2009/07/18

A cultura TGV

"Na apresentação oficial da Capital Europeia da Cultura 2012 em Guimarães, o primeiro-ministro, José Sócrates, sublinhou a importância da Cultura para o sucesso económico do país." Lê-se e não se acredita...
A cultura foi, como é do conhecimento público, a área de actuação do governo onde o primeiro ministro admitiu ter errado. As reacções ao estado a que chegou esta área "importante para o sucesso económico do país" são múltiplas e sucedem-se à medida que se sucedem os ataques contra ela. Já perdi a conta às petições, abaixo assinados e outras manifestações contra o estado a que chegou a cultura produzidos durante esta legislatura.
O mais recente e veemente sinal de desagrado chega através do Manifesto - Uma Cultura para o Século XXI , de que sou subscritor. Nele se diz, sem tergiversações: "Do programa de governo publicado há quatro anos destacam-se excelentes propostas que nunca foram cumpridas; da acção do governo nesta área destaca-se o episódico anúncio de iniciativas nunca antes propostas. A decepção é geral."
Ficamos então agora a saber que este é um sector importante para o sucesso económico... Como se trata de um sector que, como o próprio primeiro ministro reconhece, está carente, assaltam-me diversas dúvidas. Então e os "sucessos económicos" que têm sido anunciados, foram afinal fruto de quê? Foram alcançados sem o "importante contributo" da cultura, contrariando assim as palavras do PM em Guimarães? Ou afinal a ausência de uma contributo da cultura teve mesmo consequências no desempenho da economia que não está tão fresca como se apregoa?
Ficámos a saber também que o governo vai investir um pouco mais de 100 milhões de euros em Guimarães, para a realização do evento Capital Euopeia da Cultura 2012. Dá assim seguimento a este estilo espasmódico (neste caso, chamemos-lhe antes TGV) que tem caracterizado, em larga medida, a actuação dos governos da nação na área da cultura.
Periodicamente, lá surge um destes espasmos e aí vão uns milhões para uma evento cultural, daqueles de carácter bem mundano, que tem retorno mediático assegurado.
O estado de auto comprazimento era portanto grande ontem, durante a apresentação oficial da Capital Europeia da Cultura 2012 em Guimarães. E a cultura teve direito a um efémero momento com os holofotes acesos sobre ela.
Ficámos também ontem a saber que o governo francês vai gastar uma verba idêntica --cerca de 100 milhões de euros-- na mediaticamente discreta e bem menos imediatista operação de recuperação de cerca de 50 palácios e 75 catedrais. O governo conservador francês entende que a recuperação do património é um importante estímulo para a economia. O governo de um país rico como é a França, não hesita em aplicar neste programa uma verba semelhante àquela que o governo português se prepara para derrreter num projecto efémero, que a fazer fé no exemplo de iniciativas semelhantes anteriores, nem por milagre conseguiria assegurar a Guimarães esse estatuto de "capital da cultura permanente" que o actual ministro da cultura preconiza e que a cidade e o País merecem...
Ah como é diferente a cultura em Portugal...!

2 comentários:

Rui Mota disse...

A diferença na política de cultura tem a ver com a "bitola" europeia. Do TGV, claro está...

Carlos A. Augusto disse...

Continuando a metáfora ferroviária, parece que a cultura nunca mais apanha a carruagem...