
Terceira questão: Se Dalila está mais perto da direita do PSD/PP, não sei. Sei que ela, como Pinamonti, eram competentes e fizeram bons lugares. Isto é amplamente consensual. Porquê exonerá-los?
Logo, a minha crítica tem a ver com a política de controlo do governo e não com as competências. Este PS/governo não está interessado na aplicação de políticas valorizadoras da Cultura, mas sim em ter "yes men" nos cargos culturais.
Sobre as gravuras da Serra de S. Mamede serem, ou não, mais valiosas do que as de Foz Coa, não me prenuncio. O "Expresso" desta semana diz que as de Foz Coa são importantes (está lá uma equipa de franceses e catalães a fazer um levantamento que confirma a sua importância). E então?
O que interessa é que todos estes governos, desde o PS de Guterres, passando pelos governos do Durão/Santana, até Sócrates, nunca fizeram nada pelas populações a quem prometeram "mundos e fundos" em troca da barragem e que, hoje, 12 anos passados, continuam à espera de um projecto de desenvolvimento local...
Portanto e para concluir, há uma política de "deixa andar" que é comum a todos estes governos e uma política de afastamento das pessoas críticas que é, no mínimo suspeita. Os medíocres nunca gostaram da competência, pois sentem-se ameaçados na sua mediania. Infelizmente, em Portugal, há mais medíocres do que competentes. Os governantes são, apenas, o espelho da nação.

Rui Rebelo disse...

Eu não percebo como é que se fala de política cultural deste governo ou ministério. Qual? Não há nenhuma. Só se poderá falar de ausência de política cultural e "mirramento" cultural que se está a viver há dezenas de anos.