A discussão em curso sobre a repatriação dos ciganos romenos e búlgaros ordenada pelo governo francês tem, pelo menos, uma virtude: mostrar a dupla moral de um país europeu que apregoa a solidariedade e inclusão de minorias como uma das suas bandeiras civilizacionais, ao mesmo tempo que emite circulares cujo texto não destoaria de escritos emitidos durante a ocupação nazi. Andou bem a comissária Viviane Reding ao denunciar tal acto como uma "desgraça", quando comparou as expulsões deste grupo étnico específico (e o texto da circular não mente) com práticas usadas durante a última grande guerra. Obviamente que os ciganos em questão não foram enviados para campos de concentração e receberam, inclusive, apoios financeiros para a viagem de regresso. Mas, o governo francês sabe que a circulação dos cidadãos europeus é livre pelo que, daqui a uns meses, estes ou outros ciganos, voltarão a França ou a outro pais da União Europeia onde decidam viver. As medidas tomadas por Sarkozy, ainda que apoiadas por uma larga percentagem de franceses, tentam escamotear um crise estrutural da sociedade, onde o desemprego, a perca de regalias sociais, o aumento da idade de reforma e o escândalo Loreal (financiamento do partido do governo) minam a autoridade do presidente. Junte-se a isto os "fait-divers" relacionados com a primeira dama, de quem a última biografia é um exemplo, e percebe-se melhor a falta de popularidade de um governo em queda abrupta. Era necessário recuperar a confiança da extrema-direita, agora que o centro-direita parece estar a fugir. Os ciganos estavam ali à mão de semear e são o grupo ideal para funcionar como "bode expiatório". A história não está a seu favor e poucas pessoas (inclusive na Roménia) parecem gostar deles...
O caso francês, sendo o mais mediático, não é sequer único. Diversos países europeus (Suécia, Itália) têm aplicado medidas selectivas de expulsão, enquanto outros preparam alterações às leis nacionais que facilitem a expulsão. A Holanda, por exemplo, que ainda há uma década atrás recebia dezenas de milhares de refugiados políticos, tornou-se um dos países mais restritivos nesta área, a ponto de ter sido alvo de críticas por parte de organismos internacionais como a Amnistia Internacional.
A ascensão ao poder da direita mais retrógada (de que políticos como Sarkozy e Berlusconi são os rostos visíveis) veio reforçar a tendência securitária e discriminatória que alastra pela Europa. Em tempo de crise económica e social a ideologia xenófoba vai fazendo o seu caminho. Denunciar medidas como as que foram tomadas pelo governo francês pode ter um efeito profilático. Nesse sentido, as palavras da comissária luxemburguesa, revelam que nem tudo está podre na Europa.
2 comentários:
Pois, estes nem disfarçam. De notar a votação de hoje da moção de condenação de França. De notar quem a chumba e quem a aprova. Curiosas clivagens...
A esta Europa tudo está a acontecer,e com "esta qualidade de
políticos"...que esperar? Mas,também me preocupa a subida dos
partidos extremistas da Direita...
enfim os povos andam confusos...
parece que estamos sob um barril
de pólvora...
Saudações/Irene
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