2009/03/16

Cidadania

Há seis semanas atrás o meu BI expirou e tive necessidade de pedir um novo. Na Loja do Cidadão informaram-me que, dado não haver urgência, o melhor era pedir um Cartão de Cidadão. Prazo de entrega: dez dias em média.
Aceitei, não sem antes ter feito três tentativas para consegui-lo: a primeira para obter a informação propriamente dita; a segunda para obter a "senha" (que estava esgotada nesse dia) e a terceira, que me custou cinco horas de espera: o sistema automático não estava operacional...
Chegada a minha vez e após ter inserido os dados no computador, a funcionária, solícita, informa-me que terei de aguardar entre dez dias e dois meses (!?) pelo cartãozinho. A razão de tal demora não dependia dela: a partir daquele momento o processo deixava de pertencer-lhe...
Volto a casa, rendido à eficácia deste "simplex", anunciado como a solução dos multiplos cartões pelo informático-mór deste reino do absurdo.
Hoje, ao abrir o jornal, deparo com um anúncio de quarto de página, encabeçado pelo título: " Aviso aos cidadãos eleitores". De acordo com a informação, todos os portadores do Cartão de Cidadão ficam automaticamente recenseados na freguesia onde habitam. Fui confirmar. Já lá estou...mas ainda não tenho o cartão!
Por momentos, sinto-me num filme do "Twilight Zone". Procuro uma explicação. Vale-me o inseparável Coetzee, também ele um estrangeirado na Austrália, que escreve no seu último livro (Diário de Um Mau Ano) o seguinte: "Nascemos súbditos. Somos súbditos a partir do momento em que nascemos. Uma marca dessa sujeição é a certidão de nascimento. O Estado aperfeiçoado detém e conserva o monopólio de atestar o nascimento (...) não se trata apenas de não podermos entrar no Estado sem certificação: aos olhos do Estado, não morremos enquanto o nosso óbito não for certificado; e só nos é passada uma certidão de óbito por um funcionário (ou funcionária) que, por sua vez é detentor (ou detentora) de uma certificação estatal (...) Que o cidadão viva ou morra não interessa ao Estado. O que importa ao Estado e aos seus registos é se o cidadão está vivo ou morto".
Enquanto aguardo o cartão, penso na melhor forma de utilizá-lo. Satisfaz-me saber que poderei usá-lo três vezes este ano. O Estado poderá confirmar que estou vivo.

1 comentário:

Carlos A. Augusto disse...

É uma coisa de facto profundamente deprimente a situação de cidadão... vivo! Infelizmente, nem morto o cidadão é poupado pela máquina da burocracia.
Percebo-te.