2012/03/19

iPide

No Zimbabué, um tribunal prepara-se para ditar sentença num caso de seis cidadãos apanhados a ver vídeos sobre a chamada "primavera árabe". No país de Mugabe, esse grande democrata, é assim. E não há nada como alterar o curso das estações antes que seja tarde. Primaveras, no Zimbabué, nem em video.
E em Portugal, país do primeiro mundo, onde não há medo, a informação circula livre, cada um exprime opiniões e relata factos sem receio de represálias e os meios e as redes de comunicação não estão nas mãos de uma mão cheia de bandalhos, os mesmos que são donos dos cabedais, ditam as leis, dominam o comércio e cobram o imposto, como é em Portugal?
Portugal é pior que o Zimbabué.
Este caso dos seis do Zimbabué parece brincadeira quando se pensa no caso de Rui Cruz. Ao pé disto Mugabe passa por virtuoso. Não se consegue perceber que crime poderá ter o autor do TugaLeaks cometido para ser considerado arguido pela justiça (assim mesmo, com letra minúscula, como minúsculo é o respeito que, cada vez mais, me merecem as instituições oficiais deste país de opereta). Aliás, ele, pelos vistos, também não.
O TugaLeaks, criado por Rui Cruz, terá divulgado acções de supostos hackers que, segundo consta, terão alterado conteúdos de sites institucionais, suficientemente desprotegidos para que isso fosse possível. Divulgou também, segundo parece, dois ficheiros de dados pessoais de agentes da PSP retirados, um, de um servidor governamental e, outro, do computador de um sindicato, ambos, pelos vistos, também totalmente vulneráveis.
Em vez de ouvir a mensagem, as instituições oficiais atiram ao mensageiro. E a mensagem é, afinal, simples: a segurança informática em Portugal é uma treta! Entrar num site e colocar lá uma qualquer mensagem provocatória não revela grandes dotes e parece até pueril. Mas, quem garante, perante o amadorismo que todo este foclore revela, de um lado e de outro, que os servidores a sério, da justiça, das finanças, das câmaras, etc, não são igualmente vulneráveis? E que estes ou outros hackers, menos brincalhões e talvez ligados a outros interesses menos românticos, não dispõem de artilharia mais pesada e via aberta para atingirem outros alvos mais importantes? Querem ver que esta acção contra Rui Cruz não passa de uma manobra para esconder questões mais sérias?
Uma coisa é certa: o comportamento e os métodos usados pela justiça, neste caso, trazem-nos à memória dias que julgávamos passados. Para muita gente neste país, não parece ter servido para grande coisa a instauração do regime democrático.

2 comentários:

Fusível Ativo disse...

É uma forma de mostrarem que fizeram alguma coisa quando realmente não fizeram nada.

rui mota disse...

Apesar de terem passado quase 40 anos sobre a queda da ditadura, a sociedade portuguesa só à superfície é liberal nos costumes e democrata nas práticas.
Para além disso, continua a ser uma sociedade de amadores, o que se nota mais em questões que exigem uma certa tecnicidade.
Agora que, teoricamente, a imprensa é "livre" e a informação circula na "net", há que limitar os danos, de forma indirecta: compram-se os meios de comunicação, nomeiam-se novas redações e despedem-se os jornalistas incómodos. O caso de Pedro Rosa Mendes é paradigmático.
A acção contra Rui Cruz é mais um passo nesta direcção. Claro que o que interessa é o resto, mas para isso, existem sempre "fait-divers"e escândalos suficientes na sociedade portuguesa por explorar. É também uma forma de desviar as atenções ou, se quisermos, uma forma de alterar a democracia, preparando a opinião pública para uma intervenção mais censória, logo mais autoritária.